Alternativas modernas para a CPMF
5 formas de eliminar a CPMF sem reduzir a arrecadação do governo e ainda aumentando a produtividade da economia
Cíntia Borsato/Veja
De olho em uma arrecadação que deverá superar 40 bilhões de reais no próximo ano, o governo se esforça para prorrogar por mais quatro anos a CPMF – o "imposto do cheque", que suga 0,38% de cada operação bancária feita por pessoas e empresas. O projeto já foi aprovado na Câmara, mas ainda falta o aval do Senado. A CPMF foi originalmente destinada a sanar a crise crônica no setor de saúde. Hoje sua receita cobre programas sociais e uma série de buracos nas contas públicas – do Bolsa Família ao déficit da Previdência. O governo diz que o auxílio estatal aos mais pobres depende da prorrogação desse tributo, que ceifa, anualmente, o equivalente a 1,4% do produto interno bruto (PIB). Mas há pelo menos cinco medidas para eliminar a CPMF sem afetar a receita do governo nem atrapalhar a eficiência da economia, mal que essa contribuição produz por incidir em cascata na economia.
1 FAZER O GOVERNO CABER NO PIB
Se contivesse a gastança, o governo teria recursos de sobra para sobreviver sem a CPMF. De 2000 a 2007, o PIB cresceu 20%, enquanto os gastos públicos avançaram 63%. Nesse ritmo, não há imposto que dê conta. Neste ano, o governo já arrecadou 40 bilhões de reais a mais em relação ao mesmo período de 2006, um valor superior ao que será obtido com a CPMF (39 bilhões). Se tivesse congelado seus gastos, portanto, o governo já teria tido montante igual à receita da CPMF para investir. Mas opta-se pelo caminho fácil de gastar mais, em vez de enfrentar reformas ou ampliar sua eficiência. A tributação é tão elevada quanto a de países europeus, mas os serviços prestados decepcionam. "A qualidade é mais importante do que a magnitude da carga. Existem países que pagam mais impostos, mas que são mais competitivos, porque investem onde é preciso", afirma o consultor tributário Clóvis Panzarini. A CPMF, por exemplo, teve sua destinação desvirtuada. "Se não acabarmos com a CPMF num momento em que o país tem dinheiro em caixa, reservas internacionais elevadas e aceleração no crescimento econômico, quando será?", diz Gilberto Amaral, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).
2 REDUZIR A ALÍQUOTA DOS IMPOSTOS
É isso mesmo. Diminuir alíquotas pode aumentar a arrecadação. Como isso é possível? A diminuição dos impostos torna os produtos mais baratos, reduz a informalidade, cerceia o contrabando e eleva a receita com impostos. "Quando se reduz a tributação, diminui-se o espaço para a informalidade", afirma Maria Helena Zockun, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. Foi o que aconteceu com os computadores. Em 2005, a carga tributária do setor caiu de 21% para 12%. A partir daí, houve uma guinada de 180 graus. Antes, a cada dez computadores vendidos, seis eram piratas. O número baixou para três. O que ocorreu com a arrecadação tributária sobre o setor de informática? Saltou 33%. E o que é melhor: as empresas desse segmento decidiram ampliar seus investimentos no país, o que vai trazer mais divisas, mais empregos, mais vendas e mais arrecadação. Um exemplo é a americana Dell. Antes a companhia tinha como foco apenas as grandes empresas brasileiras, mas, à luz do crescimento do setor, passou a atuar também no mercado de computadores pessoais.
3 ESTIMULAR O MERCADO DE CAPITAIS
Nos Estados Unidos, há cerca de 5.000 empresas de capital aberto, com ações negociadas em bolsa de valores. No Brasil, apesar da recente euforia no mercado acionário, não existem mais que 500. O que isso tem a ver com a CPMF? Tudo. A presença de empresas no mercado de capitais aumenta a transparência corporativa. Com isso, diminuem a evasão fiscal e a contratação de trabalhadores informais, sem carteira assinada e que não contribuem para a Previdência. As companhias com ações em bolsa precisam publicar balanços trimestralmente, o que amplia a transparência. O resultado é que elas tendem a ficar em dia com o Fisco. Um exemplo desse efeito virtuoso de aumento da formalização por meio do mercado de capitais é a construção civil, um setor historicamente dominado pela informalidade. Nos últimos anos, 25 empresas desse setor abriram seu capital. Coincidentemente, explodiu o número de empregos formais criados por essa atividade econômica. Foram 2,3 milhões de contratações com carteira assinada desde 2006 – 1 milhão apenas neste ano, ou 10% de todas as contratações formais registradas no período.
