21.11.08

Acórdão - Agravo de instrumento

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 499280-9, DE MARINGÁ - 4ª VARA CÍVEL
AGRAVANTE: COMUNIDADE EVANGÉLICA DA LIBERTAÇÃO
AGRAVADO: MUNICÍPIO DE MARINGÁ
RELATORA: DESª REGINA AFONSO PORTES


AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - TERMO DE PERMISSÃO DE USO DE BEM PÚBLICO - ATO NEGOCIAL UNILATERAL, DISCRICIONÁRIO E PRECÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - DESVIO DE FINALIDADE PELO PERMISSIONÁRIO - REINTEGRAÇÃO DE POSSE DO MUNICÍPIO - POSSIBILIDADE - RECURSO DESPROVIDO.
“Permissão de uso é ato negocial unilateral, discricionário e precário através do qual a Administração faculta ao particular a utilização individual de determinado bem público. Como ato negocial, pode ser com ou sem condições, gratuito ou remunerado, por tempo certo ou indeterminado, conforme estabelecido no termo próprio, mas sempre modificável e revogável unilateralmente pela Administração, quando o interesse público o exigir, dados sua natureza precária e o poder discricionário do permitente para consentir e retirar o uso especial do bem público.” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 493).



Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 499280-9, de Maringá - 4ª Vara Cível, em que é Agravante COMUNIDADE EVANGÉLICA DA LIBERTAÇÃO e Agravado MUNICÍPIO DE MARINGÁ.

Tratam estes autos de Agravo de Instrumento manejado pela COMUNIDADE EVANGÉLICA DA LIBERTAÇÃO contra decisão de fl. 79-TJ, proferida em Ação de Reintegração de Posse, ajuizada pelo MUNICÍPIO DE MARINGÁ, que concedeu a liminar pleiteada, determinando a reintegração do autor na posse do imóvel e, caso não haja desocupação voluntária, o despejo compulsório da agravante.

Sustenta a agravante que celebrou com o Município de Maringá, em 23/07/2004, Termo de Permissão de Uso de Bem Público (nº 14/2004), dos imóveis constituídos pelos lotes nºs 02, 03 e 04, da quadra nº 215, do Parque Residencial Tuiuti, consoante matrículas nºs 55.967, 55.968 e 55.969 do Registro de Imóveis do 1º Ofício de Maringá; que o referido termo, foi firmado com o fito de regularizar a ocupação dos imóveis na gestão anterior do Prefeito José Claudio, tendo em vista que a ocupação se deu há mais de 10 anos; que na cláusula primeira, ficou estabelecido que a permissionária manteria em funcionamento uma casa de oração, uma casa de recuperação e uma casa pastoral; que não está implícito no referido termo, que a recorrente estava obrigada a edificar qualquer construção; que o termo somente foi assinado pela agravante, mediante a promessa de que o mesmo seria renovado, findo o prazo de 02 (dois) anos, o que não foi cumprido pelo Município.

Afirma que a cláusula de rescisão automática do termo de permissão, estabelecida unilateralmente pelo Município, não deve prevalecer; que a agravante ocupa e está no imóvel há mais de 13 (treze) anos; que vem cumprindo com as condições pactuadas no aludido termo de permissão; que para a concessão tutelar da posse, em caráter liminar, deve esta ser contemporânea aos atos turbativos; que não resta demonstrado o esbulho possessório. Requereu a concessão de efeito suspensivo ativo e, ao final o provimento do recurso.

Esta Relatora, às fls. 101/103, negou o efeito suspensivo pleiteado.

Contraminuta ao agravo, às fls. 108/116.

Informações do Juiz da causa, à fl. 120.

Parecer da Procuradoria Geral de Justiça pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

DECIDO

A Comunidade Evangélica da Libertação manejou este recurso de Agravo de Instrumento, pretendendo a reforma da decisão singular que determinou a reintegração do Município de Maringá na posse do imóvel, objeto do Termo de Permissão de Uso de Bem Público nº 14/2004.

Consta dos autos que o Município de Maringá celebrou com a Comunidade Evangélica da Libertação, Termo de Permissão de Uso de Bem Público sob nº 14/04, em data de 23 de julho de 2004, com a finalidade de que a entidade mantivesse em funcionamento Casa de Oração, de Recuperação e Pastoral, sendo que na cláusula 2ª do aludido Termo, havia a determinação de que a permissão seria a título precário, pelo prazo de 02 (dois) anos, e rescindível em caso de desvio de finalidade.

Em 23 de julho de 2006, a municipalidade notificou a ora agravante para desocupar o imóvel, o que não foi cumprido e, ainda, restou constatado o desvio de finalidade, através de relatórios efetuados por órgãos fiscalizadores.

Por ser precária, a permissão de uso de bem público é um ato unilateral da Administração Pública, firmado através de termo e não de contrato administrativo, apesar de ser regido pelas normas de direito público.

