A sombra de Lula
De Gilberto Carvalho, chefe de gabinete de Lula, em entrevista à revista Veja desta semana:
Veja – É comum o presidente irritar-se quando as coisas ameaçam sair do controle?
Gilberto – A cabeça de Lula é a do peão do ABC. O núcleo da preocupação do presidente é com emprego e salário. Vejo isso todo dia. Assim, se o banqueiro tiver lucro, tudo bem. Ele diz: “Eu prefiro que esses caras tenham lucro do que fazer um Proer para eles depois”. Mesmo em relação à reforma agrária, eu não sinto que ele se empenhe tanto quanto por salário e emprego. Nem quanto ao ambiente. Vou ser bem claro aqui: ele acha importante a preservação, mas, entre um cerradinho e a soja, ele é soja. O ambiente é uma questão importante, mas não é decisiva. O que é decisivo é a economia.
Veja – Qual foi o pior momento do governo?
Gilberto – Não há dúvida de que foi a crise de 2005, quando havia muita gente convicta de que o governo tinha acabado, de que o impeachment do presidente era iminente. Houve a famosa noite em que Palocci (ex-ministro da Fazenda) e Márcio Thomaz Bastos (ex-ministro da Justiça) foram aconselhá-lo a entrar em acordo com a oposição. Lula abriria mão da reeleição em troca do restante do mandato. Aquela noite foi muito difícil para todos nós. Outra noite trágica foi a do dólar na cueca (um petista foi preso com dinheiro dentro da cueca). Ao saber da história, o presidente botou as mãos na cabeça e falou: “Meu Deus, onde é que nós vamos parar?”. Era uma sucessão inacreditável de picaretagens. Para completar, além da crise política, a economia também apresentava problemas. O PIB não crescia como prometemos.
Veja – O presidente pensou em aceitar o acordo?
Gilberto – Lula sempre demonstrou serenidade, mesmo nos piores momentos. Mandava a gente continuar trabalhando normalmente. O único instante em que o vi realmente deprimido foi às vésperas da crise política, quando ele estava irritado com a falta de resultados na economia. Lembro de um diálogo amargo dele com o Palocci. O presidente disse assim: “Poxa, eu confiei em você, eu confiei no Meirelles (presidente do Banco Central) contra tudo e contra todos. Vocês falaram que a economia ia bombar e não bombou coisa nenhuma”. Aquele momento foi muito duro. Ele parecia arrasado.
Veja – O presidente pensou em mudar a política econômica?
Gilberto – Muitas vezes, até porque nunca faltou quem falasse que ela estava errada e era preciso mudar tudo. Hoje ele avalia como um fato muito positivo ter confiado no Palocci e no Meirelles. Todo o carinho que Lula tem pelo Palocci e o respeito que tem pelo Meirelles decorrem de eles terem atravessado juntos o período das vacas magras.
Veja – O presidente vive reclamando da imprensa, e alguns de seus assessores já chegaram a acusar a Polícia Federal de vazar documentos para constranger o governo.
Gilberto – A matriz de análise do presidente é sempre a mesma: dar um pau em quem faz bobagem. Ele sempre fala que o papel da polícia e da imprensa é esse. As reações contrárias surgem em momentos em que ele enxerga uma carga de preconceito nas críticas. No governo passado, Fernando Henrique Cardoso também levou um pau danado da imprensa, não podemos esquecer. O problema é quando isso caminha para o preconceito, quando fica evidente que certas coisas que se escrevem sobre Lula não seriam escritas sobre outros presidentes.
Veja – O senhor se refere às críticas feitas a respeito da associação entre o filho do presidente e a Telemar, uma concessionária pública?
Gilberto – O presidente não vê nada de errado naquela coisa do Lulinha. Ele tem consciência de que o Fábio tomou uma iniciativa pessoal e está batalhando. Ele nunca pediu nada pelo Lulinha. É bem diferente do Vavá. O Vavá cometeu um ato ilícito, o Lulinha não. Mas ele acha que o Fábio está exposto mesmo pelo fato de ser filho do presidente. Sabe que é natural, do jogo.
Veja – As maiores crises do governo foram provocadas por petistas. Lula está descontente com o PT?
