22.12.07

Informação e ataque

MILTON RAVAGNANI

Estou fora da cidade – quem lê minha coluna já sabe disso – e não pude comentar em tempo, no post devido, as reações sobre o texto que encaminhei para o amigo Ronaldo Nezo, em seu blog, reproduzidas aqui pelo também amigo Rigon. Em verdade o fiz apenas para alertá-lo da necessidade de estar preparado para as críticas, quando se torna uma figura pública.
Jornalista é figura pública? Não deveria, mas apenas pelo fato de aparecer em um veículo de comunicação, acaba se transformando. Um daqueles casos de contaminação pela proximidade. Figuras públicas são aqueles que são a notícia, não seus mensageiros. Mas a frágil capacidade do leitor/espectador médio (e a cada dia essa média é mais estúpida) de discernir entre um e outro, os iguala.
Penso ser bobagem responder comentários anônimos. A cortina do anonimato protege todo o tipo de ataque, sem que se possa reagir com as mesmas armas. Quem assina seu nome naquilo que escreve, assume a responsabilidade (civil e criminal) pelo seu conteúdo. O anônimo não. Esse transfere (no caso dos blogs) ao blogger tal responsabilidade. Meu amigo Ângelo sabe bem o que isso significa. Acabou de perder uma ação de reparação de dano exatamente por isso. E olhe que as ofensas que sofreu dariam, em qualquer outra circunstância, vitória pacífica na causa. Mas seu direito pereceu exatamente por essa responsabilidade subsidiária.
Isso não significa, todavia, que comentário anônimos não sejam importantes, ou que precisem ser banidos. De modo algum. A proteção do anonimato permite a revelação de informações cruciais para elucidação da verdade. Tanto que a própria polícia brasileira dela se utiliza fartamente. Veja os exemplos de disc-denúncia, principalmente relacionados ao tráfico, o quanto são importantes.
Há, todavia, uma diferença gritante entre o que é informação e o que é ataque, puro e simples. O anonimato, por si, não é um problema. A questão é o acobertamento de crimes que ele permite. Sim, crimes. Aqueles contra a honra, que são a calúnia, a injúria e a difamação. Quem é da área sabe do que se trata.
Não vejo qualquer problema em proteger-se com o anonimato (de perseguições políticas, ideológicas ou afins) para defender idéias ou posições. Entendo como muito lícitas, na verdade. Mas quando essa ferramenta esconde um bandido (sim, quem comete crimes continuados é bandido), aí precisa ser combatida.
A honra é um dos bens mais importantes na tutela do direito em praticamente todas as nações. Talvez essa proteção nem fosse necessária em uma sociedade planificada, sem individualidades, sem intimidades. Pode funcionar para as abelhas ou para as sardinhas. Mas para o bicho homem, não. Embora sejamos muitos, somos únicos, e portanto, ativos dessa privacidade. Preservar a honra significa preservar os elementos intrínsecos de cada pessoa, aquilo que a caracteriza como indivíduo. Não há sociedade humana com o mínimo senso de justiça, que não preserve esse conceito.
Quem se aproveita do anonimato que as novas ferramentas de comunicação, como são os blogs (aqui é preciso deixar claro sua importância e capacidade de democratização da informação que proporcionam, principalmente por inaugurarem uma nova era na relação do homem com a notícia), seja autoralmente, seja através de comentários, para atacar a honra de outras pessoas, é criminoso.
O fato de não ser descoberto não anula o crime praticado. A não identificação da autoria não faz com que o crime não tenha sido cometido. Ele está lá, e suas conseqüências também. A constituição de uma vítima, idem.
No fim, tudo não passa de uma questão de caráter de quem se utiliza da ferramenta. Quem tem índole criminosa tende a cometer crimes. Quem tem responsabilidade e consideração com o outro, que respeita seu semelhante e não se considera a razão de ser do universo, critica, mas não ataca. É simples.
Embora a internet pareça uma "terra de ninguém", um ambiente sem lei e sem ordem, na verdade apenas reflete a extensão de cada um. Aí fica ao seu julgamento que tipo de atitude prefere escolher.
