4.6.09

Apelação crime

APELAÇÃO CRIME Nº 525407-5, DE MARINGÁ - 4ª VARA CRIMINAL
APELANTE : MARCELO ALVES DOS SANTOS
APELADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
RELATOR : JUIZ SUBST. 2º G. TITO CAMPOS DE PAULA1


APELAÇÃO CRIME - CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DO DELITO DE ROUBO (POR TRÊS VEZES) EM CONTINUIDADE DELITIVA - INCONFORMISMO.
1) PRETENSÃO POR RECONHECIMENTO DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA EM RELAÇÃO AO TERCEIRO FATO CRIMINOSO - ATENUANTE JÁ CONSIDERADA NA SENTENÇA - REDUÇÃO QUE IMPLICOU NA FIXAÇÃO DA PENA NO MÍNIMO LEGAL - INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 231/STJ.
2) INSURGÊNCIA QUANTO AO MONTANTE DE 2/3 APLICADO PARA A REGRA DO CRIME CONTINUADO - PROCEDÊNCIA PARCIAL - CASO CONCRETO ONDE A PRÁTICA DE TRÊS DELITOS DE ROUBO SE MOSTRA MAIS PRUDENTE O AUMENTO DE 1/3 - REDUÇÃO DA PENA QUE SE IMPÕE.
3) RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO PARA O FIM DE REDUZIR A PENA.


VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Crime nº 525407-5, de Maringá - 4ª Vara Criminal, em que é Apelante MARCELO ALVES DOS SANTOS e Apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ.


I - Conforme consta dos autos às fls. 02/07, MARCELO ALVES DOS SANTOS e DANIEL BARBOSA foram denunciados pelos seguintes fatos:

1º Fato: No dia 27 de dezembro de 2007, por volta das 18h15min, na Av. Cerro Azul, Maringá, os denunciados DANIEL BARBOSA, vulgo “Pastel”, e MARCELO ALVES DOS SANTOS vulgo “Dumbo”, enquanto o denunciado MARCELO dirigia o veículo FIAT/UNO Mille Ex, cor cinza, placas AJB-0293, garantindo a fuga e êxito do delito, o denunciado DANIEL, mediante grave ameaça, exercida pelo emprego de arma de fogo (não apreendida nos autos), subtraiu 01 (uma) bolsa de couro, marca Victor Hugo, avaliada aproximadamente em R$ 250,00 (duzentos e cinqüenta reais), contendo em seu interior 01 (uma) carteira de couro, avaliada aproximadamente em R$ 30 (trinta reais), 01 (um) aparelho celular marca Samsung, de cor prata, modelo com flip, avaliado aproximadamente em R$ 200,00 (duzentos reais), de propriedade da vítima Daiana Laurindo Cordeiro.

2º fato: No dia 27 de dezembro de 2007, por volta das 18h30min, na Rua Monsenhor Tanaka, em frente ao nº. 300, no Jardim Novo Horizonte, na cidade de Maringá/PR, os denunciados DANIEL e MARCELO, o qual dirigia o veículo acima mencionado, em ação delituosa contínua, subtraíram mediante grave ameaça exercida pelo emprego de arma de fogo (não apreendida nos autos), 01 (uma) bolsa de couro de marca Malahara, avaliada aproximadamente em R$ 100,00 (cem reais), contendo em seu interior 02 (duas) blusinhas de cor branca, marca Bilabong, avaliada aproximadamente em R$ 49,00 (quarenta e nove reais) cada, bem como documentos pessoais, de propriedade da vítima Ana Paula Pickler.