4 TAXAR MENOS OS BENS DE CONSUMO
A maior distorção do sistema é a carga excessiva sobre o consumo. Como os mais pobres gastam tudo o que ganham, eles pagam, proporcionalmente, mais impostos. Trata-se de uma espécie de CPMF contra os pobres. Isso porque, quando uma pessoa compra 1 quilo de açúcar, paga 40 centavos de impostos, independentemente de ser da classe A, C ou E. Aqueles que recebem até dois salários mínimos pagam 2% de sua renda em CPMF. Já os que ganham acima de vinte mínimos vêem apenas 1,2% de seu salário ser corroído pelo tributo. Na maioria das vezes, os tributos estão camuflados no preço final dos produtos e são cobrados sorrateiramente – caso clássico da CPMF. O ideal seria ampliar a participação dos impostos diretos, como o imposto de renda e o IPTU, cobrados de acordo com a renda e o patrimônio dos contribuintes. Assim caminhou a tributação nas economias mais modernas e avançadas.
5 ACABAR COM A GUERRA FISCAL
Uma pesquisa recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que quatro em cada cinco cidades com mais de 100 000 habitantes praticam a guerra fiscal. Ao dar subsídios a uma empresa, um estado ou um município pode até atrair investimentos. Mas o país, como um todo, sai perdendo nessa disputa muitas vezes suja e desleal. Os estados brasileiros perdem, anualmente, 25 bilhões de reais em decorrência da guerra fiscal. A soma representa 60% da estimativa da arrecadação com a CPMF em 2007. "A guerra fiscal entre os estados quebra uma regra de ouro, que é a isonomia de oportunidades no mercado. Isso porque um carro que pague impostos pode concorrer com outro que não paga", afirma Panzarini. "Essa guerra não cria nenhum emprego, ela apenas muda o endereço do desempregado." A melhor maneira de contornar essa anomalia seria o governo desviar o esforço que dedica à prorrogação da CPMF para a conclusão de uma reforma tributária ampla. Todos ganhariam.
Cíntia Borsato/Veja
De olho em uma arrecadação que deverá superar 40 bilhões de reais no próximo ano, o governo se esforça para prorrogar por mais quatro anos a CPMF – o "imposto do cheque", que suga 0,38% de cada operação bancária feita por pessoas e empresas. O projeto já foi aprovado na Câmara, mas ainda falta o aval do Senado. A CPMF foi originalmente destinada a sanar a crise crônica no setor de saúde. Hoje sua receita cobre programas sociais e uma série de buracos nas contas públicas – do Bolsa Família ao déficit da Previdência. O governo diz que o auxílio estatal aos mais pobres depende da prorrogação desse tributo, que ceifa, anualmente, o equivalente a 1,4% do produto interno bruto (PIB). Mas há pelo menos cinco medidas para eliminar a CPMF sem afetar a receita do governo nem atrapalhar a eficiência da economia, mal que essa contribuição produz por incidir em cascata na economia.
1 FAZER O GOVERNO CABER NO PIB
Se contivesse a gastança, o governo teria recursos de sobra para sobreviver sem a CPMF. De 2000 a 2007, o PIB cresceu 20%, enquanto os gastos públicos avançaram 63%. Nesse ritmo, não há imposto que dê conta. Neste ano, o governo já arrecadou 40 bilhões de reais a mais em relação ao mesmo período de 2006, um valor superior ao que será obtido com a CPMF (39 bilhões). Se tivesse congelado seus gastos, portanto, o governo já teria tido montante igual à receita da CPMF para investir. Mas opta-se pelo caminho fácil de gastar mais, em vez de enfrentar reformas ou ampliar sua eficiência. A tributação é tão elevada quanto a de países europeus, mas os serviços prestados decepcionam. "A qualidade é mais importante do que a magnitude da carga. Existem países que pagam mais impostos, mas que são mais competitivos, porque investem onde é preciso", afirma o consultor tributário Clóvis Panzarini. A CPMF, por exemplo, teve sua destinação desvirtuada. "Se não acabarmos com a CPMF num momento em que o país tem dinheiro em caixa, reservas internacionais elevadas e aceleração no crescimento econômico, quando será?", diz Gilberto Amaral, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).
