A árvore e a ave
O casal de gaviões-carijós que habitava a canafístula de 120 anos e cerca de 25 metros de altura derrubada pela Prefeitura de Maringá é uma espécie que se adaptou à vida urbana, pois seu habitat, isto é, o lugar que escolhe para viver, inclui áreas de vegetação aberta. Nidifica na copa de árvores altas, como a canafístula derrubada. O casal é estável, os ovos são geralmente dois e a reprodução inicia-se na primavera. O ninho mede cerca de 46 cm de diâmetro por 36 cm de profundidade, e é construído com pedaços de madeira grossos e secos e o seu fundo é revestido de folhas secas. Os ovos são incubados pela fêmea que é alimentada, durante o dia, pelo macho. Os filhotes, cobertos por uma penugem rala, nascem inteiramente dependentes dos pais e são criados por eles por cerca de 60 dias, sendo que qualquer movimentação anormal deixa as aves muito aflitas, como pôde ser observado pelo pio constante que se ouvia no domingo, antes da árvore ser derrubada. Portanto, provavelmente os filhotes estavam em fase final de cuidados.
Como as áreas urbanas se tornaram bons habitats para o gavião-carijó, esta ave estabeleceu o seu nicho ecológico, isto é, seus meios de sobrevivência, vivendo permanentemente em árvores bem altas e copadas, alimentando-se seja de pequenos insetos, lagartixas e aranhas, como de ratos e também de pombos, extremamente freqüentes nas zonas urbanas. Os gaviões vêm, inclusive, sendo usados para o controle de roedores causadores da hantavirose, no Sul do Brasil, e são importantes elementos de equilíbrio da fauna urbana.
Árvores antigas, copadas e altas são, portanto, um verdadeiro ecossistema, onde vivem de forma permanente ou temporária, pássaros, aves-de-rapina, insetos, aracnídeos, pequenos répteis e plantas epífitas, que são aquelas que se instalam nos ramos de outras árvores. A eliminação desses ecossistemas naturais, embora urbanos, dessas pequenas ilhas da natureza na cidade, representa uma agressão à
natureza e um prejuízo à coletividade, pois o meio ambiente é bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (Art. 225, da CF: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações).
A Lei nº 5197/67, de Proteção à Fauna, diz o seguinte no seu Artigo 1º: Artigo 1° - Os animais de quaisquer espécies, em qualquer fase do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais, são propriedades do Estado, sendo proibido a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha.
Nas circusntâncias em que se deu a derrubada da canafístula, outro artigo dessa mesma lei pode ser arrolado: Artigo 29 - São circunstâncias que agravam a pena, afora aquelas constantes do Código Penal e da Lei das Contravenções Penais, as seguintes:
a) - cometer a infração em período defeso à caça ou durante a noite;
b) - empregar fraude ou abuso de confiança;
c) - aproveitar indevidamente licença de autoridade;
d) - incidir a infração sobre animais e seus produtos oriundos de áreas onde a caça é proibida.
Artigo 30 - As penalidades incidirão sobre os autores, sejam eles:
a) - direto;
b) - arrendatários, parceiros, posseiros, gerentes, administradores, diretores promitentes compradores ou proprietários das áreas, desde que praticada por prepostos ou subordinados e no interesse dos preponentes ou dos superiores hierárquicos;
c) - autoridades que por ação ou omissão consentirem na prática do ato ilegal, ou que cometerem abusos do poder.
A Lei 9605/98 – Lei de Crimes Ambientais diz o seguinte, no seu Artigo 29: [é proibido] Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécimes da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:
Pena - detenção de seis meses a um ano, e multa.
§ 1º Incorre nas mesmas penas:
I - quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida;
II - quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural.
No seu Artigo 32, essa mesma lei trata dos atos de abuso contra animais, sejam eles silvestres ou domésticos.
Na revista Piauí deste mês há uma reportagem sobre um cidadão que passou a proteger a natureza, Platero, e que diz o seguinte, se referindo a uma enorme seringueira asiática cujas raízes destruíram parte da calçada de um prédio: “Vou ter que derrubar”. Ao comentário de que seria difícil derrubar uma árvore tão grande, esclareceu: “Não, não é a árvore; vou ter que derrubar a casa. A casa, posso reconstruir em qualquer outro lugar. A árvore, me dá pena.”
Por todos esses motivos, a Sociedade Protetora dos Animais de Maringá lamenta a forma pela qual a canafístula foi derrubada, no dia 9 de dezembro de 2007.
Maria Eugenia M. Costa Ferreira
Presidente da SPAM
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