16.5.08

Indenização por acidente

INDENIZACAO POR ACIDENTE-655/2004-MASWELL
JOHNY PEREIRA e outro x VIAÇAO GARCIA LTDAMaswell
Johny Pereira, menor impúbere qualificado na inicial
e representado por seu genitor CARLOS ROBERTO PEREIRA,
e Mirtes de Moraes Freire, também qualificada na inicial,
ajuizaram a presente Ação de Indenização Decorrente de Acidente
de Trânsito com Danos Morais em face de Viação Garcia
Ltda., igualmente qualificada. Alegam que em03/04/1999 embarcaram
em ônibus da requerida para viagem de São Paulo a
Maringá; que no trajeto o ônibus caiu numa ribanceira; que em
razão do acidente sofreram danos de ordem material e moral;
que o ônibus capotou em razão da alta velocidade empreendida
pelo seu motorista, preposto da ré; que o motorista do ônibus
havia ingerido bebida alcoólica e estava em alta velocidade;
que o primeiro autor tinha 10 anos da data do acidente e sofreu
fratura interna no joelho; que além disso ficou muito assustado
e até hoje sente dores; que a criança teve mudança de comportamento,
ficando traumatizada; que a segunda autora teve fratura
de costela, fratura de vértebra e perdeu o baço; que depois
do acidente foi examinada em hospital em Santa Cruz do Rio
Pardo e liberada sob o argumento de não ter sofrido nenhuma
lesão; que uma semana após o acidente foi constatada a fratura
de uma costela; que foi internada com fortes dores e hemorragia
interna decorrente da ruptura de baço; que o baço foi retirado,
em cirurgia de alto risco; que durante a cirurgia sofreu duas
paradas cardíacas; que ficou em coma por02 dias e permaneceu
por06 dias na UTI; que ficou um mês em repouso absoluto
e teve que usar colete ortopédico por 03 a 04 meses; que
ficou em tratamento médico de04/04/1999 a 17/01/2000; que
até hoje sente dores constantes; que com a retirada do baço a
autora perdeu parte de sua capacidade de produzir anticorpos
protetores, tendo sua capacidade de combater infecções reduzida
definitivamente; que ambos os autores sofreram danos
morais a serem indenizados; que o acidente ocorreu por culpa
do motorista do ônibus, empregado da ré, pois estava em alta
velocidade e ingeriu bebida alcoólica; que deve ser aplicada a
Súmula 341 do STJ, sendo presumida a culpa do patrão pelo
ato culposo do empregado ou preposto; que os danos materiais
(consultas, exames, cirurgia, etc) foram pagos pelo SUS; que
pretendem indenização pelos danos morais sofridos em decorrência
do acidente; que o primeiro autor é menor e a segunda
pessoa de idade avançada (mais de 60 anos) o que deve ser
considerado para fixação do valor do dano; que os ferimentos
sofridos trouxeram grande sofrimento e seqüelas aos autores;
que a segunda autora sente dores até hoje e nunca mais teve
vida normal; que é necessária a produção de prova pericial que
deve ser custeada pela ré por aplicação do artigo 6º do CDC;
que os juros moratórios devem incidir desde a data do fato; que
os danos morais não devem ser inferiores a 400 salários mínimos
para o primeiro autor e 500 salários mínimos para a segunda.
Requereram a condenação da requerida ao pagamento da
indenização por danos morais, ao pagamento do tratamento fisioterápico
indicado à autora e aos ônus da sucumbência.
Juntaram os documentos de folhas 38/108.
