28.2.09

Ação Ciretran - sentença

Processo nº 0599/2000(ação civil pública)MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁvs. PAULO ROBERTO PORPIGLIO, ISMAEL MARTINS BARBOSA, ALVARO APARECIDO MONTESCHIO, ODAIR HENRIQUE, HOMERO MONQUERO JUNIOR e NILTON CESAR MENDES DE MORAIS Sentença Ação civil pública fundada na Lei de Improbidade (Lei Federal nº 8429, de 1992). Servidores que, associados a terceiros, exigem vantagem pecuniária para praticarem atos de ofício. Cabimento da ação civil pública, possibilidade jurídica do pedido e le-gitimidade ativa ad causam do Ministério Público que são inquestionáveis. Prescrição inocorrente. Delitos cuja materialidade e autoria estão confirmadas por sentença criminal transitada em julgado. Inviabilidade da rediscussão de tais temas (art. 935 CPC). Procedência.- I. - 1Alega a inicial, em síntese, o seguinte: a) os réus fo-am denunciados, e depois condenados definitivamente, pela prática de crimes de concussão; b) segundo se com-provou na ação penal, os réus, associados para o ilícito e sob comando do requerente, que era chefe da 13ª Ciretran de Maringá, exigiam dos despachantes de trânsito, e de particulares, o pagamento de propinas de R$ 5,00 até R$ 50,00 para praticarem atos de ofício, como tramitação de processos administrativos, fornecimento de documentos, entrega de papéis pertencentes às vítimas, que cediam sob ameaça de que, se não pagassem, seus papéis ou processos seriam “engavetados”; c) segundo apurado, os valores produto da concussão eram rateados entre os réus; d) os réus, assim agindo, violaram os deveres da Lei Estadual nº 6174/70, os princípios do art. 37 da Consti-tuição da República, e praticaram atos de improbidade administrativa e obtiveram enriquecimento ilícito, incidindo, assim, nas hipóteses dos arts. 9º caput, 9º I, 11 ca-put e 11 I da Lei Federal nº 8429/92, e merecendo as penas do art. 12 I da mesma lei.2Pediu a condenação de todos os réus nas penas do art. 12 da Lei de Improbidade (Lei Federal nº 8429, de 1992), e nos encargos da sucumbência.3Citados, o réu contestaram.4O réu Nilton (f.1380 et seq.) e o réu Paulo (f.1457 et seq.) invocam preliminar de ilegitimidade ativa ad cau-sam do Ministério Público. 5Os réus Ismael (f.1468 et seq.), Homero (f.1505 et seq.) e Odair (f.1542 et seq.) invocam a mesma prelimi-nar de ilegitimidade ativa ad causam, e ainda: a) alegam a impossibilidade jurídica do pedido de perdimento de bens e ressarcimento do dano, tendo em vista que tais sanções não cabem no regime da LACP, e só poderia ser formu-lado em ação civil de reparação de danos; b) alegam a prescrição, porque os fatos teriam ocorrido em 1995, e a ação foi ajuizada mais de cinco anos depois; c) invocam preliminar de inépcia por inadequação da via eleita, dizendo que a ação civil pública é supletiva e não é admissível quando caiba ação popular, como é o caso aqui.6O réu Álvaro (f.1462 et seq.) não alegou prelimina-res, e defendeu-se apenas no mérito, alegando, nesse ponto, o mesmo que alegaram todos os demais réus: que não praticaram ato de improbidade, que os fatos de que fala a inicial são falsos, que a prova exibida é insuficiente para sustentar a acusação, que são pobres e não enriqueceram à custa dos fatos discutidos.7Todos os réus postularam a extinção do processo ou a improcedência do pedido inicial, e a condenação do autor nos encargos da sucumbência.8O DETRAN, intimado, interveio a f.1579 et seq. para aderir integralmente à petição inicial.9A parte autora manifestou-se sobre a contestação, rei-terando os argumentos da inicial.10Anunciado o julgamento antecipado, não houve recurso.11É o relatório.- II. - 12A preliminar de ilegitimidade ativa ad causam não procede. 13A Constituição da República atribuiu ao Ministério Público, no art. 129 III, a função de promover a ação ci-vil pública para proteger o patrimônio público:14”Art. 129. São funções institucionais do Ministério Pú-blico? [...] 15III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, pa-ra a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.16Assim, a legitimidade do autor está amparada nos termos categóricos do art. 129, III, da Constituição da República. 