6.6.08

Cooperativas do Sul param suas fiações

Marli Lima e Vanessa Jurgenfeld, de Curitiba e Florianópolis
06/06/2008 - Jornal Valor Econômico

A concorrência com importados está levando fiações de algodão a adotarem diferentes estratégias para não operarem no vermelho. Concessão de férias coletivas, desligamento de máquinas em determinados horários do dia e acúmulo de estoques para esperar melhores preços são algumas das medidas tomadas. Enquanto algumas indústrias esperam que a colheita de algodão resulte em queda no preço da matéria-prima, outras apostam no aumento da demanda para as coleções de verão. Todas reclamam da ampliação da oferta de fios indianos no país.
“A Índia é nossa principal concorrente e está trazendo muito fio barato para cá”, diz José Aroldo Galassini, presidente da Coamo, de Campo Mourão (PR), uma das cinco cooperativas paranaenses que têm fiação. Os 240 empregados de sua unidade estão em férias coletivas por três semanas. “Vamos aproveitar para fazer manutenção nos equipamentos e esperar o mercado ficar equilibrado”, completa.
A decisão de parar a produção foi tomada em meio a investimentos de R$ 1,5 milhão e o recebimento de oito máquinas novas - está prevista a compra de mais oito. “As fiações estão passando por um sufoco”, afirma Galassini. Segundo ele, com a colheita de algodão, a expectativa é de que o preço da pluma caia cerca de 10%.
Na Coagel, de Goioerê (PR), 250 trabalhadores da fiação entrarão em férias de 14 de junho a 13 de julho. “Estamos com os armazéns lotados, com estoques para dois meses”, justifica o presidente da cooperativa, Osmar Pomini. Segundo ele, a decisão de parar foi estudada por 30 dias, e foi feita a opção de “dar um tempo”. “Os indianos começaram a chegar com força a partir de fevereiro”, conta.
O aumento da presença de fios indianos começou a chamar a atenção do superintendente industrial da Cocamar, Celso Carlos dos Santos Júnior, há dois meses. A cooperativa de Maringá (PR) já fez fio de seda e desistiu do segmento em 2006, pressionada pelos chineses. “Estamos operando a duras penas”, diz, sobre a fiação de algodão. A paralisação da produção foi estudada, mas a Cocamar decidiu enfrentar junho e julho à espera de um segundo semestre melhor. “Só nos sobra preencher espaços”, diz, sobre clientes que preferem manter contratos por segurança, para não ficar nas mãos de estrangeiros.
A Cocamar também tomou medidas. Parou de vender fios 100% algodão para apostar nos mistos com viscose e poliéster. Seu estoque é de 20 dias, o dobro do usual. “Vamos nos arrastar nos próximos dois meses”, afirma o executivo, que também espera queda de pelo menos 20% no preço da matéria-prima. “Chegamos a um nível insustentável”, diz ele. De acordo com Santos Júnior, nos últimos três meses os preços de fios tiveram redução de cerca de 20%, para concorrer com importados.
Na Cooperativa Integrada, de Londrina (PR), os preços caíram 10% em dois meses, mas não foi o suficiente para garantir contratos. O gerente de vendas da fiação, Edson Oliveira, informou que o volume de importado aumentou muito em 2008. Com isso, clientes que só compravam nacional estão optando por fios indianos.
Vilmar Sebold, presidente da Cocari, de Mandaguari (PR), reclama que a condição de competitividade é desigual. A Cocari tem estoque para 45 dias e, para contornar a situação, demitiu 30 pessoas. Desde maio, desliga as máquinas das 17h às 21h, quando a energia é mais cara. Agora torce para que a demanda por fio de verão mude a situação. “Se não houver retomada em julho, teremos de parar”.
Os fabricantes têm razão quando falam dos indianos. Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior mostram que, de janeiro a abril de 2008, as importações brasileiras de fios de algodão da Índia somaram 11,6 mil toneladas, ante 1,6 mil toneladas em igual período de 2007. “Somos favoráveis à isonomia de competições e temos tentado mostrar isso ao governo”, afirma o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Aguinaldo Diniz Filho, que cita o preço da energia e incentivos fiscais à importação como agravantes do problema.
Na outra ponta da cadeia, a indústria têxtil explica os motivos que levaram ao aumento nas importações. O presidente da Buettner, João Henrique Marchewsky, observa que a diferença de preços nos fios está em 15%, mas há poucos meses estava em 20% na comparação Brasil contra Ásia.
De acordo com ele, o distanciamento em relação ao patamar de preço dos asiáticos começou no segundo semestre de 2007, intensificando-se do fim de ano até o primeiro trimestre de 2008. O fio de algodão 24, um fio básico, usado em malhas e toalhas, por exemplo, estava com o quilo próximo a R$ 8,50 no primeiro trimestre. Agora, está em torno de R$ 7,00, tendo caído até pela menor demanda das indústrias. No entanto, ele ainda sai mais caro do que comprar em países como China ou Índia. Ao adquirir da Índia, a Buettner paga US$ 2,70 (R$ 4,50) o quilo do mesmo fio. A Buettner, que não trazia fios de algodão de outros países até 2007, passou a comprar. Marchewsky diz que hoje 30% das compras de fios deste tipo são feitas na Ásia.
Gilmar Sprung, presidente da Cativa, indústria de vestuário de Pomerode (SC), sugere que uma fiação no Brasil, na atual realidade de câmbio, teria que vender 20% mais barato. “Trago fio da Índia, pago frete e impostos e ele ainda custa 20% mais barato”, diz. “Compro alguma coisa no mercado nacional para manter o relacionamento (cerca de 10% do que usa na produção) e para o caso de essa realidade de câmbio mudar”.
Para as fiações, a opção de importação de insumos chegou a ser testada, mas não foi vantajosa. O diretor da Fiação São Bento, de Santa Catarina, Andreas Broder, diz que há três meses parou de importar da Índia fibra de viscose para a produção de fio. “Nosso produto acabava ficando mais caro que o fio já pronto vindo da Índia”. Segundo ele, a empresa tem conseguido não sofrer tanto pela garantia de rapidez maior na entrega em relação aos asiáticos. Mas teve de baixar os preços em cerca de 10% de janeiro a junho. Os estoques, que eram de cinco dias em janeiro, passaram para 20 dias este mês.