Admitido o processamento da demanda (fls. 109), a requerida
foi citada e apresentou a contestação de folhas 115/147, acompanhada
dos documentos de folhas 148/162. Aduz, em suma,
que não houve culpa do preposto da ré no acidente narrado nos
autos; que o boletim de ocorrência apresentado pelos autores
não demonstra culpa do preposto da ré, não havendo provas
nesse sentido; que a ré não pode ser responsabilizada pelos
danos sofridos pelos autores pois não foram motivados por seu
funcionário; que a real causa do acidente não foi apurada; que
a autora foi atendida após o acidente e recebeu alta hospitalar
sem que fosse constatado qualquer problema de saúde; que,
com isso, não houve negligência por parte da requerida, que
prestou atendimento médico após o acidente; que a retirada do
baço não traz maiores problemas ao adulto; que a autora não
ficou imobilizada por todo o tempo que alega; que não há provas
de tratamento para depressão; que não pode ser responsabilizada
por eventuais erros cometidos pelos médicos que atenderam
a autora após o acidente; que quanto ao autor não houve
danos físicos; que não procede o pedido de danos morais; que
o valor pretendido é excessivo; que em caso de procedência, o
dano moral deve ser fixado levando em conta a capacidade econômica
das partes e o artigo 84 do CBT; que não procede o
pedido de pensionamento à requerente; que antes do acidente
ela só trabalhava em casa; que não houve redução da capacidade
de trabalho e não houve redução de ganhos; que não procede
o pedido de constituição de capital por ser a ré concessionária
de serviço público; que não procede a aplicação de juros
compostos; que devem ser deduzidos da condenação os valores
já pagos aos autores. Requereu a improcedência dos pedidos e
que, em caso de procedência, seja reduzido o valor pedido na
inicial.
Os autores impugnaram a contestação, reafirmando os termos e
pedidos da inicial (fls. 163/174).
Deferida a produção da prova pericial (fls. 176), os autores
juntaram o documento de folhas 178 e o Ministério Público
manifestou-se às folhas 187.
Os honorários periciais foram depositados pela requerida às
folhas 188 e o laudo pericial foi juntado às folhas 189/193.
Os autores, a requerida e o Ministério Público se manifestaram
sobre o laudo (fls. 194/196, 205 e 207). Os autores juntaram os
documentos de folhas 197/202.
As partes apresentaram alegações finais por memoriais às folhas
210/216 e 217/220, reiterando os termos da inicial e da
contestação.
O Ministério Público, no parecer de folhas 221/225, opinou
pela procedência parcial do pedido, com a condenação da requerida
ao pagamento de danos morais aos autores em valor a
ser fixado pelo juízo e ao pagamento das fisioterapias que a
autora tiver que realizar.
Às folhas 226 foi determinada a retificação do registro e da
autuação do feito e às folhas 228 foi determinada a intimação
das partes para se manifestarem sobre a prova oral requerida na
inicial e na contestação, tendo a requerida dispensado sua produção
(fls. 231) e os autores insistido na mesma (fls. 232/233).
Designada audiência de instrução e julgamento (fls. 234), o
Ministério Público manifestou-se pela desnecessidade de sua
intervenção no feito, diante da maioridade do autor (fls. 236) e
foram ouvidas as testemunhas arroladas pelos autores (fls. 237/
240), sendo juntados os documentos de folhas 241/249).
As partes ratificaram as alegações finais apresentadas e reiteraram
os pedidos já formulados (fls. 253 e 254/258).
Conclusos vieram os autos.
É o relatório.
Passo a decidir.
Não há preliminares a serem analisadas.
No mérito, o pedido dos autores merece acolhida, em parte,
senão vejamos:
A ré aduz ausência de culpa de seu preposto no acidente que
vitimou os autores, afirmando que não tem dever de indenizar,
em razão da inexistência de nexo causal entre a conduta de seu
preposto e os danos sofridos pelos autores, além do que, o boletim
de ocorrência mostrar-se inconsistente quanto aos motivos
do acidente.
Entretanto verifica-se que restou comprovado nos autos a ocorrência
de acidente de trânsito envolvendo o veículo de propriedade
da empresa ré em que viajavam os autores em04/04/99.
Segundo o Decreto 2.681 de07.12.1912, aplicável também aos
contratos onerosos de transporte rodoviário, é presumida a culpa
do transportador pelos danos sofridos por seus passageiros
ou seus parentes, em caso de vítima fatal, tratando-se de presunção
legal jure et de jure somente elidível ante a presença do
caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima. Ausente
a comprovação de tais excludentes, nasce a responsabilidade
do transportador, independentemente da caracterização da culpa
aquiliana, eis que o dever de indenizar surge diretamente do
pacto de transporte firmado entre as partes e não cumprido pela
empresa contratada.
