Acórdão - José Roberto Ruiz
Acórdão
DENÚNCIA CRIME Nº437860-1, DA COMARCA DE MARINGÁ
DENUNCIANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
DENUNCIADO : JOSÉ ROBERTO RUIZ
RELATOR : JUIZ CONV. JOSÉ LAURINDO DE SOUZA NETTO
DENÚNCIA CRIME - PREFEITO MUNICIPAL - CRIME DE RESPONSABILIDADE (ART. 1º, IV, DO DECRETO-LEI N.º 201/67) - DESCRIÇÃO DO FATO QUE CONSTITUI CRIME EM TESE - PEÇA FORMALMENTE PERFEITA - RECEBIMENTO DA DENÚNCIA.
“Descrevendo a denúncia fato típico, contendo a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias e a classificação do crime, assim dando notícia da ocorrência de crime pelo menos em tese, deve ser recebida (CPP, art. 41)” (STF - Inq. 1622 - DJU 28.05.04. p. 07).
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Denúncia Crime n.º 437860-1 de Maringa, em que figuram como denunciante Ministério Público do Estado do Paraná e denunciado José Roberto Ruiz.
1. Trata-se de Denúncia Crime, oferecida pelo Ministério Público contra José Roberto Ruiz, atual Prefeito do Município de Floresta, gestão 2005/2008, da acusação de ter praticado crime de responsabilidade como prefeito municipal, por infração ao artigo 1º inciso IV do Decreto-Lei nº 201/67 (empregar subvenções, auxílios, empréstimos ou recursos de qualquer natureza, em desacordo com os planos ou programas a que se destinam).
A denúncia tem o seguinte teor:
“Durante o mês junho de 2004, o denunciado José Roberto Ruiz no exercício do cargo de Prefeito Municipal de Floresta, elaborou um plano visando aumentar o seu prestígio perante a população de Floresta, já que naquele ano haveriam eleições municipais e o mesmo era candidato à reeleição ao cargo de Prefeito Municipal de Floresta. Para tanto o denunciado José Roberto Ruiz dolosamente determinou a funcionários do departamento de obras daquele município, o desvio e emprego irregular de duas cargas de materiais de asfalto, que seriam utilizadas para recuperar o trecho de rodovia PR - 546 que liga Floresta à Itambé e foram desviadas para obras dentro de avenidas do Município de Floresta, totalizando 14 m3 de PMF (Pré Misturado a Frio) e 2800 Lts. Emulsão R1-1C, conforme abaixo demonstrado.
Solicitação de Serviço/material (SSM, com timbre do DER-Departamento de Estradas de Rodagem constando os materiais que foram desviados (fls. 14 e 15 e 49 a 51).
(...)
Tais matérias tinhas uma destinação pré-estabelecidas pelo Departamento de Estradas e Rodagem- DER, face a existência de uma programação de Conservação Rodoviária, referente ao período de 21 a 25/06/04 (fls. 64), que regulamenta e especifica a aplicação de recursos orçamentários do Departamento de Estradas e Rodagem - Superintendência Regional Noroeste, cujo objeto era a reperfilação e tapa-buracos do trecho da rodovia estadual PR 546. Conforme correspondência de 11/08/04 (fl. 59), oriunda dos engenheiros do DER, José Cavalcante de Moura e José Ferreira Heidgger, foi constatada a ocorrência de desvio, salientando-se que no último parágrafo destacam-se que a Prefeitura Municipal de Floresta fizera a devolução ao DER de apenas 6m3 de PMF - denso (total era 20m3), tendo o DER solicitado (fl. 94 e 95) a Prefeitura reembolso relativo à perda parcial de material, destinado ao ressarcimento ao erário daquela autarquia estadual no valor correspondente à quantidade de material desviado”
A denúncia foi devidamente instruída com documentos.
Notificado às fls. 299 e 304 (em 10/12/2007), o denunciado José Roberto Ruiz apresentou resposta intempestiva (07/01/2008) aduzindo em síntese que foi celebrado convenio entre os municípios interessados na manutenção da rodovia e o DER-Paraná, sendo que competiria ao município fornecer o transporte, mão de obra bruta e aplicação do material; ao DER competiria a parte técnica da obra. Asseverou que do material, cerca de 20 m3, 50% foi utilizado na Rodovia PR 317, 6m3 no município de Malu e, a parte que resultou inservível (4m3) foi adquirida pelo Município de Floresta e o respectivo valor recolhido aos cofres públicos. Argumentou que o município nunca fez transporte de emulsão, mas somente pedra embebida em piche.