17A jurisprudência é remansosa no apoio desse entendimento.18Vide, p.ex., o REsp nº 78916/SP . No mesmo sentido já decidiu o STF . 19Depois, a Lei de Improbidade (Lei Federal nº 8429, de 1992), que “dispõe sobre as sanções aplicáveis aos a-gentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências”, no capítulo V, que trata “do procedimento administrativo e do processo judicial”, em seu art. 17 reza:20”Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público ou pela pessoa jurídica interessada, dentro de 30 (trinta) dias da efetivação da medida cautelar”.21A legitimidade do autor, pois, decorre dos termos ca-tegóricos e insofismáveis da Constituição da República e da lei citada. 22Rejeito a preliminar.- III. - 23Como é pacífico na jurisprudência, a ação civil pública é cabível em casos como o versado, independentemente de ser cabível, em relação aos mesmos fatos, a ação popular. Nesse sentido:24”O Ministério Público é parte legítima para propor Ação Civil Pública visando resguardar a integridade do patrimônio público [...] atingido por contratos de efeitos financeiros firmados sem licitação. Precedentes. 2. Au-sência, na relação jurídica discutida, dos predicados exi-gidos para dispensa de licitação. 3. Contratos celebrados que feriram princípios norteadores do atuar administrativo? legalidade, moralidade, impessoalidade e proteção ao patrimônio público. [...] 5. Adequação de Ação Civil Pública para resguardar o patrimônio público, sem afastamento da ação popular. Objetivos diferentes” .25Rejeito, portanto, a preliminar de inadequação da via eleita. - IV. - 26Quanto à preliminar de impossibilidade do pedido (f.1471 e f.1507), rejeito-a porque é evidentemente descabida. Pretendem os réus que o pedido seria juridicamente impossível porque certas penas previstas na Lei de Improbidade (Lei Federal nº 8429, de 1992) só seriam aplicáveis em ação popular, e não da ação civil pública.27Essa tese é disparatada, pois ignora o fato de que o nome atribuído à ação é irrelevante. Pensam os réus que o nome da ação escolhido pelo autor torna o pedido juri-dicamente impossível e faz com falte o interesse de agir. Todavia o nome da ação não influi na causa de pedir ou no pedido, tampouco torna este juridicamente impossível. É entendimento jurisprudencial pacífico:28”[...] O nome da ação é irrelevante. [...] Se os funda-mentos e a conclusão pretendida encontram coerência jurídica, não ocorre inépcia da inicial” .29”[...] Em razão da aplicação dos princípios jura novit curia e da mihi factum dabo tibi jus, constitui entendimen-o pacificado de que o nome da ação não é relevante para concretização do direito da parte [...]” .30”A impropriedade do termo jurídico não conduz a carên-cia da ação. Não é o nome da ação que garante o direito, mas sim da narração dos fatos deve se extrair a conclusão lógica do pedido, devendo sempre ser aplicado, em prol das partes e da justiça, o princípio ‘dê-me o fato e dar-te-ei o direito’” .31E, por analogia, demonstrando o acerto das afirmações precedentes:32”[...] Alegação de que a ação é de cobrança e não de indenização. Autores que dão à ação o nome de ‘ação de cobrança’. Pretensão, porém, indenizatória. Nome da ação que não influi na causa de pedir e no pedido. Apelação desprovida neste aspecto. Se a causa de pedir e o pedido demonstram claramente qual é a tutela perseguida pelo autor, o nome ou rótulo diverso que se tenha dado à causa não influem, nem tornam a petição inicial inepta” .33”Preliminar de carência de ação afastada. Irrelevância do nome da ação. Embargos de terceiro. Mérito. Bem mó-vel. Automóvel. Apreensão no juízo criminal. Possuidora de boa-fé. Precedentes. Apelo improvido” .34Ademais, sobre ser a ação civil pública cabível no caso e para os fins aqui discutidos vide o decidido acima, no § 23 et seq..