O mesmo dispõe o Código Civil (Lei 10.406/2002) ao tratar do
contrato de transporte de pessoas:
Art. 734. O transportador responde pelos danos causados às
pessoas transportadas e suas bagagens, salvo motivo de força
maior, sendo nula qualquer cláusula excludente da responsabilidade.
(grifei)
Parágrafo único. ...
Art. 735. A responsabilidade contratual do transportador por
acidente com o passageiro não é elidida por culpa de terceiro,
contra o qual tem ação regressiva. (grifei)
Em se tratando de responsabilidade objetiva do transportador,
é absolutamente irrelevante a discussão sobre a culpa do pre272
5ª feira | 15/Mai/2008 - Edição nº 7614
posto da ré, uma vez que a vítima de acidente não está obrigada
a comprovar a ação culposa da empresa contratada, mas apenas
o fato do transporte e o dano verificado, de forma a caracterizar
a responsabilidade da empresa pelo inadimplemento do
contrato de transporte.
Esse o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
“Civil e Processo Civil - Recurso Especial - Responsabilidade
civil - Acidente de trânsito - Contrato de fretamento e transporte
de pessoal - Legitimidade passiva da contratante - A empresa
contratante do serviço de frete e transporte de pessoal é parte
legítima para figurar no pólo passivo da ação de reparação de
danos causados a terceiros, decorrentes de acidente de trânsito,
se o veículo estava a seu serviço em tarefa de seu imediato
interesse econômico” (REsp. nº 325176/SP, STJ, Relatora Ministra
Nancy Andrighi, 3ª Turma, p. no DJU de 25.03.02).
Importante destacar que a transportadora de passageiros, como
a empresa ré, tem o dever precípuo de resguardá-los dos riscos
da viagem, obrigatoriedade que resulta da própria natureza do
serviço prestado, nos termos dos arts. 734 e 735 do Código
Civil que fixam a obrigação do transportador levar o passageiro,
incólume, ao local de seu destino, somente o eximindo desse
dever os casos fortuitos, de força maior ou por culpa exclusiva
da vítima, sendo induvidosa a aplicabilidade da mencionada
legislação a qualquer tipo de transporte remunerado, inclusive
o rodoviário, como é o caso em tela.
Com efeito, ausente a comprovação das excludentes de caso
fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima, nasce a obrigação
do transportador, independentemente da caracterização
da culpa aquiliana.
Consoante leciona Garcez Neto:
“o conceito de fato de terceiro, como acontecimento capaz de
exonerar a transportadora de sua responsabilidade contratual,
está ligado à noção de causa estranha ao contrato de transporte
e aos requisitos de imprevisibilidade do evento como ocorre
com a força maior, embora com esta não se confunda” (Prática
da Responsabilidade Civil, ed. 1970, p. 18).
Resta demonstrado que a responsabilidade pelo ressarcimento
pretendido pelos autores decorre do risco inerente à própria
atividade de transporte por eles contratada, presente portanto o
nexo causal entre o acidente e o dever de indenizar, mormente
em razão do art. 735 do CPC reservar à essa situação a possibilidade
de ação de regresso pela empresa ora demandada frente
a quem entende responsável pelo evento danoso, no que tange
a valores eventualmente despendidos para indenização de seus
passageiros.
Esse o posicionamento do Tribunal de Justiça do Paraná:
“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ACIDENTE DE
TRÂNSITO.AUTOR QUE SOFREU ACIDENTE AO VIAJAR
DENTRO DO ÔNIBUS DA EMPRESA REQUERIDA. ONIBUS
QUE COLIDIU COM A TRASEIRA DE UM CAMINHÃO.
FUMAÇA NA ESTRADA. INOCORRÊNCIA DE
CASO FORTUÍTO PARA EXCLUIR A RESPONSABILIDADE
DA EMPRESA LAPEANA. O CONDUTOR DO ÔNIBUS
DEVERIA TER ADOTADO TODAS AS CAUTELAS PARA
NÃO PROVOCAR O ACIDENTE COMO MANTER A DISTÂNCIA
DO VEÍCULO QUE SEGUIA A SUA FRENTE. RESPONSABILIDADE
OBJETIVA DA EMPRESA TRANSPORTADORA.