A Procuradoria Geral de Justiça apresentou parecer às fls. 360/371 manifestando-se pelo recebimento da denuncia diante do preenchimento requisitos legais, afirmando que o material só foi devolvido e reembolsado após a notificação pelo DER e que havia emulsão asfáltica.
É O RELATÓRIO.
2. Os autos trazem para apreciação desta câmara Denúncia Crime oferecida pelo Ministério Público do Estado do Paraná contra José Roberto Ruiz Prefeito do Município de Floresta, gestão 2005/2008, pela prática, em tese, do crime previsto no inciso IV, do artigo 1º, do Decreto-Lei 201/67 (empregar subvenções, auxílios, empréstimos ou recursos de qualquer natureza, em desacordo com os planos ou programas a que se destinam).
A denúncia deve ser recebida.
Conforme o artigo 43 do Código de Processo Penal, que a denúncia somente será rejeitada quando: I - o fato narrado evidentemente não constituir crime; II - já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa; III - for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.
Analisando os autos, extrai-se da descrição e da conduta do denunciado que os fatos articulados na exordial acusatória em tese configuram o crime, demonstrando-se a aparente tipicidade, a punibilidade concreta, justa causa e legitimidade de parte, o que autoriza o recebimento da denúncia.
Qualquer análise de mérito deverá ocorrer na fase de instrução, momento no qual efetivamente é possibilitado às partes a produção de provas e também é assegurado o contraditório e a ampla defesa, objetivando a busca da verdade real.
É entendimento desse Egrégio Tribunal de Justiça:
“DENÚNCIA CRIME - CRIME DE DESOBEDIÊNCIA - ART. 1º, XIV, DO DL 201/67 - ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DOLO - MATÉRIA QUE DEVE SER ANALISADA DE FORMA EXAURIENTE NA AÇÃO PENAL - EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS SÓLIDOS QUANTO AO COMETIMENTO DO FATO DESCRITO NA DENÚNCIA - DESNECESSIDADE DE OITIVA DA TESTEMUNHA INDICADA PELA DEFESA NESTA FASE PROCESSUAL. DENÚNCIA RECEBIDA - POR UNANIMIDADE” (TJ/PR, Ação Penal 165195-4, Órgão Especial, rel. Fernando Vidal, ac. 7153, p. DJ 6937 de 19/08/2005).
Neste sentido, a orientação do Superior Tribunal de Justiça:
“As decisões judiciais devem ser fundamentadas (CF/88, art. 93, IX). Impõe interpretação lógico-sistemática. Quanto ao recebimento da denúncia, urge considerar: de um lado, a decisão não tem carga decisória. De outro lado, o magistrado não pode antecipar seu entendimento quanto ao mérito. Por isso, a fundamentação reduzir-se-ia a enfatizar que o fato é típico, antijurídico, culpável, em tese. Não rejeitado implicitamente, qualifica o fato” (RHC nº 4801/GO, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, 6ª Turma, j. 26.9.95, v.u., negado provimento ao recurso, DJU 18.12.95, pág. 44.624).
Registre-se, ainda, em observância ao artigo 2º, inciso II, do Decreto-lei nº 201/67, a desnecessidade de afastamento do Chefe do Poder Executivo Municipal do cargo, pois nada está a indicar que, em razão de seu cargo, obstaculizará a instrução criminal.
Nesse sentido, cumpre ressaltar que o afastamento de Prefeito do cargo a que foi eleito pela soberania da vontade popular é medida drástica, que somente deve ser tomada diante de fatos de grande robustez probatória e evidente necessidade de acautelamento e preservação da prova a ser colhida e do próprio erário público municipal. Assim, o afastamento deve ser tido como medida de exceção que só pode ser adotada quando presente, além do fumus boni iuris, o periculum in mora, este representado por comprovado embaraço que o denunciado esteja causando à produção de provas e à instrução do processo, o que não se verifica no presente caso.
Por estas razões, voto no sentido de receber a denúncia, no que tange ao delito do artigo 1º, inciso IV do Decreto-Lei nº 201/67, sem afastar o Prefeito, por ora, de suas funções.
ANTE O EXPOSTO,
ACORDAM os integrantes da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em receber a Denúncia Crime.
Acompanharam o voto do eminente Juiz Relator Convocado, o Exmo. Des. Noeval de Quadros, Presidente, e a eminente Juíza Convocada Lilian Romero.
Curitiba, 27 de março de 2008.