3º fato: No dia 01 de janeiro de 2008, por volta das 13h00min, em um ponto de ônibus, no Jardim Horizonte, na cidade de Maringá/PR, os denunciados de posse do mesmo veículo, em que era conduzido por MARCELO, para garantia de fuga e êxito do delito, o denunciado DANIEL, agindo mediante grave ameaça, exercida pelo emprego de arma de fogo (não apreendida nos autos), subtraiu para eles 01 (uma) bolsa, avaliada em R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais), contendo em seu interior 01 (um) anel de ouro branco, avaliado aproximadamente em R$ 600,00 (seiscentos reais), 01 (uma) pulseira de prata de Bali, avaliada em aproximadamente R$ 250,00 (duzentos e cinqüenta reais), 01 (uma) pulseira de prata de Bali, avaliada em aproximadamente R$ 300,00 (trezentos reais), 01 (um) anel de bijuteria, avaliado em aproximadamente R$ 3,00 (três reais), 01 (uma) mamadeira avaliada em R$ 5,00 (cinco reais), roupas diversas avaliadas em R$ 20,00 (vinte reais), além de R$ 15,00 (quinze reais) em espécie, tudo de propriedade da vítima Patrícia Suelen de Lima Dias.

Por sentença (fls. 188/206), a pretensão punitiva do Estado foi julgada procedente para o fim de condenar os réus DANIEL BARBOSA e MARCELO ALVES DOS SANTOS pela prática do crime tipificado no art. 157, § 2º, incisos I e II (por três vezes), observada a regra do art. 71, todos do Código Penal.
Para ambos os réus foi fixado pena definitiva de 10 (anos) anos e 08 (oito) meses de reclusão e de 32 (trinta e dois) dias-multa, com estabelecimento de regime fechado para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade.
Inconformado com a condenação MARCELO ALVES DOS SANTOS interpôs recurso de apelação (fl. 212), apresentando razões às fls. 227/232, onde pretende a redução do quantum condenatório, aduzindo principalmente que o magistrado deixou de considerar a atenuante da confissão espontânea, e que o aumento decorrente da continuidade delitiva foi exacerbado.
DANIEL BARBOSA, embora intimado pessoalmente da sentença, manifestou expressamente não possuir interesse em recorrer da condenação (fl. 207).
As contra-razões foram apresentadas pelo Ministério Público às fls. 234/245, tendo este se manifestado pelo conhecimento do recurso e, no mérito, pelo seu improvimento.
A Procuradoria Geral de Justiça emitiu o parecer de fls. 256/261, da lavra do Procurador de Justiça FRANCISCO JOSÉ ALBUQUERQUE DE S. BRANCO, manifestando-se pelo conhecimento do apelo e, no mérito, pelo seu desprovimento.
É a breve exposição.

II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO:

Presentes os requisitos legais, o recurso deve ser conhecido.
Inicialmente, é importante destacar que o apelante, nas razões de recurso, não questiona a materialidade e a autoria delitivas, ou seja, não se insurge contra a condenação em si, mas limita-se tão somente a impugnar a dosimetria da pena, sustentando que deveria ter sido considerada a atenuante da confissão espontânea e que a continuidade delitiva foi aplicada de forma exagerada.

Da atenuante da confissão espontânea.
Sustenta o recorrente (fls. 227/228) que o juiz sentenciante não considerou o fato de ele ter confessado a prática de um dos crimes, ou seja, o fato n.º 3 narrado na denúncia, deixando, com isso, de atenuar sua pena. Entretanto, o argumento não procede, eis que da simples leitura da sentença, é possível observar claramente que o juiz a quo observou que o réu confessou um dos crimes, tendo consignado expressamente na sentença o seguinte:

...O acusado Marcelo, por sua vez, negou a prática dos dois primeiros roubos, afirmando, em sede de interrogatório judicial, quando questionado acerca do crime praticado contra a vítima Ana Paula Pickler (fato 02), que estava dando carona para a pessoa de Daniel e que não possuía conhecimento de que este estava imbuído da intenção de praticar o roubo; disse, ainda, que realmente auxiliou o roubo descrito no fato 03, uma vez que sabia que Daniel iria praticar um novo crime e que realizou o transporte deste até o local do delito, pois é usuário de drogas e precisava de dinheiro para comprar entorpecentes. (fls. 112/119).