CULPA PRESUMIDA. DANO MORAL CONFIGURADO.
DEVER DE INDENIZAR. 1. CASO FORTUÍTO.
INEXISTÊNCIA.Cabia ao motorista da empresa apelante manter
uma distancia razoável perante o veículo que se encontrava
a sua frente, evitando, assim, o acidente. A queimada na estrada
abeira da rodovia gerando má-visibilidade é fato previsível
que ocorre habitualmente. 2. RESPONSABILIDADE OBJETIVA”.
(TJPR - Ap. Civ0337759-1 - Rel. Eugenio Achille
Grandinetti, DJ: 7146).
Nota-se que os autores não estão obrigados a provar ação culposa
do transportador com relação ao acidente de trânsito que
foram vitima, devendo demonstrar apenas o fato do transporte
e o dano verificado, de forma a caracterizar a responsabilidade
da empresa contratada pelo inadimplemento do contrato entabulado,
sendo absolutamente irrelevante a alegação de não estar
verificada a culpa do preposto da ré pelo evento danoso.
In casu, tem-se como incontroversa a circunstância de que os
autores contrataram com a ré o seu transporte, estando, assim,
delineado o transporte oneroso necessário à caracterização da
responsabilidade objetiva pelo ressarcimento dos danos descritos
na exordial.
Nem se diga que a responsabilidade pelos danos físicos sofridos
pela autora Mirtes é dos médicos que a atenderam após o
acidente, como sustenta a requerida, pois restou claro que os
danos físicos esperimentados pela autora e narrados nestes autos
são decorrentes do acidente de trânsito no qual se envolveu
o veíuclo da ré, no qual ela viajava. Não procede o argumento
de que a responsabilidade da ré se esgota em oferecer atendimento
médico após o acidente. Toda e qualquer seqüela decorrente
do evento danoso são de responsabilidade da ré, ainda
que tenham sido agravadas por falha no atendimento médico
posterior ao evento.
Ademais, não restou demonstrado nos autos que a perda do
baço ou o problema de coluna sejam decorrentes de falha no
atendimento médico. Pelo contrário, restou claro que o baço da
autora foi atingido no acidente e que teria que ser removido em
razão de hemorragia, o que poderia ter sido feito mais rapidamente,
evitando que ela corresse risco de morte, mas não poderia
ser evitado.
Com isso, a par de eventual responsabilidade do médico que
não diagnosticou, num primeiro momento, a necessidade de
retirada do órgão, subsiste a responsabilidade da ré pela lesão
causada à autora em função no acidente automobilístico durante
o contrato de transporte.
Assim, dentro de uma cadeia de responsabilidades, os autores/
vítimas devem ser indenizados por seu transportador, no caso a
requerida. Depois que a requerida desembolsar eventual condenação,
passa a deter o direito subjetivo de regresso em face
do suposto causador do acidente, em processo autônomo e independente
ao presente.
Diante do exposto não merecem acolhida as alegações da empresa
ré de inexistência de nexo causal, em razão de não estar
comprovada a culpa do seu preposto.
De início, há que se observar que não procede a alegação da ré
de que a hemorragia no baço da autora não decorreu da fratura
dos arcos costais e sim de impacto, pois trata-se de questão
irrelevante. Restou claro nos autos que em decorrência do acidente
automobilístico ocorrido durante o contrato de transporte
com a autora, esta sofreu ruptura de baço, causando hemorragia
interna. Assim, pouco importa se houve ruptura do órgão
em decorrência do impacto do acidente ou da fratura dos arcos
costais. Fato é que houve ruptura de baço, que levou a hemorragia
interna e obrigou à retirada do órgão.
Conforme consta do laudo pericial às folhas 191 a presença de
fratura de costela não implica em lesão do baço, por isso, mesmo
que o diagnóstico da fratura tivesse sido feita no primeiro
atendimento, não evitaria a cirurgia.
