6.1.09

Cobrança de tributo na taxa de água

Número do processo: 1.0105.03.101734-3/001(1)
Relator: CÉLIO CÉSAR PADUANI
Relator do Acordão: CÉLIO CÉSAR PADUANI
Data do Julgamento: 02/02/2006
Data da Publicação: 14/02/2006
Inteiro Teor:
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TARIFA DE SERVIÇO URBANO DE COLETA E REMOÇÃO DE LIXO. ÁGUA E ESGOTO. APELAÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. DANO IRREPARÁVEL À PARTE. INOCORRÊNCIA. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. De fácil constatação que qualquer recurso interposto na ação civil pública deve ser recebido somente no efeito devolutivo. Todavia, “O Juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos para evitar dano irreparável à parte”, o que inocorre nos autos. 2. Na espécie, em nenhum momento foi determinada medida que importasse na efetiva paralisação da cobrança das combatidas taxas, mas apenas alteração do modo através do qual as mesmas vêm sendo cobradas. Não se pode presumir que o simples fato de o Município cobrar em separado as referidas taxas, tornará os cidadãos inadimplentes ou maus pagadores, mas, mesmo que assim se tornem, tem o Município a via adequada para exigi-la. 3. Recurso a que se nega provimento.

AGRAVO N° 1.0105.03.101734-3/001 - COMARCA DE GOVERNADOR VALADARES - AGRAVANTE(S): MUNICÍPIO GOVERNADOR VALADARES - AGRAVADO(A)(S): MOVIMENTO DONAS CASA CONSUMIDORES MINAS GERAIS GOVERNADOR VALADARES - RELATOR: EXMO. SR. DES. CÉLIO CÉSAR PADUANI

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO.

Belo Horizonte, 02 de fevereiro de 2006.

DES. CÉLIO CÉSAR PADUANI - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. CÉLIO CÉSAR PADUANI:

VOTO

Trata-se de recurso de agravo de instrumento, com pedido de atribuição de efeito suspensivo-ativo, interposto pelo Município de Governador Valadares contra interlocutória (f. 102/103-TJ, em traslado) proferida pelo MMº Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Governador Valadares, que, nos autos da ação civil coletiva proposta pelo Movimento das Donas de Casa e Consumidores de Minas Gerais de Governador Valadares - MDC/MG-GV, julgada parcialmente procedente, indeferiu o pleito de concessão de efeito suspensivo ao recurso de apelação, à consideração do órgão julgador de que “...não se pode presumir que o simples fato de o Município cobrar a tarifa de coleta de lixo em separado da conta de água e esgoto tornará os cidadãos valadarenses inadimplentes ou maus pagadores, mas, mesmo que assim se tornassem, teria o requerido a via adequada para exigi-la” (sic).

O recorrente sustenta, no recurso de f. 02/08-TJ, que não há ilegalidade na forma de arrecadação usada pelo agravante, muito menos irregularidade na sua prática, já que ambos os serviços cobrados são públicos, havendo nítido interesse público em que assim seja feito, porque representa economia, que ao final se reverte ao próprio consumidor, que não terá de pagar pelos serviços de cobrança. Aduz que o princípio para a cobrança casada pelo Poder Público de tributos e preços públicos está expressamente lançado na Constituição Federal de 1988 que passou a admitir a cobrança de contribuição em contas de concessionários públicos. Ademais, se a cobrança vier a ser feita separadamente, poderá o valor da taxa de coleta de lixo ser acrescido da taxa de expediente, o que fará com que os contribuintes paguem valor superior ao que vêm pagando.

O recurso veio instruído (f. 08/110-TJ).

O agravante pediu efeito suspensivo-ativo, este indeferido à f. 118-TJ.

Deferida a formação do recurso (f. 117/119-TJ), requisitou-se informações ao digno Juiz da causa, nos termos do art. 527, IV, CPC, estas às f. 137/139-TJ, e bem assim determinou-se a intimação do recorrido, na pessoa de sua advogada, para que, querendo, responda (CPC, art. 527, V), porém, deixou transcorreu in albis o referido prazo (f. 151-TJ).

Contra minha decisão de f. 117/119-TJ, o ora agravante, em petição de f. 141/145-TJ, requereu a reconsideração da parte em que foi indeferido o pedido de efeito suspensivo-ativo e, caso assim não se entendesse, que o mesmo fosse recebido como agravo regimental, entretanto, não foi conhecido do mesmo, mediante decisão de f. 147/148-TJ.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça se manifestou pelo provimento do presente recurso (f. 155/157-TJ).

É o relatório.

Passo a decidir.

Conheço do recurso, aos seus pressupostos.

À fundamentação de meu voto.

Tenho que o Movimento das Donas de Casa e Consumidores de Governador Valadares - MDC/MG-GV, ajuizou ação civil coletiva contra SAEE (Serviço Autônomo de Água e Esgoto) e Município de Governador Valadares, objetivando a suspensão da tarifa de serviço urbano de coleta e remoção de lixo e da “taxa de esgoto” conjuntamente com a tarifa de fornecimento de água, bem como “seja considerada abusiva a atual fórmula aplicada para tarifa básica do lixo e que os valores eventualmente cobrados sejam devolvidos em dobro.

Após o magistrado julgar parcialmente procedente a sobredita ação civil pública, declarando indevida e abusiva a referida cobrança conjunta, negou efeito suspensivo à apelação interposta pelo ora agravante, à consideração de não ter sido, em momento algum, determinada qualquer medida que importasse na efetiva paralisação da cobrança da referida taxa, mas apenas compelindo o Município em alterar o modo através do qual a mesma vem sendo cobrada.