2 REDUZIR A ALÍQUOTA DOS IMPOSTOS
É isso mesmo. Diminuir alíquotas pode aumentar a arrecadação. Como isso é possível? A diminuição dos impostos torna os produtos mais baratos, reduz a informalidade, cerceia o contrabando e eleva a receita com impostos. "Quando se reduz a tributação, diminui-se o espaço para a informalidade", afirma Maria Helena Zockun, da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas. Foi o que aconteceu com os computadores. Em 2005, a carga tributária do setor caiu de 21% para 12%. A partir daí, houve uma guinada de 180 graus. Antes, a cada dez computadores vendidos, seis eram piratas. O número baixou para três. O que ocorreu com a arrecadação tributária sobre o setor de informática? Saltou 33%. E o que é melhor: as empresas desse segmento decidiram ampliar seus investimentos no país, o que vai trazer mais divisas, mais empregos, mais vendas e mais arrecadação. Um exemplo é a americana Dell. Antes a companhia tinha como foco apenas as grandes empresas brasileiras, mas, à luz do crescimento do setor, passou a atuar também no mercado de computadores pessoais.
3 ESTIMULAR O MERCADO DE CAPITAIS
Nos Estados Unidos, há cerca de 5.000 empresas de capital aberto, com ações negociadas em bolsa de valores. No Brasil, apesar da recente euforia no mercado acionário, não existem mais que 500. O que isso tem a ver com a CPMF? Tudo. A presença de empresas no mercado de capitais aumenta a transparência corporativa. Com isso, diminuem a evasão fiscal e a contratação de trabalhadores informais, sem carteira assinada e que não contribuem para a Previdência. As companhias com ações em bolsa precisam publicar balanços trimestralmente, o que amplia a transparência. O resultado é que elas tendem a ficar em dia com o Fisco. Um exemplo desse efeito virtuoso de aumento da formalização por meio do mercado de capitais é a construção civil, um setor historicamente dominado pela informalidade. Nos últimos anos, 25 empresas desse setor abriram seu capital. Coincidentemente, explodiu o número de empregos formais criados por essa atividade econômica. Foram 2,3 milhões de contratações com carteira assinada desde 2006 – 1 milhão apenas neste ano, ou 10% de todas as contratações formais registradas no período.
4 TAXAR MENOS OS BENS DE CONSUMO
A maior distorção do sistema é a carga excessiva sobre o consumo. Como os mais pobres gastam tudo o que ganham, eles pagam, proporcionalmente, mais impostos. Trata-se de uma espécie de CPMF contra os pobres. Isso porque, quando uma pessoa compra 1 quilo de açúcar, paga 40 centavos de impostos, independentemente de ser da classe A, C ou E. Aqueles que recebem até dois salários mínimos pagam 2% de sua renda em CPMF. Já os que ganham acima de vinte mínimos vêem apenas 1,2% de seu salário ser corroído pelo tributo. Na maioria das vezes, os tributos estão camuflados no preço final dos produtos e são cobrados sorrateiramente – caso clássico da CPMF. O ideal seria ampliar a participação dos impostos diretos, como o imposto de renda e o IPTU, cobrados de acordo com a renda e o patrimônio dos contribuintes. Assim caminhou a tributação nas economias mais modernas e avançadas.
5 ACABAR COM A GUERRA FISCAL
Uma pesquisa recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que quatro em cada cinco cidades com mais de 100 000 habitantes praticam a guerra fiscal. Ao dar subsídios a uma empresa, um estado ou um município pode até atrair investimentos. Mas o país, como um todo, sai perdendo nessa disputa muitas vezes suja e desleal. Os estados brasileiros perdem, anualmente, 25 bilhões de reais em decorrência da guerra fiscal. A soma representa 60% da estimativa da arrecadação com a CPMF em 2007. "A guerra fiscal entre os estados quebra uma regra de ouro, que é a isonomia de oportunidades no mercado. Isso porque um carro que pague impostos pode concorrer com outro que não paga", afirma Panzarini. "Essa guerra não cria nenhum emprego, ela apenas muda o endereço do desempregado." A melhor maneira de contornar essa anomalia seria o governo desviar o esforço que dedica à prorrogação da CPMF para a conclusão de uma reforma tributária ampla. Todos ganhariam.
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