Juiz JOSÉ LAURINDO DE SOUZA NETTO
Relator Convocado
DENÚNCIA CRIME Nº437860-1, DA COMARCA DE MARINGÁ
DENUNCIANTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
DENUNCIADO : JOSÉ ROBERTO RUIZ
RELATOR : JUIZ CONV. JOSÉ LAURINDO DE SOUZA NETTO
DENÚNCIA CRIME - PREFEITO MUNICIPAL - CRIME DE RESPONSABILIDADE (ART. 1º, IV, DO DECRETO-LEI N.º 201/67) - DESCRIÇÃO DO FATO QUE CONSTITUI CRIME EM TESE - PEÇA FORMALMENTE PERFEITA - RECEBIMENTO DA DENÚNCIA.
“Descrevendo a denúncia fato típico, contendo a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias e a classificação do crime, assim dando notícia da ocorrência de crime pelo menos em tese, deve ser recebida (CPP, art. 41)” (STF - Inq. 1622 - DJU 28.05.04. p. 07).
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Denúncia Crime n.º 437860-1 de Maringa, em que figuram como denunciante Ministério Público do Estado do Paraná e denunciado José Roberto Ruiz.
1. Trata-se de Denúncia Crime, oferecida pelo Ministério Público contra José Roberto Ruiz, atual Prefeito do Município de Floresta, gestão 2005/2008, da acusação de ter praticado crime de responsabilidade como prefeito municipal, por infração ao artigo 1º inciso IV do Decreto-Lei nº 201/67 (empregar subvenções, auxílios, empréstimos ou recursos de qualquer natureza, em desacordo com os planos ou programas a que se destinam).
A denúncia tem o seguinte teor:
“Durante o mês junho de 2004, o denunciado José Roberto Ruiz no exercício do cargo de Prefeito Municipal de Floresta, elaborou um plano visando aumentar o seu prestígio perante a população de Floresta, já que naquele ano haveriam eleições municipais e o mesmo era candidato à reeleição ao cargo de Prefeito Municipal de Floresta. Para tanto o denunciado José Roberto Ruiz dolosamente determinou a funcionários do departamento de obras daquele município, o desvio e emprego irregular de duas cargas de materiais de asfalto, que seriam utilizadas para recuperar o trecho de rodovia PR - 546 que liga Floresta à Itambé e foram desviadas para obras dentro de avenidas do Município de Floresta, totalizando 14 m3 de PMF (Pré Misturado a Frio) e 2800 Lts. Emulsão R1-1C, conforme abaixo demonstrado.
Solicitação de Serviço/material (SSM, com timbre do DER-Departamento de Estradas de Rodagem constando os materiais que foram desviados (fls. 14 e 15 e 49 a 51).
(...)
Tais matérias tinhas uma destinação pré-estabelecidas pelo Departamento de Estradas e Rodagem- DER, face a existência de uma programação de Conservação Rodoviária, referente ao período de 21 a 25/06/04 (fls. 64), que regulamenta e especifica a aplicação de recursos orçamentários do Departamento de Estradas e Rodagem - Superintendência Regional Noroeste, cujo objeto era a reperfilação e tapa-buracos do trecho da rodovia estadual PR 546. Conforme correspondência de 11/08/04 (fl. 59), oriunda dos engenheiros do DER, José Cavalcante de Moura e José Ferreira Heidgger, foi constatada a ocorrência de desvio, salientando-se que no último parágrafo destacam-se que a Prefeitura Municipal de Floresta fizera a devolução ao DER de apenas 6m3 de PMF - denso (total era 20m3), tendo o DER solicitado (fl. 94 e 95) a Prefeitura reembolso relativo à perda parcial de material, destinado ao ressarcimento ao erário daquela autarquia estadual no valor correspondente à quantidade de material desviado”
A denúncia foi devidamente instruída com documentos.
Notificado às fls. 299 e 304 (em 10/12/2007), o denunciado José Roberto Ruiz apresentou resposta intempestiva (07/01/2008) aduzindo em síntese que foi celebrado convenio entre os municípios interessados na manutenção da rodovia e o DER-Paraná, sendo que competiria ao município fornecer o transporte, mão de obra bruta e aplicação do material; ao DER competiria a parte técnica da obra. Asseverou que do material, cerca de 20 m3, 50% foi utilizado na Rodovia PR 317, 6m3 no município de Malu e, a parte que resultou inservível (4m3) foi adquirida pelo Município de Floresta e o respectivo valor recolhido aos cofres públicos. Argumentou que o município nunca fez transporte de emulsão, mas somente pedra embebida em piche.
