30.5.09

Caso CMNP - acórdão/embargos infringentes

EMBARGOS INFRINGENTES CRIME N.º 381556-1/02 E 381556-1/03
COMARCA DE MARINGÁ - 1ª VARA CÍVEL
EMBARGANTE 1: AQUEDEMIR PASTRELO E OUTRO
EMBARGANTE 2: JOÃO ALVES CORREA E OUTRO
EMBARGADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
RELATOR: MACEDO PACHECO


EMBARGOS INFRINGENTES. CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA. INEXISTÊNCIA DE PROVAS CAPAZES DE SUSTENTAR UMA CONDENAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

A prova para fundamentar o decreto condenatório deve ser segura e consistente, apto a fundar a conclusão com absoluta certeza. Na falta destas provas a absolvição se impõe, por força do princípio constitucional do in dubio pro reo.


VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Embargos Infringentes Crime nº 381556-1/01 e nº 381556-1/02 da 1ª Vara Criminal da Comarca de Maringá, em que são embargantes Aquedemir Pastrelo e Outros, sendo embargado o Ministério Público do Estado do Paraná.


O Ministério Público do Estado do Paraná denunciou DIVANIR MORENO TOZATI, JOÃO ALVES CORREA, JOSEMAR APARECIDO DE LIMA como incursos nas disposições do art. 317, §1º, do CP combinado com art. 29, caput, do CP e os acusados AQUEDEMIR PASTRELO E JOSÉ LUIZ JARDIM como incursos nas penas do artigo 333, parágrafo único c/c o artigo 29, caput, ambos do CP pelo fato narrado as fls. 03/06.

Por decisão proferida em 30 de junho de 2006, o MM. Juiz de Direito, Dr. Claudio Camargo dos Santos julgou improcedente a denúncia deduzida na inicial para o fim de absolver os denunciados dos delitos que lhes foram imputados por entender que inexistia provas nos autos. (708/715).

Irresignado, o Ministério Público interpôs Apelação Crime (f. 717), a qual foi recebido às fls. 719.

Remetidos os autos a esta Corte, deu-se vista à Procuradoria-Geral de Justiça, a qual, por intermédio de parecer da lavra do Procurador de Justiça, Dr. Edison do Rêgo Monteiro Rocha, opinou pelo provimento do recurso ministerial (f. 824/834).

A Segunda Câmara Criminal deste Tribunal, por maioria de votos, decretou a nulidade do recurso a partir do recebimento da denúncia exclusive. O Desembargador João Kopytowski fez sua declaração de voto vencido às fls. 921/932.

Foram opostos embargos de declaração com efeitos infringentes pelo Ministério Público, os quais foram acolhidos reconhecendo a contradição existente na decisão e no mérito, por maioria, o apelo foi julgado parcialmente procedente para condenar os embargados Divanir Moreno Tozato, João Alves Correa e Josemar Aparecido de Lima, como incursos no art. 317, caput, c/c 29 e os réus Aquedemir Pastrelo e José Luiz Jardim como incursos no art. 333, caput, c/c 29, todos do CP. O Desembargador Lídio José Rotoli de Macedo fez sua declaração de voto vencido às fls. 982/988.

Diante de tal decisão, Aquedemir Pastrelo, José Luiz Jardim (fls. 991/1000), João Alves Correa, Divanir Moreno Tozati e Josemar Aparecido de Lima interpuseram os Embargos Infringentes (fls. 1002/1030) contra o Acórdão nº 22229, da 2ª Câmara Criminal (fls. 970/988), alegando, em síntese, que deve prevalecer o voto vencido por entender que inexistem provas da materialidade delitiva.

O MM. Juiz de Direito Substituto em 2° grau, Dr. José Laurindo de Souza Netto recebeu os embargos infringentes às fls. 1033.

Com vista dos autos, a Procuradoria-Geral de Justiça, por intermédio de parecer lavrado pelo Procurador de Justiça, Dr. Milton Riquelme de Macedo, opinou pelo conhecimento e rejeição dos recursos (f. 1048/1050).

É o relatório.

Ambos os recursos serão examinados conjuntamente, eis que possuem basicamente a mesma argumentação.