Quando da elaboração da dosimetria da pena, à fl. 204, a atenuante foi devidamente considerada, como se vê do trecho abaixo (fl. 204):
...Diante da ocorrência da circunstância prevista na alínea “d”, do inciso “III”, do artigo 65 do Código Penal30, ATENUO a pena fixada em 08 (oito) meses de reclusão e 04 (quatro) dias-multa, estabelecendo-a provisoriamente em 04 (quatro) anos de reclusão e 10 dias-multa.

Nesse momento é preciso que faça um parênteses, para destacar que na sentença o juiz ao adicionar a nota de rodapé n.º 30, equivocadamente fez constar que “O réu possuía menos de 21 anos na data dos fatos”, porém, esse equívoco é apenas material, eis que o dispositivo legal mencionado pelo magistrado está correto, conforme se nota abaixo:

Art. 65. São circunstâncias que sempre atenuam a pena:
...
III - ter o agente:
...
d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, a autoria do crime;
...

Assim, quando diminuiu a pena em 08 meses de reclusão e em 04 dias-multa, o juiz o fez em razão da confissão espontânea e não por outra atenuante.
Ademais, existe outro fator nos autos que demonstra que efetivamente a nota de rodapé não passou de um equívoco material do magistrado, que não interfere no mérito do julgamento, uma vez que o documento de fl. 30, que se trata da Carteira Nacional de Habilitação do réu MARCELO ALVES DOS SANTOS, ora recorrente, indica claramente o dia 10/08/1981 como a data de nascimento do réu, de forma que ele tinha 26 anos de idade ao tempo do crime (janeiro de 2008), não havendo que se falar, portanto, em “agente menor de 21 anos na data dos fatos”.
Assim sendo, uma vez esclarecido que a atenuante considerada na sentença foi a da confissão espontânea, não procede o argumento recursal.
No tocante ao montante aplicado para atenuar a pena, não há que se falar em maior redução, eis que a pena, em razão da confissão, já resultou no mínimo legal de 4 anos e de 10 dias-multa, não sendo possível aplicar redução para aquém do mínimo legal nessa fase, conforme entendimento consolidado pela Súmula 231/STJ2.

Da continuidade delitiva.
Quanto à alegação do recorrente de que houve exagero por parte do juiz ao aplicar a regra da continuidade delitiva no seu grau máximo de dois terços3, verifica-se que assiste razão parcial ao recorrente, notadamente se apreciarmos a questão com base no princípio da razoabilidade.
Com efeito, embora a sentença esteja fundamentada, tendo o magistrado a quo justificado a escolha do montante na quantidade de delitos praticados (três), é preciso registrar que, pelo mesmo motivo, ou seja, em razão da quantidade de delitos praticados, é que a sentença deve ser parcialmente reformada, eis que, embora a legislação não disponha expressamente como deve ser feita a graduação do intervalo trazido no artigo 71 do CP (de 1/6 a 2/3), a jurisprudência dominante tem estabelecido que, via de regra, a pena deverá ser aumentada em razão do número de delitos cometidos, devendo-se considerar que, para 2 crimes aumenta-se a pena em 1/6; para 3 crimes, em 1/5; para 4 crimes, em 1/4; para 5 crimes, em 1/3; para 6 crimes, em 1/2; e, por fim, para 7 ou mais crimes, aumenta-se no máximo de 2/34.
A doutrina também se postou nesse sentido, como se vê, por exemplo, em Júlio Fabrini Mirabete, in Manual de Direito Penal, Ed. Atlas, p. 317, vol. 1, que ensina acerca da continuidade delitiva o seguinte:

“Para a dosagem do aumento deve-se levar em conta, principalmente, o número de infrações praticadas pelo agente. Tem-se recomendado com parâmetros aumento de um sexto para duas infrações; de um quinto para três; de um quarto para quatro; de um terço para cinco; de metade para seis; de dois terços para sete ou mais ilícitos.”