No entendimento do recorrente, se os efeitos da sentença apelada não forem suspensos, poderão advir danos irreparáveis à economia do município, bem como à população e ao meio ambiente, pois, da denegação do aludido efeito, decorre a imediata eficácia da sentença prolatada e, assim sendo, o Município vê-se compelido, de imediato, suprimir a cobrança da taxa de lixo das faturas de água e esgoto e passar a cobrá-la em conta avulsa, num procedimento que, além de gerar novas despesas e gastos, implica numa forma de cobrança que demandará tempo de assimilação pela população e poderá gerar uma elevação do nível de inadimplência, a qual repercutirá na qualidade do serviço de limpeza urbana.

Ora, de acordo com o art. 14 da Lei 7347/85:

“Art. 14 - O Juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos para evitar dano irreparável à parte”.

De fácil constatação, a contrario sensu, que qualquer recurso interposto na ação civil pública deve ser recebido somente no efeito devolutivo; todavia, como obtempera Nelson Nery Júnior, em Código de Processo Civil Comentado, 6ª ed., ed. Revista dos Tribunais, São Paulo, 2.002, p. 1362, “...havendo ameaça de iminente perecimento de direito ou de dano irreparável à parte, o juiz pode conceder efeito suspensivo ao recurso...”.

Isto é, em se tratando de recursos interpostos em ação civil pública, a regra geral é no sentido de que estes apenas tenham o efeito devolutivo, sendo efeito suspensivo uma exceção, quando presentes os requisitos de fumus boni iuris e do periculum in mora, o que não se configura no caso apresentado.

Neste sentido:

“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. APELAÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. 1. De acordo com o art. 14 da Lei 7.345/85, ostentará efeito tão-só devolutivo a apelação interposta contra a sentença de procedência, verificando-se o receio de lesão irreparável. Para medir a extensão do dano, há que se utilizar o princípio da proporcionalidade, deixando de sacrificar o bem mais valioso, em tese, e que no caso consiste no meio ambiente, em detrimento da atividade econômica desenvolvida pelo particular. 2. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70007039001, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Araken de Assis, Julgado em 25/02/2004)

“EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EFEITOS DO RECURSO DE APELAÇÃO. O recurso de apelação de sentença proferida em ação civil pública tem, em regra, efeito devolutivo.Ausência do periculum in mora e do fumus boni iuris, pressupostos ensejadores do efeito suspensivo. Inexistência de perigo de dano irreparável ou de difícil reparação. Por maioria, negaram provimento, vencido o Des. Genaro José Baroni Borges, que o provia”. (Agravo de Instrumento Nº 70006728398, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sergio Luiz Grassi Beck, Julgado em 26/11/2003)

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EFEITOS DO RECURSO DE APELAÇÃO. De regra, o recurso de apelação de sentença proferida em ação civil pública tem efeito devolutivo, o que não impede o juiz de conceder a suspensividade. Caso concreto em que houve negativa ao pedido de liminar e, ao depois, de tutela antecipada na sentença, tudo sob o fundamento da ausência dos pressupostos ensejadores a tanto, seja o periculum in mora como o fumus boni juris e a denominada verossimilhança e o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação. (...)Sentença de procedência proferida contra Câmara de Vereadores, determinando a diminuição do número de edis naquela Casa Legislativa. Recurso de apelação recebido somente no efeito devolutivo, decisão da qual não houve regular intimação à demandada. Instauração de execução provisória de sentença sem citação e alijamento do mandato, de pronto, dos vereadores atingidos pelo ato jurisdicional e que não foram parte no processo. Ilegalidade. Quebra dos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório que ombreiam o Estado Democrático de Direito. Além disso, a sentença proferida contra Câmara de Vereadores, quando detentora de personalidade judiciária em razão de estar atuando na defesa de suas prerrogativas institucionais, está sujeita ao reexame necessário, não produzindo efeitos até apreciação e confirmação pelo 2º grau de jurisdição. Ineficácia da alegação de descumprimento do artigo 526 do CPC. Precedente da Excelsa Corte no sentido da cautela necessária em casos tais, recomendando a concessão de efeito suspensivo no caso concreto.Agravo de instrumento provido”. (TJRS, AI Nº 70002395820, 3º Câmara Cível, TJRGS, relator: Augusto Otávio Stern, jugado em 10/05/2001)

Destarte, a concessão do efeito suspensivo ao apelo é uma faculdade atribuída ao Julgador, de acordo com o sobredito dispositivo.

De fato, o dano tanto poderia se produzir ao interesse tutelado pelo agravante, quanto ao defendido pelo agravado. De um lado, a paralisação da eficácia do provimento acentuaria o dano ambiental; de outro lado, a eficácia imediata implicaria prejuízo econômico ao réu. Esta espécie de conflito resolver-se-ia pela ponderação dos interesses em conflito.

Contudo, conforme destaca o magistrado, em nenhum momento foi determinada medida que importasse na efetiva paralisação da cobrança da referida taxa, mas apenas alteração do modo através do qual a mesma vem sendo cobrada. Não se pode presumir que o simples fato de o Município cobrar em separado as taxas mencionadas, tornará os cidadãos valadarenses inadimplentes ou maus pagadores, mas, mesmo que assim se tornem, tem o Município a via adequada para exigi-la.

Não se encontram nos autos, então, o periculum in mora e o fumus boni iuris, ou qualquer possibilidade de dano irreparável à parte, pressupostos ensejadores do efeito suspensivo.

Assim, o recurso de apelação interposto pela parte agravante deve ser recebido apenas em seu efeito devolutivo, nos termos do art.520, IV, do Código de Processo Civil.

Nego provimento ao recurso.

Custas “ex lege”.

É como voto.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): AUDEBERT DELAGE e MOREIRA DINIZ.

SÚMULA : NEGARAM PROVIMENTO.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

AGRAVO Nº 1.0105.03.101734-3/001