- V. - 35A preliminar de prescrição não convence. Os réus, ao invocá-la, distorcem os fatos narrados na inicial e com-provados na ação penal que investigou o caso. Querem fazer crer que os fatos se passaram no ano de 1995, somente. Mas não é assim. Está claro, pela inicial acusatória do processo penal que tratou do caso, assim como pela prova farta que o instruiu, e bem assim pela inicial deste caderno, que os fatos ilícitos e ímprobos se iniciaram em 1995, e se estenderam por todo aquele ano, e mais o ano de 1996. E as ações ímprobas em debate só cessaram quando, em meados de 1996, os réus foram flagrados, e afastados das funções, após ação fiscalizadora de seus su-periores.36Nesse sentido reconheceu a sentença criminal transita em julgado (f.1197):37”Finalmente, consta da inicial, que o produto arrecado através dos ilícitos citados, era dividido entre os denunciados, porém, os despachantes, acabaram por denunciar o fato junto ao Coordenador de Inspeção de Auditagem do Detran, sendo realizadas investigações administrativas, até que no dia 28.03.96, acabaram sendo autuados em flagrante os réus, Paulo, Odair e Homero, em poder dos quais foram apreendidos chefe se os documentos descritos na denúncia”. 38Ora, pelos testemunhas que adiante se menciona, e pelas firmes conclusões da sentença e do acórdão condenatórios da esfera criminal, tratou-se de delitos continuados - ou seja, para os fins deste processo, de atos de improbidade continuados - que os réus perpetraram até meados de 1996. Logo, como este processo foi ajuizado antes de decorridos cinco anos da data da cessação do continuidade delitiva, não houve prescrição.- VI. - 39Quanto ao mérito, os réus foram todos condenados na esfera criminal, por sentença transitada em julgado. A condenação criminal transita em julgado gera coisa julgada, e certeza plena irrefutável, acerca da materialidade e da autoria do fato.40Ociosa, pois, os tartamudeantes protestos de inocência dos réus, que pretendem, ao negar a autoria e a materialidade daqueles fatos, reabrir a discussão já cerrada com a chave da coisa julgada. Essa pretensão contradiz o texto literal do CPC:41”Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a exis-tência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal”.42É da jurisprudência:43”Conquanto as esferas cível e criminal sejam independentes no tocante à aferição da responsabilidade, a condenação criminal transitada em julgado, a teor do disposto no artigo 935, CC, impede qualquer rediscussão acerca da existência do fato e sua autoria” .44E, por analogia:45”A condenação do demandado, no juízo criminal, pelos fatos que fundamentam o pedido de indenização contra ele formulado, dispensa a discussão da culpa no juízo cível” .46”É sabido que a sentença condenatória em ação criminal, transitada em julgado, torna certo o dever de indenizar na esfera cível, descabendo discussão no cível a respeito da autoria e da existência do fato, bem como da culpabilidade do agente causador do dano, sendo certa a obrigação de reparar” .47Logo, a certeza do trânsito em julgado da condenação criminal, e o texto do art. 935 do CPC, são fundamento suficiente para julgar procedente o pedido inicial neste caderno, e para dispensar o exame dos protestos de inocência dos réus.48Não custa salientar, todavia, que a prova colhida no processo penal, e trazida a estes autos validamente como prova emprestada, sustenta sobejamente a condenação, como se constata destes excertos da sentença condenatória penal (f.1200 et seq.):49”[...] nos termos do a art. 316 do Código Penal, tal delito se caracteriza quando o agente exige para si ou para trem, direita ou indiretamente, ainda que fora da função, mas tem razão dela, vantagem indevida. [...]50No caso em tela, a materialidade está comprovada através dos autos de exibições e apreensões de folhas 42 e 68 e dos documentos de folha 57/59, 61/6, 163/164, 221/229.51E a prática deste delito foi imputada a todos os acusados através da exordial, segundo a qual, os mesmos exigiam recebiam dos despachantes vítimas, vantagens indevidas, instituindo junto à 13ª Ciretran um ‘caixinha’, do qual todos os réus se beneficiavam, consistente na cobrança de R$5,00 por um processo que desse entrada no Ciretran, bem como, cobrança, além da taxa legal de R$9,80, de mais R$50,00 em média, para a expedição do documento RDPO, e