Portanto, se fossemos levar em consideração apenas o número de crimes pelos quais foi o recorrente condenado (três delitos), sobre a pena do crime mais grave, que foi de 06 (seis) anos e 05 (cinco) meses de reclusão (77 meses) e de 19 dias-multa, em princípio, a pena seria aumentada de 1/5 e resultaria em 07 (sete) anos, 08 (oito) meses e 12 (doze) dias de reclusão e em 22 dias-multa.
Em que pese tal raciocínio, não podemos esquecer, que o parágrafo único do art. 71 do Código Penal, estabelece que nos crimes dolosos contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade do agente e outras circunstâncias do crime, aumentar a pena até o triplo, de forma que poderia, em tese, até mesmo ser superior àquela estabelecida na sentença.
Com base nesse princípio, é imperioso reconhecer que, no caso dos autos, apesar de entender que a pena imposta deve ser reduzida, não podemos levar em consideração apenas a quantidade numérica dos delitos praticados, pois, o aumento de apenas 1/5, conforme visto, não seria o mais razoável para o caso, eis que, se tratam de 03 roubos, naturalmente praticados com grave ameaça às pessoas e, apesar de ter se configurado a continuidade delitiva, cada crime foi praticado em locais distintos e contra vítimas distintas.
Além disso, todas as vítimas eram mulheres, o que impossibilita ainda mais a possibilidade de defesa, sendo que a vítima Ana Paula havia saído do local de trabalho e estava chegando em casa a pé e sozinha, quando foi abordada pelos réus (fl. 47).
Patrícia estava em um ponto de ônibus juntamente com sua sobrinha de 07 anos de idade, com seu filho de apenas um ano e sua cunhada, sendo que no assalto inclusive a mamadeira e fraldas de seu bebê (fls. 130/131).
Daiana estava andando sozinha pela rua quando foi abordada (fls. 132/133).
Ora, tais fatos demonstram que, enquanto as vítimas estavam na rotina da vida, inclusive chegando do trabalho, os réus estavam praticando os roubos contra elas, provocando os traumas que são naturais desse tipo de crime, inclusive nas crianças que acompanhavam uma das vítimas, de sorte que, a culpabilidade de ambos é acentuada e, não merecem a redução da pena no patamar de apenas 1/5 conforme indicado pela jurisprudência no que se refere à questão unicamente numérica de crimes praticados.
Assim, entendo que se aumentando a pena mais grave em 1/3, está mais do que justo para o caso concreto.
Dessa forma, como a pena mais grave aplicada ao réu foi de 6 anos e 5 meses de reclusão e de 19 dias-multa, aplicando-se o aumento de 1/3, tem-se que a pena resulta definitiva em 8 anos, 6 meses e 20 dias de reclusão e em 25 dias-multa.
Quanto aos demais aspectos (como valor do dia-multa, regime, substituições, custas) a sentença deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos.
Assim sendo, voto no sentido de conhecer do recurso e, no mérito, de dar parcial provimento para o fim de readequar a pena do apelante MARCELO ALVES DOS SANTOS, que ora resta fixada definitivamente em 08 (oito) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e em 25 dias-multa e, como a pena de ambos os acusados foram fixadas de maneira idêntica e, se está levando em consideração principalmente o número de crime praticados, com fulcro no artigo 580 do Código Penal, mesmo não tendo o co-réu DANIEL BARBOSA interposto recurso, o presente benefício deve ser estendido em seu favor, de forma que a sua pena também deve ser reduzida para o mesmo patamar já referido, ou seja, de 08 (oito) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e em 25 dias-multa.

III - DECISÃO:

Diante do exposto, acordam os Desembargadores da 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar parcial provimento ao recurso do réu Marcelo Alves dos Santos, com extensão dos feitos ao co-réu Daniel Barbosa, nos termos do voto.
Participaram da sessão e acompanharam o voto do Relator os Excelentíssimos Senhores Desembargadores MIGUEL PESSOA e ANTÔNIO MARTELOZZO.
Curitiba, 14 de maio de 2009.


Juiz Subst. 2º G. TITO CAMPOS DE PAULA
Relator


1 Em substituição ao Des. J. VIDAL COELHO.
2 Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”.
3 Art. 71. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentesser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

4 TJPR: Apelação Crime n.º 430490-1.