As sete maravilhas de Brasília
Roberto Pompeu de Toledo/Veja
Uma tentativa de corrigir o resultado sem calor nem surpresas de um concurso
Um recente concurso para eleger as sete maravilhas de Brasília, promovido por um certo Bureau Internacional de Capitais Culturais, terminou, computados os votos eletrônicos de 22.971 pessoas, com o seguinte resultado: 1ª colocada, Catedral; 2ª) Congresso Nacional; 3ª) Palácio da Alvorada; 4ª) Palácio do Planalto; 5ª) Templo da Boa Vontade; 6ª) Santuário Dom Bosco; 7ª) Ponte JK.
O eleitorado comportou-se de forma previsível. Mas Brasília não é só arquitetura, é uma capital que pulsa e estremece. Tampouco se resume a cidade a suas expressões mais óbvias. Como todo lugar que se preza, abriga recônditos insuspeitados. Diante do resultado de certa forma decepcionante do concurso, sem atenção ao verdadeiro espírito da capital, o colunista que vos fala houve por bem elaborar uma lista alternativa, na qual são levados em conta valores que vão além da solidez da argamassa ou da graça do desenho. Ei-la:
• Mansão da “República de Ribeirão Preto”. Alugada por velhos amigos do então ministro da Fazenda Antonio Palocci. Seria lugar de festas e de transações comerciais, segundo denúncia do caseiro Francenildo dos Santos Costa. Demonstra o espírito convivial reinante na capital da República e o valor da amizade. Mesmo no ápice do poder, o mais ilustre freqüentador da casa não descuidava dos companheiros do torrão natal.
• Restaurante Fiorella. Um dos restaurantes da Câmara dos Deputados. Tinha como concessionário Sebastião Buani, que denunciou ter pago, em 2003, um “mensalinho” ao deputado Severino Cavalcanti, então primeiro-secretário da Casa. Demonstra que nem tudo na capital precisa ser “ão”.
• Agência do Banco Rural. Deputados, assessores e familiares abasteciam-se ali das doações não contabilizadas distribuídas à generosa época de Delúbio Soares e Marcos Valério. Mostra a existência de dependências, na capital federal, capazes de produzir efeitos mais desconcertantes do que brinquedos de parque de diversões. Houve o caso da mulher de um deputado que foi pagar uma conta de TV por assinatura, se distraiu e saiu com 50 000 reais na bolsa.
• Apartamento do ex-deputado Roberto Jefferson. De suas janelas abertas, no período em que a cidade viveu sob a égide do episódio conhecido como “mensalão”, uma voz potente brindava os transeuntes com as notas sentidas de Cuore Ingrato. O então deputado procurava na música um descanso ao duplo afazer de denunciar e defender-se. Demonstra o amálgama de política e arte que também é apanágio da capital brasileira.
• Sala da Comissão de Orçamento do Congresso. Sede de sobrenaturais eventos ocorridos nos idos da década de 90. Como se dotados de vida própria, dinheiros saltavam das colunas de receita e despesa da União para se aninhar nas contas de seres pequenos, apropriadamente apelidados de “anões”. Ocorriam milagres, como um desses pequenos indivíduos ser contemplado 221 vezes com prêmios da loteria. Sustentam alguns que tais eventos não se circunscreveram àquela época. Continuariam a ocorrer até hoje e, em se procurando, se revelariam. O fenômeno, se confirmado, demonstraria a continuidade dos usos na capital federal.
• Casa da Dinda. Residência particular de um ex-presidente. Numa época de economia travada e hiperinflação, constituiu-se num cantinho de progresso na capital federal. Recebeu melhorias nos jardins, na iluminação e no lago artificial, culminando com a instalação de dez cascatas, em diferentes pontos da propriedade. Ao fastio sucedeu a decadência. Apeado do poder e ausente da cidade, o proprietário condenou-a a amargar, como ele próprio, um período de ostracismo e decadência. Ultimamente, ambos se reerguem: o dono, de volta à cidade, e a casa, submetida a uma reforma. Nesta lista, a casa exemplifica o poder de regeneração que, como nos organismos mais resistentes, também se manifesta em Brasília.
• Apartamento do ex-senador Ney Suassuna. Neste local, no ano de 2002, corria uma animada festa de fim de ano, presentes políticos e jornalistas, mas o senador Renan Calheiros só tinha olhos para a moça de compridos cabelos negros. Começou aí o namoro com Mônica Veloso. O local entra na lista como lembrança de que o amor também floresce em meio à vegetação miúda do cerrado e à secura do ar de Brasília. Poderia ser lembrado igualmente o salão de festas do Clube das Nações, onde, em setembro de 1990, ao som de Besame Mucho, teve início outro célebre caso de amor na capital federal, o dos ministros Zélia Cardoso de Mello e Bernardo Cabral. Ganha o apê de Suassuna por ter abrigado evento mais recente.
Ao contrário da lista oficial, esta vai sem hierarquia. O colunista hesita em dar maior peso a esta ou aquela das maravilhas. O leitor e a leitora estão convidados a fazê-lo, assim como a corrigir erros e omissões. Façam suas apostas, senhoras e senhores.