Quanto aos danos materais o pedido formulado na inicial limita-
se ao tratamento de fisioterapia que for indicado para a recuperação
da autora.
Vale destacar que o documento de folhas 159/160 indica que a
ré já pagou (extrajudicialmente) várias despesas da autora com
consultas, remédios, empregada domestica e exames.
Quanto às despesas com fisioterapia, não restou demonstrado
pela prova pericial ser ele necessário. Pelo contrário, às folhas
192 o senhor perito informou que o tratamento fisioterápico
não precisa mais ser feito de forma contínua e deverá ser feito
nas crises dolorosas para diminuir a dor. Em seguida acrescentou
que somente nas crises dolorosas intensas é que está indicada
a fisioterapia, pois, fisioterapia contínua não irá auxiliar
em sua recuperação (fls. 192).
De outro lado, apesar das testemunhas afirmarem que a autora
ainda faz fisioterapia por indicação médica, não consta dos autos
que a autora tenha, atualmente, indicação médica para esse
tratamento. Pelo contrário, o laudo de folhas 178 indica que a
autora tem dores na coluna em razão de sedentarismo e excesso
de peso e nada menciona sobre a necessidade de fisioterapia. Os
demais documentos médicos juntados ou são antigos ou referem-
se a problema cardíaco estranho ao acidente em questão.
Assim, não vejo como condenar a requerida a pagar um tratamento
fisioterápico “eventual” à autora, pois não restou demonstrado
que ela precise, de fato, desse tratamento para se
recuperar da fratura de coluna, da fratura de costelas ou da
retidada do baço.
Da mesma forma, não há que se falar em pencionamento pela
redução da capacidade laboral da autora.
Primeiro porque não foi formulado pedido expresso nesse sentido.
Dispõe o artigo 282, do Código de Processo Civil, que
entre os requisitos da petição inicial está “o pedido, com suas
especificações” (IV).
Ao formular pedido deve o autor demonstrar claramente seu
objeto imediato e mediato. O primeiro identifica-se com a natureza
da prestação jurisdicional invocada (declaratória, constitutiva
ou condenatória). Pode-se pedir ao juiz que simplesmente
declare a existência ou inexistência de uma relação jurídica;
que condene o réu a determinada prestação; ou que constitua
ou desconstitua atos ou situações jurídicas. O segundo é o
bem jurídico, sobre o qual se requer a tutela jurisdicional.
A autora deixou de requerer, expressamente, a condenação da
requerida ao pagamento de pencionamento (pela redução da
capacidade laboral). Assim, ainda que na exposição dos fatos e
dos fundamentos jurídicos tenha abordado tal tema, a sentença
não pode conter condenação que não tenha sido expressamente
pedida, já que o Juiz por determinação legal (art. 128, CPC)
fica adstrito aos pedidos expressamente formulados pelas partes,
sob pena de julgamento “extra petita”.
O pedido é o núcleo da petição inicial. É o objeto da ação e,
também, do processo. É, no dizer de Moacyr Amaral Santos, a
expressão da pretensão (Direito Processual Civil, vol. 2, p. 113).
É o terceiro elemento identificador da ação. Por ele são fixados
os limites da atividade jurisdicional, vale dizer, da sentença. O
juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, é o comando
contido no artigo 128.
Portanto, tendo o legislador processual erigido o pedido em requisito
indispensável da petição inicial, é irrelevante se do exame
da fundamentação fática e jurídica deduzida, isto é, da causa
de pedir, possa o juiz apreender a vontade do autor, ou seja,
possa compreender qual o provimento jurisdicional que ele pretende
obter com a propositura da ação. A explanação da causa de
pedir, assim, não supre a enunciação do pedido, devendo, necessariamente,
figurar concomitantes na petição inicial, como preceituado
nos incisos III e IV, do citado artigo 282.
Em outras palavras, ao juiz não é dado descobrir, deduzir ou adivinhar
o pedido pretendido pelo autor, ainda que ele pareça lógico.