Por isso assino meu nome toda vez que mando um comentário. E não escrevo para denegrir reputações. Quando há denúncias que possam prejudicar pessoas, físicas ou jurídicas, tenho a extremada observação das informações e a confirmação irretocável da verdade. Mesmo que isso implique em perder o "furo" da notícia. Mas não publico nada que possa ser ofensivo, sem antes ter prova irretocável do que divulgo.
Fiz, naquele comentário, objeto dessa discussão, uma constatação. A de que existe na cidade um grupo que se utiliza dos blogs existentes para patrulhar, ideologicamente, condutas e opiniões. Reafirmo a sentença.
É democrático organizar-se para alcançar o poder e se utilizar da comunicação, nas formas que se apresentem, para divulgar idéias, angariar simpatizantes e estruturar-se eleitoralmente. Não vejo qualquer problema em ocupar os blogs – e qualquer outro meio de comunicação – para defender posições eleitoreiras. É do jogo.
O exagero está em rotular quem não faz parte desse grupo de interesses, como inimigo, ou pertencente ao grupo contra o qual disputa espaço. Isso está errado. Tentar vincular as opiniões contrárias ou não alinhadas com "o outro lado", ou seja, com o "inimigo a ser batido", é desprezar a capacidade de raciocínio do eleitor. É certo que há muita mediocridade de pensamento, mesmo na internet, que ainda é elitista, mas, pelo amor de Deus, ainda existe gente que pensa.
O problema é a maldade por trás dessa aparente confusão. O problema é quando ela é intencional, rasteira, com o único objetivo de se embaralhar vozes dissonantes com o ramerrão interesseiro, que visa, ao final, os carginhos em comissão pagos pelo erário.
Isso fica claro na qualidade dos comentários que o tema recebeu. Basicamente se buscou rotular minhas opiniões, a do Nezo e a do Gilson – que aliás nem se manifestou – como sendo "do outro lado". Que lado, cara pálida? Façam-nos o favor! Não recebemos nossos salários do poder público. Nem direta nem indiretamente. Mas isso é questão menor.
Num dos comentários, de um certo "capitão corveta", sou acusado de atribuir aos veículos tradicionais (e seus vínculos com a ‘superestrutura de poder’) a única forma legítima de comunicação, e de ignorar o avanço tecnológico. Uau! Outro me confunde com o jornal em que escrevo, e quer que me explique por uma nota publicada por outro colunista. Ora, leiam com mais atenção, ou como diria o Ângelo, p a u s a d a m e n t e o que escrevi. Vejam se naquele texto há algo direta ou indiretamente relacionado com os devaneios do delirante marujo. Quanto ao outro, entenda-se com quem redigiu a tal nota. Até por que ele assinou, identificando-se, pelo que quis dizer.
O único sentido daquele texto foi confortar um amigo pelo fato de não ser o único a receber esse tipo de agressão, e que é preciso estar forte para receber críticas quando se torna público. Apenas isso. Mas viram um conteúdo que ele não tem.
Se o tal marinheiro tem a erudição que tenta aparentar, deve entender o motivo de ver, em meu texto, aquilo que não disse. Ler alguma coisa sobre a Gesthalt pode ajudar. Ela explica essa tendência de ‘clausura’, de totalizar o que não está fechado. Ler um pouco não lhe fará mal nenhum.
Acontece que o que vê não está no que digo, mas naquilo que carrega em si. Ou seja, não é o que penso, mas o seu pensamento que está criticando. É o desejo de encontrar naquilo que escrevo elementos que justifiquem o patrulhamento, de que falei há pouco, que o faz entender o que não existe. Repito, leia pausadamente o que escrevi. E fique a vontade para dar suas opiniões e fazer suas críticas. Mas sobre o que eu disse, não sobre o que gostaria que eu tivesse dito.
Mas não deve chegar até esse parágrafo, pois para ele, escrevo muito (extenso demais para quem deve estar acostumado a notas de duas linhas). Bobagem. Mas sei a dificuldade dessas pessoas a ler textos mais longos. Tem muita letra junto.