Cuida a espécie de embargos infringentes contra acórdão que, por maioria de votos, deu parcial provimento ao recurso de apelação crime n. 381556-1 interposto pelo Ministério Público para o fim de condenar os réus Divanir Moreno Tozato, João Alves Correa e Josemar Aparecido de Lima, como incursos no art. 317, caput, c/c 29 e os réus Aquedemir Pastrelo e José Luiz Jardim como incursos no art. 333, caput, c/c 29, todos do CP. A sentença havia absolvido os denunciados.

Os embargantes João Alves Correa e Divanir Moreno Tozati são vereadores de Maringá e Josemar Aparecido de Lima, funcionário público, foram denunciados pela solicitação de R$ 150.000,00 ao administrador de empresas Aquedemir Pastrelo e ao empresário José Luiz Jardim, interessados na revogação da Lei Municipal n. 5471/01 que tombou o prédio da Companhia de Melhoramentos do Paraná. O objetivo da suposta propina era a realização de trabalhos legislativos visando a revogação da citada lei e a conseqüente liberação do imóvel que de fato veio a ocorrer.

Os recorrentes alegam, em síntese, a inexistência de prova da materialidade delitiva, pois afirmam que somente o saque de um numerário na empresa de Aquedemir e José Luiz, bem como tão somente o registro de ligações telefônicas entre os acusados sem o acesso ao seu conteúdo das conversas seriam insuficientes para firmar a materialidade. Questionam, ainda, a validade do depoimento dos informantes arrolados pela acusação por terem interesse na causa, concluindo, assim, ser desnecessário adentrar na questão da autoria, eis que ausente a materialidade. Por fim, ressaltaram que a revogação do tombamento foi tomada consensualmente pelos integrantes da Câmara.

De início, anoto que no processo penal brasileiro, por força do princípio da verdade real, a prova produzida nos autos deve traduzir exatamente a realidade dos fatos, de forma veemente e estreme de dúvida, para que possa dar ensejo a uma condenação. De outra sorte, havendo hesitação quanto aos seu conteúdo é de se aplicar o consagrado princípio in dúbio pro reo.

Nas palavras de Mirabete a prova consiste em: “produzir um estado de certeza na consciência e mente do juiz, para sua convicção, a respeito da existência ou inexistência de um fato, ou a verdade ou a falsidade de uma afirmação sobre uma situação de fato, que se considera de interesse para uma decisão judicial ou solução de um processo”. (Mirabete, Julio Fabbrini. Processo penal. São Paulo: Atlas, 10ª ed., 2000. p.257)

Conforme já ressaltado no corpo do acórdão recorrido, corrupção (ativa ou passiva) é crime formal que dispensa a materialização do produto da oferta, bastando para sua configuração o mero oferecimento de vantagem indevida ao agente público.

Neste sentido, convém destacar:

“APELAÇÃO CRIME - CORRUPÇÃO ATIVA - Para o crime de corrupção ativa, este se consuma com a simples oferta de vantagem indevida aos agentes públicos, eis que se trata de crime formal. “ (Ap. 326549-8, C. Crim. Suplem. Única do TJPR, Rel. Luiz Osório Moraes Panza, DJ 7227)

Todavia, examinando-se os autos entendo que as provas juntadas revelam-se extremamente frágeis no sentido de terem os embargantes praticado os delitos pelos quais foram denunciados, isto porque a prova produzida não permite concluir com certeza sobre a existência de algum ajuste prévio entre os réus para revogação da lei que tombou o imóvel em questão, elemento indispensável para caracterizar a conduta dolosa.

Também não há prova induvidosa de que estivessem agindo em razão de recompensa, eis que não se tem o acesso ao conteúdo das conversas mantidas entre eles, tampouco informação de que o saque do numerário tenha sido efetivamente destinado ao pagamento da alegada propina.