ainda, a cobrança indevida de R$10,00 reais para entrega de cada licenciamento referente ao ano de 1995. [...]52Nestes Juízo, ao ser interrogados, os réus Paulo e Álvaro, admitiram a existência do ‘caixinha’ na 13ª Ciretran.53 Assim é que o réu Paulo as folhas 294/297, disse ter recebido de Álvaro uma lista com os nomes dos despachantes que haviam concordado com a cobrança do R$5,00, para que seus documentos fossem expedidos no dia, sendo que para proceder ao controle dos recebi-mentos, designou um réu Odair, que era quem atendia os despachantes, o qual não concordou, em virtude do que foi afastado, tendo sido designado o réu Homero para tal atividade. Entretanto, cerca de 30 dias após, Odair acabou concordando em participar da atividade, passan-do a desempenhá-la em companhia do réu Homero, e que estes, apesar de não receberem nenhum pagamento extra, em algumas vezes cedeu aos mesmos, pequenas quantias, todavia, jamais cobrando o dinheiro emprestado. [...]54Afirmou, ainda, Paulo, que eram arrecadados, em média, R$1.500,00, semanalmente, sendo metade entre-gue para o réu Álvaro e o restante ficava na 13ª CIRETRAN para reformas, limpezas, churrascos e para ajudar os funcionários. No que concerne á expedição do documento RDPO, disse que as taxas normais giravam em torno de R$50,00, porém, na maioria das vezes, as pessoas deixavam cheques de R$100,00 a R$120,00 e nunca exigiam troco.55 Finalmente, em juízo, o real Paulo admitiu que o documento de folha 61 era o controle das cobranças que faziam dos despachantes.56 Já o réu Álvaro, as folhas 309/312, admitiu a existência do ‘caixinha’, sendo que na primeira semana, o pagamento foi feito diretamente ao acusado, perfazendo um total em torno de R$1.200,00, entretanto, não quis permanecer com esta incumbência. Disse que o valor máximo arrecadado, numa semana, atingiu R$3.000,00, aduzindo que a iniciativa da instituição do ‘caixinha’, partiu dos próprios despachantes, através do senhor Roberto Ramos do Prado, Presidente do Sindicato dos Despachantes, tendo aceito, porque é de seu conhecimento, que na maioria das Ciretrans do Estado, existe o ‘caixinha’ onde despachantes contribuem para que os documentos sejam expedidos de forma mais rápida. [..]57De acordo com as provas constantes dos autos, verifica-se que o co-réu, Odair Henrique, que era quem contro-lava o recebimento das importâncias indevidas, afirmou as folhas 315/317, que logo após o real Paulo ter assumido a chefia da 13ª Ciretran, lhe procurou dizendo que visando a instituir o ‘caixinha’, deveria cobrar R$5,00 de cada processo que desse entrada daquela repartição, sendo que desta forma, semanalmente, entregava pessoalmente metade do montante arrecado ao réu Paulo e a outra metade ao réu Álvaro.58 A vítima Roberto Ramos do Prado, as folhas 378/383, disse que após o réu Paulo e Álvaro terem assumido seus cargos, foi procurado por este último, o qual ele disse que os despachantes pagasse importância de R$5,00 por processo que desse entrada na Ciretran o respectivo documento saía no mesmo dia, argumentando que seu salário era pouco e que os despachantes deveriam colaborar. Diz que os despachantes que não pagava importância exigida, tinha de aguardar de dez a quinze dias para obtê-los, em virtude do que os despachantes se viram obrigados em pagar a importância mencionada. Afirmou ainda, que apesar de ter sido réu ao foro que fez a exigência dos R$5,00, era o réu Paulo que fazia a retenção dos do-cumentos. Que Paulo se chegou a afirmar se vocês não me pagarem eu vou segurar os processos e os nomes de vocês como os despachantes vão ficar ruim.59 E sobre a retenção indevida de documentos junto a 13ª Ciretran, a mesma conformada pelo documento de folhas 991, onde, o inspetor Pedro Vieira de Paula já aler-tava sobre as irregularidades que estavam sendo pratica-das na 13ª se o Ciretran e no 8° centro regional de trân-sito, pois fez conseguir dar aquele documento, que quando o de sua visita ao citado só alguns, ao saber de sua presença na Ciretran nos dias 23 e 24.07.95 para não levantar suspeitas, o chefe entregou na sexta-feira, dia 22, mais