22.8.07

Poder e corrupção

Trechos do artigo Poder e Corrupção, de Enrique Tomás Bianchi -secretário letrado da Corte Suprema de Justiça da Argentina.

1. Os que exercem os altos poderes do Estado expõem seus cargos quando - primeiro, por intermédio dos meios de comunicação, e, depois, pela justiça - se investiga a moralidade de sua gestão.Mais ainda, se são acusados de atos de corrupção. No filme O Caimán, do italiano Nanni Moretti, o personagem de Berlusconi se indigna quando um fiscal o acusa de diversos ilícitos. Ah, Ah... ele, justamente, que tem o apoio de milhões de italianos, que o levaram ao cume do governo...! Como se atrevem!

2. Em todos os lugares acontece o mesmo. Entre nós também. "Campanha suja", "sem fundamentos", "interesses espúrios", "imprensa marrom" são os termos a que recorrem os escandalizados políticos em situações similares.

3. Recordaria a todos, em primeiro lugar, que, numa república democrática, quem exerce o poder são, de maneira imediata ou mediata, os mandatários dos cidadãos e os encarregados da gestão da coisa pública, pagos com as contribuições de todos. Isso justifica que se esquadrinhem suas condutas de uma maneira até impiedosa. È verdade que podem cometer-se excessos, mas, como disse a Suprema Corte dos EUA, citando a Madison, "algum grau de abuso é inseparável do devido uso de qualquer objeto e, em nenhum caso, isso é mais verdadeiro que no caso da imprensa" (The New York Times versus Sullivan). Em todo o caso, esse fervor inquisitivo é melhor para a saúde do sistema republicano que o desengano daqueles que deixam de tomar uma iniciativa porque "sempre as coisas foram assim".

4. Essa desconfiança, que é a quintessência do liberalismo, produz um cidadão vigilante e prevenido, que tem o direito de imiscuir-se na atividade daqueles que tem o poder para controlá-los melhor. Como disse lorde Acton: "Não há pior heresia que a de crer que o poder santifica quem o tem". Para ele, nem os reis, nem os papas escapam à regras e, por isso, não os considerava merecedores de um tratamento mais benigno. Pode ser ingrato ter de submeter-se a critérios tão estritos, sobretudo quando se atuou honestamente. Porém, ocorre que o detentor do poder do Estado o buscou e, por isso, bem pode aplicar-se o provérbio das rodas de tango: "O boêmio não berra".