Nem se diga, como se poderia argumentar, que o pedido não
necessita ser expresso, podendo estar implícito, quando decorre
logicamente da exposição dos fatos.
Conforme adverte Ovídio A. Batista da Silva (in Curso de Processo
Civil, vol. I, ed. Fabris, 1987, pp. 174/175):
“não se admite, evidentemente, que o autor formule o pedido
de forma dubitativa ou incerta, ou que simplesmente exponha
os fatos e fundamentos jurídicos de sua pretensão e deixe ao
juiz a tarefa de determinar ou extrair deles o pedido que não
fora formulado. Assim como o pedido sem fatos e fundamentos
jurídicos que o substanciem, seria inidôneo para legitimar a
demanda judicial, igualmente os simples fatos e fundamentos
jurídicos (causa petendi) sem pedido, conduziria a uma hipótese
de petição inepta. Tal seria o caso se o autor, descrevendo
adequadamente os fatos e os fundamentos jurídicos de sua pretensão,
concluísse a petição inicial pedindo que o juiz determinasse
“o que fosse de direito”, ou como em certas circunstâncias
se observa, “o que fosse cabível”. Naturalmente, esperar que
o juiz descubra, ou formule o pedido que ao autor competia
fazer, em verdade é nada pedir. E, como vimos, o juiz só deve
prover nos estritos limites do pedido que o autor lhe fizer. Se
este for obscuro ou incongruente, a petição inicial haverá de
ser rejeitada por inepta (art. 295, I, CPC).”
Não era outro, aliás, o entendimento do extinto Tribunal de
Alçada deste Estado:
“A descrição do fato e dos fundamentos jurídicos do pedido
demonstra o concurso da causa petendi, mas é de rigor que a
inicial indique também o pedido, pena de inépcia (arts. 282, IV
e 295, parágrafo único, I, CPC).” (4a. CC., apelação cível n.
1.344/90, de Peabiru, relator: o Exmo. Sr. Juiz Mendes Silva,
in PJ 38/180).
“Embargos do devedor. Petição inicial. Requisitos. Art. 282,
do Código de Processo Civil. Falta de pedido. Inépcia configurada.
Processo extinto. Recurso desprovido.
Por impedir a prestação da tutela jurisdicional, é inepta a petição
inicial da ação de embargos do devedor a que falta o pedido,
não sendo bastante a enunciação da causa de pedir.” (3a.
CC., apelação cível n. 39.510-6, de Francisco Beltrão, relator:
o Exmo. Sr. Juiz Telmo Cherem, in PJ 38/178)
Impende gizar, ademais, que nos termos do artigo 293, da lei
processual, “os pedidos são interpretados restritivamente”, isto
quer dizer, como ensina Humberto Theodoro Júnior, que “o
critério interpretativo não pode ser ampliativo ou extensivo.
Integra o pedido tão somente o que nele expressamente estiver
contido”, salvo as exceções legais em que se admite pedidos
implícitos (arts. 290 e 20, CPC e 1.061 e 1.064, CCB), entre as
quais não se encontram o caso “sub judice”.
Ainda que assim não fosse, do laudo pericial de folhas 189/193
e dos demais documentos trazidos aos autos, conclui-se que a
autora não exercia qualquer atividade profissional na época do
acidente, realizando apenas trabalhos domésticos, sendo que a
requerida pagou por algum tempo uma empregada doméstica
para a autora (não há pedido expresso de condenação ao pagamento
de salário da doméstica). Ademais, conforme laudo pericial
já referido, atualmente, a autora tem plena capacidade de
desenvolver suas atividades habituais, ou seja, seus afazeres
domésticos, sem restrições, tendo capacidade física compatível
com sua idade.
Nesse sentido, o laudo pericial de fl. 190:
“10. A esplenectomia, a fratura do arco costal consolidada e a
fratura da coluna dorsal D12 consolidada impede hoje a Autora
de exercer suas atividades domésticas em seu Lar? Se positivo
descreva suas limitações. R? Apesar das lesões acima descritas,
a autora está apta a exercer os atos do cotidiano normalmente,
apenas tomando cuidado aos esforços físicos para não
desencadear dores nas costas.”