de 300 processos de Crvs que estavam retidos em seu poder, para os despachantes. [...]60Assim é que a própria testemunha arrolado pela defesa do réu ao foro, Michel Louis dias são.1000 (folha 553 e verso) confirmou a prática do crime de com a fusão ao afirmar, que certo dia, ao se dirigir a Ciretran, foi informado pelo réu Odair, que haviam uma determinação por parte do real Paulo, no sentido de que fosse cobrada uma taxa extra, estipulado em R$5,00 e casas do não fosse paga o processo teria engavetado, com demora para liberar o documento que a princípio não concordou, mas acabou cedendo obrigada a pagar a exigência extra Philco após o que teve normalizar a entrega dos documentos. Afirmou ainda que por duas vezes esteve na casa do réu ao foro, em companhia do presidente do sindicato, Roberto Ramos do Prado, para solicitar providências contra Paulo franco teve aquele prometido afastar este, o que não ocorreu. 61Helder Nixon Silva, às fls. 412 e v°, disse que foi comunicado pelo réu Odair que se não pagasse R$ 5,00 por processo, a entrega dos documentos seria retardada.62Anselmo Gomes Moraes às fls. 414, disse que através de seu preposto ficou sabendo que se não pagasse R$ 5,00 por processo que desse entrada na Ciretran, a entrega dos documentos seria retardada, e assim, para não prejudicar seus clientes, acabou concordando com o pagamento.63Maria do Carmo Ziober Batista de Oliveira, às fls. 395/6, disse que o réu Odair, responsável pelo protoco-lo e entrega de documentos, lhe disse que se não pagasse R$ 5,00 por processo, as expedições dos documentos iriam demorar e como é viúva e tem uma filha menor, precisando manter sua clientela, acabou concordando em pagar a citada importância.64Nelson do Nascimento, ás fls. 398v°, afirmou que chegou a ter prejuízo por não ter aderido ao esquema, já que teve cliente seu que procurou outro despachante, alegando que este conseguia o documento mais rápido.65Ofélia Montanher de Oliveira, às fls. 400, disse que o réu Odair afirmou que se não pagasse os R$ 5,00 a entrega do documento seria retardada.66Evaristo Mollé Pelegrino, às fls. 404 e verso, disse que era mal atendido na Ciretran, ‘tomando chá de banco’, pelo fato de não estar tendo condições de pagar os R$ 5,00 por processo, sendo que seus processos eram de-volvidos pela Ciretran, alguns sem motivo aparente de indeferimento, chegando a ir falar pessoalmente com o réu Paulo Roberto a respeito do que estava ocorrendo, inclusive levando um cartão de um amigo, porém, Pau-lo, após ler o cartão, rasgou-o e jogou-o no lixo na frente do depoente. Disse, ainda, que por não ter podido pagar as importâncias exigidas, perdeu a maioria de sua clientela tendo em vista a demora na emissão dos documentos requeridos.67Jair Ferreira Murta, às fls. 409/10, disse que os despachantes acabaram aceitando pagar os R$ 5,00 pois não havia outro jeito, e que se os pagamentos não fossem feitos na sexta-feira, conforme era entregue, sendo que numa ocasião não procedeu ao pagamento na sexta-feira, e quando sua filha compareceu na Ciretran, na segunda-feira, não conseguiu pegar o documento, o que só foi possível após retornar ao escritório, pegar dinheiro e pagar a importância exigida,68Anselmo Gomes Moraes, às fls. 414/16, disse que o réu Paulo chegou a dizer nas reuniões na Ciretran, que tinha respaldo político para acabar com os despachantes, caso não pagassem as importâncias exigidas, sendo que em hipótese alguma houve concordância destes em pagarem os R$ 5,00, pois esta foi exigência da Ciretran, só tendo pago para não serem prejudicados. [...]69Além dos depoimentos das vítimas deve ser citado o depoimento da testemunha, José Lúcio Mello da Silva, que às fls. 538 afirmou ter destacado dois policiais, para que na Ciretran, ficassem junto ao Público, os quais observam que as propinas eram pagas abertamente, tendo feito um relatório sobre esses fatos, de posse do qual e do depoimento do sr. Roberto, solicitou ao juiz a busca e apreensão da lista e do dinheiro ou cheques correspondentes. [...]70E, os dois policiais citados por José Lúcio, são as testemunhas, Jorge Luiz Peixoto