O contrato de permissão (cessão) de uso de bens públicos, difere da concessão de serviços públicos, porquanto nesse tipo de avença, o domínio dos bens é cedido no interesse coletivo para a exploração precária do particular.

Sobre o tema, José Afonso da Silva, em seu “Comentário Contextual à Constituição” assim leciona: “A autorização é ato administrativo unilateral, discricionário e precário; não se destina apenas à execução do serviço público, pois há autorização administrativa ao particular também para a prática de utilização de bens públicos. Também se admite permissão administrativa para o uso de bens públicos, nesse caso ela ainda pode ser conceituada como ato negocial, discricionário e precário...”. (SILVA, José Afonso da. Comentário Contextual à Constituição. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 725.”)

Em igual sentido, Hely Lopes Meirelles corrobora o que foi dito: “Permissão de uso é ato negocial unilateral, discricionário e precário através do qual a Administração faculta ao particular a utilização individual de determinado bem público. Como ato negocial, pode ser com ou sem condições, gratuito ou remunerado, por tempo certo ou indeterminado, conforme estabelecido no termo próprio, mas sempre modificável e revogável unilateralmente pela Administração, quando o interesse público o exigir, dados sua natureza precária e o poder discricionário do permitente para consentir e retirar o uso especial do bem público.” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 493).

Para Diogo de Figueiredo Moreira Neto: “O regime permissional, menos rígido, tem sido caracterizado na doutrina tradicional como vínculo produzido por simples manifestação de vontade unilateral da Administração, através de um ato administrativo, discricionário e precário, que seria, por isso revogável a qualquer tempo.” (Diogo de Figueiredo Moreira Neto. Curso de Direito Administrativo. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 264).

A autorização ou permissão, no magistério de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “é o ato unilateral e discricionário pelo qual o Poder Público faculta ao particular o uso privativo de bem público, a título precário.” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 218.)

Para Odete Medauar, ratificando o que foi dito pela refinada doutrina já declinada, deixou grafado em seu magistral “Direito Administrativo Moderno”: “a) Autorização de uso - é o ato administrativo discricionário e precário, pelo qual a Administração consente que um particular utilize privativamente um bem público. Pode incidir sobre qualquer tipo de bem. De regra, o prazo de uso é curto; poucas e simples são suas normas disciplinadoras: independe de autorização legislativa e licitação; pode ser revogada a qualquer tempo.” (MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 8. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 290-291).

Desta feita, a precariedade é verificada pela possibilidade de desfazimento do ato de permissão de uso de bem público, a qualquer momento. É o que a doutrina chama de permissões condicionadas.

O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que, o ato administrativo de permissão de uso de imóvel municipal por particular, possui natureza precária e discricionária, podendo ser cancelada a qualquer momento:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO ADMINISTRATIVO. PERMISSÃO DE USO DE IMÓVEL MUNICIPAL POR PARTICULAR. NATUREZA PRECÁRIA E DISCRICIONÁRIA. POSSIBILIDADE DE CANCELAMENTO. PREVISÃO CONTRATUAL. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.
1. A autorização de uso de imóvel municipal por particular é ato unilateral da Administração Pública, de natureza discricionária, precária, através do qual esta consente na prática de determinada atividade individual incidente sobre um bem público. Trata-se, portanto, de ato revogável, sumariamente, a qualquer tempo, e sem ônus para o Poder Público.
2. Como a Administração Pública Municipal não mais consente a permanência da impetrante no local, a autorização perdeu sua eficácia. Logo, não há direito líquido e certo a ser tutelado na hipótese dos autos.
3. Comprovação nos autos da existência de previsão contratual no tocante ao cancelamento da permissão debatida.
4. Recurso não provido.” (STJ. Rel. José Delgado, RMS 16280/RJ, 1ª T., DJ 19 abr. 2004, p. 154.)

A permissão de uso, quando dada precariamente (como é de sua natureza), não cria obrigações para a Administração Pública, que concede a permissão e a retira discricionariamente, independentemente do consentimento do permissionário, segundo razões exclusivamente de interesse público.

Destarte, a permissão de uso de bem público se atrela à discricionariedade da Administração Pública, na destinação da utilização de determinado bem público, além da sua própria precariedade.

Feitas estas considerações, face a existência de cláusula expressa quanto à revogação unilateral do ato precário de permissão de uso, não há óbice para a reintegração de posse do Município no imóvel, razão pela qual deve ser mantida a decisão singular.

Diante do exposto, ACORDAM os Desembargadores integrantes da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso.

Participaram do julgamento presidido pela Excelentíssima Desembargadora REGINA AFONSO PORTES (Relatora), Excelentíssimos Senhores, Juiz Convocado JURANDYR REIS JUNIOR e Desembargadora MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA.



Curitiba, 11 de novembro de 2008.



DESª REGINA AFONSO PORTES
Presidente e Relatora