Aliás, como bem observou o magistrado a quo: “Saques bancários não foram objeto de maior investigação, não se produzindo nos autos qualquer relação de causalidade entre os indigitados saques e os fatos criminosos descritos na preambular. Se o denunciado João Alves foi a Arapongas para adquirir um veículo Kombi ou não, isto é desimportante para a causa (...)”. (fls. 714)

Assim, entendo que há de prevalecer o voto minoritário, e dele destaco pontos que vejo suficientes para demonstrar o acerto com que se houve o seu prolator:

“A prova consubstancia-se basicamente no saque do numerário na empresa dos réus Aquedemir Pastrelo e José Luiz Jardim; nas supostas conversas telefônicas entre os acusados - das quais não há conhecimento do seu conteúdo -, e ainda, nos depoimentos prestados pelas pessoas de Jorge Roberto Canova e seu filho Francis Eduardo Canova, os quais, não prestaram juramento justamente pelo interesse que possuíam no processo, sendo declarada a inimizade daquele para com os réus.
Denota-se pois, que os depoimentos acusatórios não foram corroborados por nenhum dos demais testemunhos, ou mesmo outros meios de provas.
(...)
Desta feita, não há certeza quanto às efetivas práticas delituosas sendo que foi negada durante toda a instrução processual pelos réus.”

Vale ainda frisar que a sinalização para a mera possibilidade não é o bastante para condenação criminal, exigente de certeza plena, como afirmou Carrara, ‘a prova para condenar deve ser certa como a lógica e exata como a matemática’.(Mirabete, ob. cit. pág 461)

Nesse sentido:

APELAÇÃO CRIMINAL. CORRUPÇÃO ATIVA E CORRUPÇÃO PASSIVA (ARTS. 333 E 317 DO CP). AUSÊNCIA DE PROVAS. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. FALSIDADE IDEOLÓGICA (ART. 299 DO CP). PRESCRIÇÃO RETROATIVA. ART. 110, § 2º E ART. 109, V, DO CÓDIGO PENAL. RECONHECIMENTO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NÃO-PROVIDA E APELAÇÃO DE JOSÉ DONIZETE DE OLIVEIRA BUENO PROVIDA. 1. Corrupção: A condenação penal exige juízo de plena certeza, baseada em firmes comprovações. A ausência desse requisito, em vista da inconclusiva prova testemunhal, única a respaldar o recurso da acusação, leva à absolvição dos réus, por força do art. 386, VI, do CPP. 2. Falsidade Ideológica: Verificado que entre a data dos fatos e do recebimento da denúncia transcorreu lapso suficiente para fulminar a pretensão punitiva do Estado pela superveniência da prescrição retroativa, em face da pena concretizada na sentença, impõe-se a extinção da punibilidade. Inteligência do art. 110, § 2º, e do art. 109, V, do Código Penal. (AC 0425341-0 - 2ª C.Criminal do TJPR - Rel.: Des. Noeval de Quadros - Unanime - Julgada em 25.09.2008)

APELAÇÃO CRIMINAL - CORRUPÇÃO PASSIVA - ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS -SENTENÇA IRRETOCÁVEL DIANTE DO CONJUNTO PROBATÓRIO FRÁGIL E INCONSISTENTE, INAPTO PARA LASTREAR DECRETO CONDENATÓRIO - APELO DESPROVIDO. A prova para fundamentar o decreto condenatório deve ser segura e consistente, apto a fundar a conclusão com absoluta certeza. Na falta destas provas a absolvição se impõe, por força do princípio constitucional do in dubio pro reo. (AC 0450179-3 - 1ª C.Criminal do TJPR - Rel.: Juiz Subst. 2º G. Edison de Oliveira Macedo Filho - Unanime - J. 24.01.2008)

Conclui-se, portanto, que não foi possível a coleta de elementos probatórios capazes de estabelecer o juízo de certeza indispensável para sustentar um veredicto condenatório, instalando-se dúvida intransponível, a qual, como é por demais cediço, deve ser resolvida em favor dos réus.

Assim, a absolvição dos embargantes/apelados, pela insuficiência de provas, é realmente a solução mais justa.

Ante essas considerações, o voto é pelo provimento do recurso, para, com esteio no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal, absolver os acusados da imputação que lhes foram feitas perante o Juízo da 1.ª Vara Criminal de Maringá.

ACORDAM os Desembargadores que integram a Primeira Câmara Criminal em Composição Integral do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento aos embargos infringentes para absolver os réus com base no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal, nos termos do voto do Relator.

Participaram do julgamento o Desembargador Oto Luiz Sponholz, a Desembargadora convocada para compor o quorum Maria Aparecida Blanco de Lima e os Juízes Substitutos em 2º Grau Luiz Osório Moraes Panza e Francisco Cardozo Oliveira.

Curitiba, 30 de abril de 2009.


Macedo Pacheco
Relator