11.10.07

Intelectual na política

Trechos do artigo O ÚLTIMO INTELECTUAL de José Vidal-Beneyto no El País!, via ex-blog de Cesar Maia:

1. Apenas por indução, e com apoio da história, podemos entender o que é um intelectual. A função e o termo nasceram em fins do século XIX, por ocasião do caso do oficial Dreyfus, judeu acusado de conivência com o inimigo alemão, rebaixado, expulso do Exército e condenado à prisão perpétua, o que provocou uma profunda divisão da sociedade francesa, a propósito do patriotismo e do anti-semitismo.

2. A extrema direita, liderada por Maurras, entrincheirou-se na exaltação de ambos os temas, e, portanto, na manutenção da condenação. Diante deles, surgiu uma extraordinária mobilização da minoria culta e progressista francesa e de suas figuras mais representativas - Émile Zola ( J’accuse), Auguste Scheurer-Kestner, Bernard Lazare, Joseph Reinach, Lucien Herr, Marie-Georges Picquart, etc., que foram chamados de dreyfusards - pedindo a revisão da sentença, o que acabaram conseguindo.

3. Esta vitória provou que a ação individual, não violenta, com a utilização de meios e instrumentos cultos podia ser eficaz, e seus protagonistas foram chamados de intelectuais. A partir de então, surge, quase sem solução de continuidade, uma longa série de agentes/atores que, a título pessoal, se inscrevem numa crítica da realidade, feita com, e a partir da escrita, atualmente também da imagem, que aponta a revelação da mentira e a manutenção da verdade pública, instituindo a justiça como valor fundamental, combatendo a opressão e os abusos, promovendo a solidariedade com os subalternos e defendendo o interesse comum como suporte básico.

4. As características do intelectual que estamos tentando examinar e que eles encarnam de modo paradigmático, são: uma integridade pública intransigente, que seus comportamentos particulares não contradizem, e um compromisso com o coletivo que, em sua essência, nada pode alterar. Já que o texto e a imagem são a matéria de sua prática, é evidente que a reflexão e as análises que os alimentam irão utilizar as vias de que dispõem: o livro, os documentos gráficos, os produtos icônicos e audiovisuais.

5. Mas sem degradar o seu conteúdo teórico, sem suavizar o seu fio crítico por exigências da transmissão midiática, nem por seduções comunicativas, e tampouco sem cair num exercício de autocomplacência literária, de ensimesmamento narcisista. Mas sim como o que são, ferramentas de um trabalho, armas de um combate, mein gedicht is mein messer (meu poema é minha faca), como dizia Paul Celan sobre um projeto necessário.

6. O desaparecimento e o inevitável amortecimento da presença daqueles que atuaram como nossos mestres, lamentavelmente substituídos, hoje, pelos “intelectuais” midiáticos, que ocupam permanentemente os espaços disponíveis da comunicação. Sua servidão principal é a penosa mediocridade de suas análises e reflexões reduzidas à condição de prêt-à-penser.