Uma tentativa de corrigir o resultado sem calor nem surpresas de um concurso
Um recente concurso para eleger as sete maravilhas de Brasília, promovido por um certo Bureau Internacional de Capitais Culturais, terminou, computados os votos eletrônicos de 22.971 pessoas, com o seguinte resultado: 1ª colocada, Catedral; 2ª) Congresso Nacional; 3ª) Palácio da Alvorada; 4ª) Palácio do Planalto; 5ª) Templo da Boa Vontade; 6ª) Santuário Dom Bosco; 7ª) Ponte JK.
O eleitorado comportou-se de forma previsível. Mas Brasília não é só arquitetura, é uma capital que pulsa e estremece. Tampouco se resume a cidade a suas expressões mais óbvias. Como todo lugar que se preza, abriga recônditos insuspeitados. Diante do resultado de certa forma decepcionante do concurso, sem atenção ao verdadeiro espírito da capital, o colunista que vos fala houve por bem elaborar uma lista alternativa, na qual são levados em conta valores que vão além da solidez da argamassa ou da graça do desenho. Ei-la:
• Mansão da “República de Ribeirão Preto”. Alugada por velhos amigos do então ministro da Fazenda Antonio Palocci. Seria lugar de festas e de transações comerciais, segundo denúncia do caseiro Francenildo dos Santos Costa. Demonstra o espírito convivial reinante na capital da República e o valor da amizade. Mesmo no ápice do poder, o mais ilustre freqüentador da casa não descuidava dos companheiros do torrão natal.
• Restaurante Fiorella. Um dos restaurantes da Câmara dos Deputados. Tinha como concessionário Sebastião Buani, que denunciou ter pago, em 2003, um “mensalinho” ao deputado Severino Cavalcanti, então primeiro-secretário da Casa. Demonstra que nem tudo na capital precisa ser “ão”.
• Agência do Banco Rural. Deputados, assessores e familiares abasteciam-se ali das doações não contabilizadas distribuídas à generosa época de Delúbio Soares e Marcos Valério. Mostra a existência de dependências, na capital federal, capazes de produzir efeitos mais desconcertantes do que brinquedos de parque de diversões. Houve o caso da mulher de um deputado que foi pagar uma conta de TV por assinatura, se distraiu e saiu com 50 000 reais na bolsa.
• Apartamento do ex-deputado Roberto Jefferson. De suas janelas abertas, no período em que a cidade viveu sob a égide do episódio conhecido como “mensalão”, uma voz potente brindava os transeuntes com as notas sentidas de Cuore Ingrato. O então deputado procurava na música um descanso ao duplo afazer de denunciar e defender-se. Demonstra o amálgama de política e arte que também é apanágio da capital brasileira.
• Sala da Comissão de Orçamento do Congresso. Sede de sobrenaturais eventos ocorridos nos idos da década de 90. Como se dotados de vida própria, dinheiros saltavam das colunas de receita e despesa da União para se aninhar nas contas de seres pequenos, apropriadamente apelidados de “anões”. Ocorriam milagres, como um desses pequenos indivíduos ser contemplado 221 vezes com prêmios da loteria. Sustentam alguns que tais eventos não se circunscreveram àquela época. Continuariam a ocorrer até hoje e, em se procurando, se revelariam. O fenômeno, se confirmado, demonstraria a continuidade dos usos na capital federal.
• Casa da Dinda. Residência particular de um ex-presidente. Numa época de economia travada e hiperinflação, constituiu-se num cantinho de progresso na capital federal. Recebeu melhorias nos jardins, na iluminação e no lago artificial, culminando com a instalação de dez cascatas, em diferentes pontos da propriedade. Ao fastio sucedeu a decadência. Apeado do poder e ausente da cidade, o proprietário condenou-a a amargar, como ele próprio, um período de ostracismo e decadência. Ultimamente, ambos se reerguem: o dono, de volta à cidade, e a casa, submetida a uma reforma. Nesta lista, a casa exemplifica o poder de regeneração que, como nos organismos mais resistentes, também se manifesta em Brasília.
• Apartamento do ex-senador Ney Suassuna. Neste local, no ano de 2002, corria uma animada festa de fim de ano, presentes políticos e jornalistas, mas o senador Renan Calheiros só tinha olhos para a moça de compridos cabelos negros. Começou aí o namoro com Mônica Veloso. O local entra na lista como lembrança de que o amor também floresce em meio à vegetação miúda do cerrado e à secura do ar de Brasília. Poderia ser lembrado igualmente o salão de festas do Clube das Nações, onde, em setembro de 1990, ao som de Besame Mucho, teve início outro célebre caso de amor na capital federal, o dos ministros Zélia Cardoso de Mello e Bernardo Cabral. Ganha o apê de Suassuna por ter abrigado evento mais recente.
Ao contrário da lista oficial, esta vai sem hierarquia. O colunista hesita em dar maior peso a esta ou aquela das maravilhas. O leitor e a leitora estão convidados a fazê-lo, assim como a corrigir erros e omissões. Façam suas apostas, senhoras e senhores.
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