No tocante aos danos morais, eles também são inegavelmente
devidos à autora Mirtes de Moraes Feire, já que é inegável que
os ferimentos causados na autora pelo acidente automobilístico
no qual se envolveu o veículo da ré durante o contrato de
transporte trouxeram a ela dor física, risco de morte, desconforto
pelo internamento hospitalar, desconforto pelo longo período
de repouso, dano irreparável pela perda de órgão, sofrimento
pela invalidez temporária e muitos outros dissabores.
Para o professor Antônio Chaves, insigne civilista nacional o dano
moral é a dor resultante da violação de um bem juridicamente
tutelado sem repercussão patrimonial. Seja a dor física - dor- sensação
como a denomina Carpenter-, nascida de uma lesão material;
seja a dor moral - dor sentimento -de causa material.
A reparabilidade do dano moral estava implicitamente inserida
no antigo Código Civil (1916) no artigo 159 e está expressamente
inserida no artigo 186 Novo Código Civil: Aquele que,
por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente
moral, comete ato ilícito.
No caso em tela, reconhecida a existência de dano moral e sua
reparabilidade, a nível patrimonial, já estando acertada a responsabilidade
civil da requerida por sua indenização, diante de
sua responsabilidade objetiva e do nexo de causalidade entre o
acidente e os danos sofridos pela autora, impõe-se à procedência
da indenização pretendida.
Quanto ao pedido da ré de compensação do valor reembolsado
pela seguradora, não lhe assiste razão, uma vez que o valor
pago foi a título de danos materiais, e sendo os danos materiais
e os morais de natureza distintas, incabível a compensação pretendida,
máxime em se considerando que estes valores foram
pagos em contrapartida de gastos realizados.
Com relação ao “quantum” indenizatório, a Constituição de
1988 afastou, para a fixação do valor da reparação, as regras
referentes aos limites tarifados pela Lei de Imprensa ou pelo
Código Brasileiro de Telecomunicações (invocado pela ré). Para
se estipular o valor do dano moral devem ser consideradas as
condições pessoais dos envolvidos, evitando-se que sejam desbordados
os limites dos bons princípios e da igualdade que regem
as relações de direito, para que não importe em um prêmio
indevido ao ofendido, indo muito além da recompensa ao desconforto,
ao desagrado, aos efeitos do gravame suportado.
No caso em tela, considerando, de um lado a idade da autora,
os fatos narrados nos autos, a gravidade das lesões sofridas
pela autora, o longo, desconfortável e doloroso processo de
recuperação, o risco de morte a que esteve sujeita, e ainda não
perdendo de vista que na fixação do dano moral, devem ser
considerados diversos fatores como as condições econômicas,
políticas e sociais, quer da vítima, quer do ofensor, bem assim
para a dimensão da ofensa, estabelecendo o valor com moderação,
eis que sua finalidade é a minoração da dor espiritual experimentada,
jamais a fomentação de riquezas, entendo pertinente
a fixação da indenização em questão em R$50.000,00
(cinqüenta mil Reais).
Por fim, observo, a título de esclarecimento, que o não acolhimento
do valor pretendido pela autora a título de dano moral
não implica em procedência parcial do pedido. Isto porque a
postulação em questão têm caráter meramente estimativo, não
podendo ser prevista pela parte ofendida.
A jurisprudência é pacífica nesse sentido:
“CIVIL. ATROPELAMENTO. MORTE. INDENIZAÇÃO.
DANOS MORAIS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. NÃO
OCORRÊNCIA.
1 - O acolhimento a menor do montante indenizatório, pedido a
título de danos morais, não enseja a aplicação do art. 21, caput,
do CPC, apta à compensação recíproca de honorários advocatícios,
dado que o valor é apenas estimativo, não estando o magistrado
a ele vinculado. Precedentes do STJ.
2 - Recurso especial conhecido e provido.”
(STJ-4ª Turma, REsp 752.776/RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves,
julg.02.08.2005, DJU 22.08.2005, p. 302)
Desta forma, há que se considerar que a autora sucumbiu apenas
quanto ao pedido de indenização por danos materiais (pagamento
de fisioterapia).