de Mattos e José Carlos Machado, os quais às fls. 539 e 539v°, disseram que ficaram de campana na Ciretran, junto ao Público, quando ficaram observando o réu Paulo, já que este trabalhava numa sala onde existia um vidro grande para o salão pú-blico, o qual recebia diversas pessoas que lhe dava dinheiro, o qual era guardado numa gaveta de sua escrivania, bem como, que na referida sala sempre vinham os réus Odair e Homero, normalmente trazendo outras pessoas para que essas dessem dinheiro ao réu Paulo. [...]71Todavia, da análise do conjunto probatório, conforme ficou acima consignado, extrai-se a certeza de que os mencionados réus exigiram através de interpostos pessoas, os réus Odair e Homero, a vantagem indevida, estando tipificado o delito de concussão que lhes foi imputado.72Alem da exigência ilegal dos R$ 5,00, por processo, também de forma indevida, os réus, para robustecer o ‘caixinha’, exigiam dos despachantes e particulares, o pagamento imediato de R$ 50,00 além da taxa legal de R$ 9,80, para a expedição do documento RDPO (Recibo de Documento e Porte Obrigatório).73Tal cobrança ilegal foi confirmada pelas vítimas Roberto Ramos do Prado (fls.379v°), Maria do Carmo Ziober Batista de Oliveira (f.395), Ofélia Montanher de Olivei-ra (f.400), Jair Ferreira Murta (f.409v°), Elizete de Fátima Botan (f. 423v°), Sete Pedroso de Almeida (f.433), José Antonio de Barros (f. 515) e pela testemunha de defesa. Michel Luiz Dias Antonio (f. 553).74No mesmo sentido são os depoimentos das vítimas Anselmo Gomes Moraes (f. 414v°), Rubens Carlos Rejani (f. 417) Valdemir Leyzer (f. 419), Arcília Cristina Defende (f. 422, verso), Telma Marques (f. 426), César Luiz Nunes (f. 428,v°), João Antonio Carneiro (f. 429), Jones Suedi Silva Basílio (f. 431), José Pires Bibiano (f. 432), Ary Garcia (f. 510,v°), Moacyr José de Oliveira (f. 512), Osmar Correa de Souza (f. 513), Osvaldo Luiz Wolf (f.514), José Carlos Rodrigues da Silva (f. 522) e Gilmar Montelo (f. 523). [...]75Contudo, em Juízo, o réu Odair (f. 315/317) disse ter sido informado pelo réu Paulo, que ‘eles’ teriam feito um acerto e que seriam cobrados R$ 5,00 por cada processo que desse entrada, dizendo que deveria ficar responsável pelo recebimento semanal. Que a arrecadação chegou a atingir R$ 3.000,00 numa semana, os quais eram entregues, pessoalmente, pelo interrogado aos réus Paulo e Álvaro, na proporção de 50% para cada um. Confirmou que os cheques apreendidos se referiam aos pagamentos feitos pelos despachantes. Disse, ainda, que após a instituição do ‘caixinha’, emprestou dinheiro de Paulo e ao tentar pagar este não aceitou.76O réu Homero ratificou o que disse Odair, acrescentando que também pegou dinheiro emprestado com Paulo, e quando foi devolver, este não quis receber. [...]77Foram diversas as vítimas que confirmaram tal procedimento, a começar por, Maria do Carmo Ziober Batista de Oliveira, f. 395, onde disse que tinha conhecimento que os licenciamentos de 1995, após terem sido devolvidos pelo Banco, foram colocados na sala de Paulo, os quais quando procurados eram entregues pelo réu Ismael mediante pagamento de R$ 10,00 por documento.78Ofélia Montanher de Oliveira, f.400v°, disse que pegou várias documentos com o réu Ismael pagando os R$ 10,00.79Nelson Justus, f. 406 e verso, disse que ‘... com relação aos licenciamentos de 1995 realmente após terem sido devolvidos pelo banco tais documentos ficaram na sala do réu Paulo os quais só eram entregues pelo réu ?Ismael mediante pagamento de R$10,00 por documento... que confirma que o réu Ismael dizia com relação ao licenciamento de 95 ‘se quiser os documentos tem que pagar R$ 10,00...’80Sete Pedroso de Almeida e Marcelo Veloso da Silva, disseram que com relação ao licenciamento de 1995, realmente eram cobrados R$ 10,00 por documento do réu Ismael.81A testemunha de defesa, Michel Luiz Dias Antonio, a f.563 disse que o réu Ismael, que era auxiliar do réu Paulo, mas não era funcionário da Ciretran, era encarregado de cobrar dez para entrega dos licenciamentos de veículos referentes ao ano de 1995.82No mesmo sentido são os depoimentos das vítimas Evaristo Mollé Pelegrino, Ernesto Teixeira de Faria Neto, Jair Ferreira Murta, Elizete de Fátima Botan, Telma Marques, Maria de Lourdes Neves, César Luiz Nunes, João Antonio Carneiro, Jair Avelino da Silva, Jones Suedi Silva Basílio, José Pires Bibiano, Ary, Garcia, Osvaldo Luiz Wolf, Ademar Oliveira Bueno, Mikihiko Kamei, José Carlos Rodrigues da Silva e Gilmar Montelo [...]”