Gilberto – Ele já fez vários desabafos. Em relação aos problemas éticos, o presidente não os atribui ao partido, mas às pessoas. Não acha que a corrupção seja uma coisa intrínseca ao PT. A ligação de Lula com o PT é de criatura e criador, de pai e filho. Não passa pela cabeça dele nenhuma possibilidade de afastamento do PT.
Veja – Como o presidente viu o envolvimento do ex-ministro José Dirceu, um de seus mais próximos e poderosos assessores, com Waldomiro Diniz e o escândalo do mensalão?
Gilberto – Primeiro, José Dirceu e Lula não são tão íntimos assim, nunca tiveram relação de amizade. No caso Waldomiro, Lula criticou o Zé por ter confiado em um cara que não era confiável. O capítulo mensalão é tratado aqui de um modo diferente. O Zé era chefe da Casa Civil e o Delúbio Soares, tesoureiro do PT. Foi repassado dinheiro aos partidos como ajuda de campanha, não para os caras votarem com o governo. Quando a gente fala que não teve mensalão, é nesse sentido. Não é que eu concorde com isso, mas é diferente da história de que o governo dava mesada aos deputados. Então, o presidente não atribui ao Zé a responsabilidade de ter sido o operador desse esquema. Mesmo assim, na avaliação do presidente, era melhor que o Zé tivesse renunciado, passado um tempo submerso e reconquistado os direitos políticos. Um caminho mais ou menos como o do Palocci.
Veja – O presidente aceitaria candidatar-se a um terceiro mandato?
Gilberto – De jeito nenhum, isso é um assunto que não tem nenhuma possibilidade de prosperar. Se ele fosse a favor, não se empenharia tanto em procurar um candidato. Essa aposta na Dilma é séria, é real. Já o terceiro mandato não existe. É lógico que é muito melhor ouvir “Fica, Lula” do que “Fora, Lula”. Isso dá condição para ele fazer o sucessor, não para continuar. Olhando a história, quem prorrogou mandato só arrumou problema. O presidente até pode tentar voltar em 2014. Mas ficar agora, definitivamente não.
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Veja – É comum o presidente irritar-se quando as coisas ameaçam sair do controle?
Gilberto – A cabeça de Lula é a do peão do ABC. O núcleo da preocupação do presidente é com emprego e salário. Vejo isso todo dia. Assim, se o banqueiro tiver lucro, tudo bem. Ele diz: “Eu prefiro que esses caras tenham lucro do que fazer um Proer para eles depois”. Mesmo em relação à reforma agrária, eu não sinto que ele se empenhe tanto quanto por salário e emprego. Nem quanto ao ambiente. Vou ser bem claro aqui: ele acha importante a preservação, mas, entre um cerradinho e a soja, ele é soja. O ambiente é uma questão importante, mas não é decisiva. O que é decisivo é a economia.
Veja – Qual foi o pior momento do governo?
Gilberto – Não há dúvida de que foi a crise de 2005, quando havia muita gente convicta de que o governo tinha acabado, de que o impeachment do presidente era iminente. Houve a famosa noite em que Palocci (ex-ministro da Fazenda) e Márcio Thomaz Bastos (ex-ministro da Justiça) foram aconselhá-lo a entrar em acordo com a oposição. Lula abriria mão da reeleição em troca do restante do mandato. Aquela noite foi muito difícil para todos nós. Outra noite trágica foi a do dólar na cueca (um petista foi preso com dinheiro dentro da cueca). Ao saber da história, o presidente botou as mãos na cabeça e falou: “Meu Deus, onde é que nós vamos parar?”. Era uma sucessão inacreditável de picaretagens. Para completar, além da crise política, a economia também apresentava problemas. O PIB não crescia como prometemos.
Veja – O presidente pensou em aceitar o acordo?
Gilberto – Lula sempre demonstrou serenidade, mesmo nos piores momentos. Mandava a gente continuar trabalhando normalmente. O único instante em que o vi realmente deprimido foi às vésperas da crise política, quando ele estava irritado com a falta de resultados na economia. Lembro de um diálogo amargo dele com o Palocci. O presidente disse assim: “Poxa, eu confiei em você, eu confiei no Meirelles (presidente do Banco Central) contra tudo e contra todos. Vocês falaram que a economia ia bombar e não bombou coisa nenhuma”. Aquele momento foi muito duro. Ele parecia arrasado.
