16.9.08

"Não sou eu em 70% das imagens"

Andye Iore/Agência CHN

Um drama que já dura quase três anos. Essa é a rotina que a jornalista maringaense Rose Leonel, 38 anos, vem sofrendo para reparar o que ela chama de “grande injustiça”. Ela é uma das maiores vítimas de crime cibernético no Brasil em um caso que já ganhou repercussão internacional e está na Justiça. Tudo começou com o fim de um relacionamento com um empresário da cidade que durou quase quatro anos e que ela decidiu terminar em setembro de 2005. A vítima alega que o ex-companheiro não aceitou o fim do relacionamento, tentou reatar e a ameaçou que acabaria com a vida dela caso contrário. Leonel lembra que eles seguiram se falando por mais um mês ainda e, logo em seguida, fotos eróticas e pornográficas – inclusive com outras pessoas - com imagens de Rose Leonel passaram a ser divulgadas por mailing na cidade, se espalharam por sites ganhando repercussão no país e voltavam a ser enviadas de tempos em tempos. “Só quero que ele reconheça o que fez, assuma. Ele não só me expôs, como me vendeu pela internet”, declarou Leonel. “Sou vítima de um crime porque não sou eu em 70% das imagens e não faço esse tipo de coisa”.
A indignação da vítima se deve ao fato de que as imagens tinham números de telefone e e-mail da jornalista e referências às empresas onde ela trabalhava, além de indicar que ela seria garota de programa.
A situação revirou a vida de Rose Leonel que passou a viver reclusa, com insegurança, tendo contato com poucas pessoas como familiares e amigos mais próximos. Além de fazer com que ela fosse demitida de onde trabalhava e precisou focar seu trabalho em programa independente de televisão, onde também teve dificuldades até de fechar contratos publicitários pela repercussão do caso das fotos. Ela também passou a receber propostas de teor sexual por e-mail e telefone.
A vítima não nega que tenha feito fotos íntimas com o companheiro durante o relacionamento, em uma confiança amorosa. Mas, ela garante que a maioria das imagens divulgadas seria montagem feita por um técnico em informática contratado pelo acusado e ex-companheiro e que também é alvo de ações judiciais.
Rose Leonel não entra em muitos detalhes sobre alguns aspectos da polêmica como o motivo que a levou a terminar o relacionamento com o acusado, sobre valores envolvendo ações judiciais, entre outras situações. Mas, ela lamenta que uma ação criminal tenha tido sentença apenas com o pagamento de multa e não estipulou a retirada das imagens da internet. A multa pecuniária teria sido no valor de R$ 3 mil (somando do suposto autor da idéia e das ações do técnico em divulgar as fotografias) e que esse dinheiro ficou com um primeiro advogado que cuidou do caso em Maringá. Ela garante que não ficou com nada desse valor.

Entrevistas

Apesar de todo o sofrimento, Rose Leonel se mostra forte e não tem receio em falar sobre seu drama. Até foi em rede nacional em julho passado nos programas Super Pop, da Rede TV, e no Pânico, na Rádio Jovem Pan, onde reviveu sua história. Como o caso não se resolvia pela Justiça e as fotos continuavam a ser divulgadas, ela decidiu dar essas entrevistas para que conseguisse contato com algum especialista que a ajudasse. E foi o que aconteceu. Um perito em segurança digital está trabalhando no caso há dois meses. E também já houve apreensão pela Justiça de computadores dos suspeitos e estão em andamento duas ações contra duas pessoas físicas e uma jurídica.
Ela nega sem hesitar que estaria dando publicidade à divulgação das fotos para poder fazer um ensaio sensual para alguma revista masculina e confirma que já recebeu contatos, mas recusou. “Nem por dinheiro nenhum”, afirmou e ainda citou que nem sabe o que vai fazer caso ganhe na Justiça algum valor de indenização em novas ações judiciais.

Superação
Rose Leonel tem dois filhos (um menino de 14 anos e uma menina de 11 anos), é formada em Letras pela Universidade Estadual de Maringá (em 1994) e em Comunicação Social pela Faculdades Maringá (em 2005) e conseguiu se estabilizar profissionalmente em meio ao drama trabalhando bastante com o programa de variedades “Bom Demais”, onde entrevista pessoas de diferentes setores maringaenses. Ela também cursa pós-graduação em Comunicação e Educação, está terminando um livro com crônicas e poesias sobre seu polêmico caso, planeja fazer um terceiro curso de graduação e montar uma Organização Não-Governamental (ONG) para ajudar outras mulheres que passaram por uma situação semelhante. “Esse tipo de crime na internet é como se fosse um crime hediondo também, é como se a mulher fosse violentada”, comparou Leonel que pretende alertar às mais jovens para terem cuidado nos relacionamentos e evitarem deixar que os namorados fotografem a intimidade do casal. “A mulher é sempre mais emotiva que o homem, mas não se pode confiar”.

Quanto ao acusado da iniciativa de enviar as fotos pela internet, ela fala com serenidade que já o perdoou e foca sua vida em dar melhores condições aos filhos. “Todo mundo tem mãe, tia, alguma mulher na família e isso poderia acontecer em qualquer família. Quero que as pessoas me vejam como mãe de família, pois eu vivo do meu trabalho honestamente”, comentou sobre o preconceito e discriminação que sofre até hoje, já que pessoas a julgam somente pelas fotos divulgadas sem saber todos os fatos.


Caso é um dos maiores da história do Brasil

Há duas novas ações judiciais sobre o caso Rose Leonel que deram entrada no Fórum maringaense nas duas últimas semanas. Uma de indenização que tramita na 4ª Vara Cível e outra queixa crime na 4ª Vara Criminal. Ambas correm em segredo de Justiça, tanto pelo teor por envolver fotografias, quanto em relação aos réus. “Esse caso da Rose Leonel é um dos maiores que já vi. Não há dinheiro que pague um dano moral como esse”, comentou o advogado Paulo Oliver, que pegou o caso em andamento, reside em São Paulo e tem grande experiência em ações por crime de uso indevido de imagem. Entre eles casos de modelos que saíram em revistas de circulação nacional, cujas fotos foram usadas em sites sem autorização e também de um de grande repercussão sobre o histórico Virgulino Ferreira, o “Lampião”.
O advogado explicou que não foi definido um valor especifico na ação sobre indenização, mas que eles determinaram uma média entre R$ 10 mil a R$ 30 mil para cada site localizado com fotografias da vítima que estiverem caracterizadas com o crime. Até o momento seriam aproximadamente 80 sites confirmados, inclusive de países como Alemanha, Portugal e Estados Unidos. Mas, haveria outros a serem analisados.
Oliver comentou que já foram apreendidos diversos itens como documentos, computadores, gravações, entre outras situações que indicam crime e que o laudo final sobre os computadores ainda não foi entregue conforme surgiu boato em Maringá. (Andye Iore)