. 83Resta, pois, apreciar a conseqüências civis dos fatos definitivamente provados, à luz da Lei de Improbidade (Lei Federal nº 8429, de 1992).- VII. - 84A simples leitura da descrição dos fatos provados dei-xa claro que se enquadram na figura do art. 9º I da Lei de Improbidade (Lei Federal nº 8429, de 1992):85”Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1º desta Lei, e notada-mente?86I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, di-reta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente públi-co”.87Logo, estão os réus incursos nas penas do art. 12 I da Lei de Improbidade (Lei Federal nº 8429, de 1992). Dis-põe esse artigo:88”Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações?89I - na hipótese do art. 9º, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de 8 (oito) a 10 (dez) anos, pagamento de multa civil de até 3 (três) vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 10 (dez) anos”.90Mas o p.ún. do dispositivo, contudo, deixa claro que as penas não são necessariamente cumulativas, cabendo dosá-las de acordo com as circunstâncias do caso 91”Art. 12 p.ún.? Na fixação das penas previstas nesta Lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente”.92O entendimento aqui adotado já foi reiteradamente consagrado pelo STJ:93”Lei de improbidade administrativa. Princípio da pro-porcionalidade. Discricionariedade do julgador na aplicação das penalidades. [...] As sanções do art. 12, da Lei nº 8.429/92 não são necessariamente cumulativas, cabendo ao magistrado a sua dosimetria; aliás, como deixa claro o parágrafo único do mesmo dispositivo” .94”A aplicação das sanções da Lei nº 8.429/92 deve ocor-rer à luz do princípio da proporcionalidade, de modo a evitar sanções desarrazoadas em relação ao ato ilícito praticado, sem, contudo, privilegiar a impunidade. Para decidir pela cominação isolada ou conjunta das penas previstas no artigo 12 e incisos, da Lei de Improbidade Administrativa, deve o magistrado atentar para as cir-cunstâncias peculiares do caso concreto, avaliando a gra-vidade da conduta, a medida da lesão ao erário, o histórico funcional do agente público, etc.” .95Dosando, assim, as sanções aplicáveis, constata-se que nenhum dos réus enriqueceu significativamente por conta das improbidades cometidas, e que as vantagens que aufe-riram ilicitamente não eram de valores expressivos. Isso desrecomenda a aplicação da sanção mais severa entre as cominadas, que é a da perda da função pública. Ademais, alguns deles não exerciam, e nenhum deles exerce atual-mente, função pública.- VIII. - 96Isso posto, julgo procedente o pedido inicial, e con-deno todos e cada um dos réus antes nominados à sanção consistente em: a) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, conforme se apurar em liquidação de sentença; b) suspensão dos direitos políticos de por oito anos; c) pagamento de multa civil de dez mil reais (para cada um dos réus); d) proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.97Condeno ainda os réus ao pagamento das custas e de-pesas processuais, e honorários advocatícios que arbitro em 10% do valor da condenação, considerando a abreviação do trabalho pelo julgamento antecipado. Os honorários advocatícios são devidos na forma da Lei Estadual n. 12241, de 1998, e Constituição do Estado do Paraná, art. 118 II.98Em relação às custas e aos honorários, as condenações são solidárias, de modo que a execução pode ser dirigida contra ambos ou qualquer um dos condenados, mas o pagamento feito por um aproveitará ao outro. No tocante às multas civis cada condenado é isoladamente responsável pelo pagamento da sanção a ele imposta.99P., r. e i.. Maringá, 25 de fevereiro de 2009.ALBERTO MARQUES DOS SANTOSJUIZ DE DIREITO