Já quanto ao autor Maxswell Johny Pereira, foi formulado apenas
pedido de reparação de dano moral, sob o argumento de
que ele sofreu ferimento no joelho e experimentou sofrimento
espiritual com o acidente.
Não há dúvida (fato incontroverso) que o autor estivesse no
ônibus da requerida no momento do acidente.
Entretanto, ao ser ouvido pela autoridade policial, dias depois
do acidento, o autor declarou que nada sofreu, não apresentando
qualquer lesão (fls. 70). Com a inicial não foi juntado qualquer
documento que demonstre ter o autor sofrido qualquer
dano físico ou psicológico.
Do laudo pericial também não se extrai qualquer seqüela de
ordem física ou moral ao autor, revelando o senhor perito que o
autor apresenta-se totalmente apto do ponto de vista físico e
mental (fls. 190).
Já a prova testemunhal indica ter o autor sofrido dano moral.
A testemunha Célia Aparecida Guelles Neiva (fls. 239) afirma
que o autor ficou bastante tempo se poder brincar e que ele
ficou com trauma após o acidente, não querendo mais andar de
ônibus. Já a testemunha Valdoleni dos Santos disse que o autor
ficou emocionalmente abalado e não queria andar mais de ônibus
(fls. 240).
A prova produzida demonstra, portanto, que o autor sofreu leve
dano moral, já totalmente superado (conforme se vê do resultado
da prova pericial). Por algum tempo ficou “traumatizado”, o
que é uma reação normal, e teve medo de andar de ônibus.
Esse dano, ainda que se revele de pequena monta, deve ser
indenizado. Sua pequena extensão deve ser considerada para a
fixação da indenização, não justificando seu afastamento.
Assim, e considerando os parâmetros acima explicitados, entendo
que, quanto ao autor, os danos morais devem ser fixados
em R$3.000,00 (três mil Reais), valor condizente com a extensão
do dano.
Do exposto e com fundamento nos artigos 186, 734 e 735 do
Código Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os
pedidos formulados na inicial, e CONDENO a ré ao pagamento
das seguintes verbas indenizatórias:
a) a título de danos morais á autora Mirtes de Moraes Freire: o
valor de R$50.000,00 (cinqüenta mil Reais), de uma só vez;
b) a título de danos morais ao autor Maxwell Johny Pereira: o
valor de R$3.000,00 (três mil Reais), de uma só vez.
Deve o valor das condenações ser corrigido monetariamente à
partir da publicação desta sentença e acrescido de juros de mora
desde a data do evento danoso (03/04/1999 - data do acidente),
conforme determina a Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça,
segundo a qual: “Os juros moratórios fluem a partir do
evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.”
Ainda quanto aos juros de mora, deve ser observado o percentual
de0,5% ao mês até 11/01/2003 (data em que entrou em
vigor o CC/02) e à partir daí de 1% ao mês, até o efetivo pagamento
(art. 406, CC/02).
Tendo havido sucumbência recíproca em razão do excesso postulatório
dos autores no tocante ao pedido de indenização por
danos materiais (despesas com fisioterapia), condeno a requerido
ao pagamento de 80% das custas processuais e os autores
ao mesmo pagamento, na proporção de 20%, devendo a ré arcar, ainda, com o pagamento de 80% dos honorários do procurador dos autores, e estes com o pagamento de 20% dos honorários
do procurador da requerida, verbas que fixo em 15%
(quinze por cento) sobre o valor atualizado da condenação, tendo
em vista, de um lado, o trabalho desenvolvido para a solução
do litígio, o tempo de duração do processo e as provas produzidas
e de outro, o valor da condenação, que desaconselha a fixação
de porcentagem superior.
Consoante orientação do Supremo Tribunal Federal, deve-se
proceder à compensação entre as partes dos honorários advocatícios
sucumbenciais, nos termos do art. 21 do CPC.
Sendo os autores beneficiários da Justiça Gratuita, quanto a
eles deve ser observado o disposto no artigo 12 da Lei 1060/50.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.