A Procuradoria Geral de Justiça apresentou parecer às fls. 360/371 manifestando-se pelo recebimento da denuncia diante do preenchimento requisitos legais, afirmando que o material só foi devolvido e reembolsado após a notificação pelo DER e que havia emulsão asfáltica.
É O RELATÓRIO.
2. Os autos trazem para apreciação desta câmara Denúncia Crime oferecida pelo Ministério Público do Estado do Paraná contra José Roberto Ruiz Prefeito do Município de Floresta, gestão 2005/2008, pela prática, em tese, do crime previsto no inciso IV, do artigo 1º, do Decreto-Lei 201/67 (empregar subvenções, auxílios, empréstimos ou recursos de qualquer natureza, em desacordo com os planos ou programas a que se destinam).
A denúncia deve ser recebida.
Conforme o artigo 43 do Código de Processo Penal, que a denúncia somente será rejeitada quando: I - o fato narrado evidentemente não constituir crime; II - já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa; III - for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.
Analisando os autos, extrai-se da descrição e da conduta do denunciado que os fatos articulados na exordial acusatória em tese configuram o crime, demonstrando-se a aparente tipicidade, a punibilidade concreta, justa causa e legitimidade de parte, o que autoriza o recebimento da denúncia.
Qualquer análise de mérito deverá ocorrer na fase de instrução, momento no qual efetivamente é possibilitado às partes a produção de provas e também é assegurado o contraditório e a ampla defesa, objetivando a busca da verdade real.
É entendimento desse Egrégio Tribunal de Justiça:
“DENÚNCIA CRIME - CRIME DE DESOBEDIÊNCIA - ART. 1º, XIV, DO DL 201/67 - ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DOLO - MATÉRIA QUE DEVE SER ANALISADA DE FORMA EXAURIENTE NA AÇÃO PENAL - EXISTÊNCIA DE INDÍCIOS SÓLIDOS QUANTO AO COMETIMENTO DO FATO DESCRITO NA DENÚNCIA - DESNECESSIDADE DE OITIVA DA TESTEMUNHA INDICADA PELA DEFESA NESTA FASE PROCESSUAL. DENÚNCIA RECEBIDA - POR UNANIMIDADE” (TJ/PR, Ação Penal 165195-4, Órgão Especial, rel. Fernando Vidal, ac. 7153, p. DJ 6937 de 19/08/2005).
Neste sentido, a orientação do Superior Tribunal de Justiça:
“As decisões judiciais devem ser fundamentadas (CF/88, art. 93, IX). Impõe interpretação lógico-sistemática. Quanto ao recebimento da denúncia, urge considerar: de um lado, a decisão não tem carga decisória. De outro lado, o magistrado não pode antecipar seu entendimento quanto ao mérito. Por isso, a fundamentação reduzir-se-ia a enfatizar que o fato é típico, antijurídico, culpável, em tese. Não rejeitado implicitamente, qualifica o fato” (RHC nº 4801/GO, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, 6ª Turma, j. 26.9.95, v.u., negado provimento ao recurso, DJU 18.12.95, pág. 44.624).
Registre-se, ainda, em observância ao artigo 2º, inciso II, do Decreto-lei nº 201/67, a desnecessidade de afastamento do Chefe do Poder Executivo Municipal do cargo, pois nada está a indicar que, em razão de seu cargo, obstaculizará a instrução criminal.
Nesse sentido, cumpre ressaltar que o afastamento de Prefeito do cargo a que foi eleito pela soberania da vontade popular é medida drástica, que somente deve ser tomada diante de fatos de grande robustez probatória e evidente necessidade de acautelamento e preservação da prova a ser colhida e do próprio erário público municipal. Assim, o afastamento deve ser tido como medida de exceção que só pode ser adotada quando presente, além do fumus boni iuris, o periculum in mora, este representado por comprovado embaraço que o denunciado esteja causando à produção de provas e à instrução do processo, o que não se verifica no presente caso.
Por estas razões, voto no sentido de receber a denúncia, no que tange ao delito do artigo 1º, inciso IV do Decreto-Lei nº 201/67, sem afastar o Prefeito, por ora, de suas funções.
ANTE O EXPOSTO,
ACORDAM os integrantes da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em receber a Denúncia Crime.
Acompanharam o voto do eminente Juiz Relator Convocado, o Exmo. Des. Noeval de Quadros, Presidente, e a eminente Juíza Convocada Lilian Romero.
Curitiba, 27 de março de 2008.
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