Veja – O presidente pensou em mudar a política econômica?
Gilberto – Muitas vezes, até porque nunca faltou quem falasse que ela estava errada e era preciso mudar tudo. Hoje ele avalia como um fato muito positivo ter confiado no Palocci e no Meirelles. Todo o carinho que Lula tem pelo Palocci e o respeito que tem pelo Meirelles decorrem de eles terem atravessado juntos o período das vacas magras.
Veja – O presidente vive reclamando da imprensa, e alguns de seus assessores já chegaram a acusar a Polícia Federal de vazar documentos para constranger o governo.
Gilberto – A matriz de análise do presidente é sempre a mesma: dar um pau em quem faz bobagem. Ele sempre fala que o papel da polícia e da imprensa é esse. As reações contrárias surgem em momentos em que ele enxerga uma carga de preconceito nas críticas. No governo passado, Fernando Henrique Cardoso também levou um pau danado da imprensa, não podemos esquecer. O problema é quando isso caminha para o preconceito, quando fica evidente que certas coisas que se escrevem sobre Lula não seriam escritas sobre outros presidentes.
Veja – O senhor se refere às críticas feitas a respeito da associação entre o filho do presidente e a Telemar, uma concessionária pública?
Gilberto – O presidente não vê nada de errado naquela coisa do Lulinha. Ele tem consciência de que o Fábio tomou uma iniciativa pessoal e está batalhando. Ele nunca pediu nada pelo Lulinha. É bem diferente do Vavá. O Vavá cometeu um ato ilícito, o Lulinha não. Mas ele acha que o Fábio está exposto mesmo pelo fato de ser filho do presidente. Sabe que é natural, do jogo.
Veja – As maiores crises do governo foram provocadas por petistas. Lula está descontente com o PT?
Gilberto – Ele já fez vários desabafos. Em relação aos problemas éticos, o presidente não os atribui ao partido, mas às pessoas. Não acha que a corrupção seja uma coisa intrínseca ao PT. A ligação de Lula com o PT é de criatura e criador, de pai e filho. Não passa pela cabeça dele nenhuma possibilidade de afastamento do PT.
Veja – Como o presidente viu o envolvimento do ex-ministro José Dirceu, um de seus mais próximos e poderosos assessores, com Waldomiro Diniz e o escândalo do mensalão?
Gilberto – Primeiro, José Dirceu e Lula não são tão íntimos assim, nunca tiveram relação de amizade. No caso Waldomiro, Lula criticou o Zé por ter confiado em um cara que não era confiável. O capítulo mensalão é tratado aqui de um modo diferente. O Zé era chefe da Casa Civil e o Delúbio Soares, tesoureiro do PT. Foi repassado dinheiro aos partidos como ajuda de campanha, não para os caras votarem com o governo. Quando a gente fala que não teve mensalão, é nesse sentido. Não é que eu concorde com isso, mas é diferente da história de que o governo dava mesada aos deputados. Então, o presidente não atribui ao Zé a responsabilidade de ter sido o operador desse esquema. Mesmo assim, na avaliação do presidente, era melhor que o Zé tivesse renunciado, passado um tempo submerso e reconquistado os direitos políticos. Um caminho mais ou menos como o do Palocci.
Veja – O presidente aceitaria candidatar-se a um terceiro mandato?
Gilberto – De jeito nenhum, isso é um assunto que não tem nenhuma possibilidade de prosperar. Se ele fosse a favor, não se empenharia tanto em procurar um candidato. Essa aposta na Dilma é séria, é real. Já o terceiro mandato não existe. É lógico que é muito melhor ouvir “Fica, Lula” do que “Fora, Lula”. Isso dá condição para ele fazer o sucessor, não para continuar. Olhando a história, quem prorrogou mandato só arrumou problema. O presidente até pode tentar voltar em 2014. Mas ficar agora, definitivamente não.
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