3.8.09

Agravo de instrumento - Sadenco

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 505824-0, DA 4ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE MARINGÁ.
AGRAVANTE: SADENCO SUL AMERICANA DE ENGENHARIA E COMÉRCIO LTDA.
AGRAVADO: MUNICÍPIO DE MARINGÁ.
RELATOR: DES. SALVATORE ANTONIO ASTUTI.


Administrativo e constitucional. Licitação pública. Desclassificação da agravante. Interposição de recurso administrativo perante a autoridade municipal que dele não conheceu. Impossibilidade. Súmula nº 429 do Supremo Tribunal Federal. Decisão reformada.



Vistos e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 505824-0, de Maringá - 4ª Vara Cível, em que é Agravante SADENCO SUL AMERICANA DE ENGENHARIA E COMÉRCIO LTDA e Agravado MUNICÍPIO DE MARINGÁ

RELATÓRIO
Trata-se de Agravo de Instrumento (fls. 02/12) contra decisão de fls. 152/155-TJ que, nos Autos de Ação Cautelar Inominada nº 587/2008 (fls. 17/35-TJ), indeferiu a liminar pleiteada pela Requerente ora Agravante, onde se pretendia que o Município de Maringá se abstivesse da prática de todo e qualquer ato referente à licitação na modalidade Concorrência Pública do tipo menor preço nº 074/2007 - cujo objeto era a contratação de empresa para a prestação de serviços, incluindo mão-de-obra todos os materiais e equipamentos de rebaixamento da iluminação pública do Município, divididos em quatro lotes.
Em suas razões, aduz que ajuizou ação cautelar objetivando a nulidade do procedimento licitatório, inclusive contrato firmado sob os seguintes fundamentos:
“a) conduta ilegal e que afrontava o edital de licitação (vide prova de “materiais e equipamentos”, com a inclusão de todas as empresas juntamente com a vencedora; b) ilegalidade da recusa do Agravado, de julgar o recurso administrativo interposto.” (fl. 04).
Argumenta que foi habilitada e apresentou as propostas com os melhores preços para três dos quatro lotes em que concorreu, sagrando-se vencedora do certame.
Afirma que, após apresentar as melhores propostas, a comissão de licitações do Município Agravado determinou que ela e as demais concorrentes apresentassem amostras dos materiais e equipamentos que utilizariam, conduta esta que teria contrariado o item 7.1 do Edital, o qual previa que apenas a empresa vencedora deveria apresentar os materiais e que, por essa razão, foi desclassificada na “nova fase” (fl. 04) de apresentação de materiais e equipamentos.
Informa que interpôs recurso administrativo (fls. 102/113) questionando a “nova fase”, não prevista no Edital, ao mesmo tempo em que impetrou mandado de segurança com pedido de liminar, “(...) contra ato ilegal e abusivo praticado pelo DIRETOR DE COMPRAS E LICITAÇÕES DA SECRETARIA DE ADMINISTRAÇÃO DA PREFEITURA MUNICIPAL DE MARINGÁ - PR”. (fls. 115/130-TJ).
Aduz que a Comissão de Licitação não conheceu do recurso administrativo sob o argumento de que a impetração de mandado de segurança pela Agravante tornaria sem efeito tal recurso e a ação judicial perdeu seu objeto, na medida em que o Município finalizou o processo de licitação e firmou contrato com a empresa vencedora.
Afirma, ainda, que ao Recorrido não estava facultado negar-se a apreciar o recurso administrativo sob qualquer argumento e que, para tal, pautou-se em doutrina “desvirtuada pelo Agravado”, conduta essa que desrespeita os dispositivos da Lei nº 8.666/90.
Requereu a concessão de efeito ativo ao recurso para os fins de que o Agravado se abstenha de praticar qualquer ato ligado ao procedimento licitatório nº 074/07, ou ao contrato decorrente do certame, ficando impedido de efetuar pagamentos a serem feitos pelo Recorrido, derivados de um certame potencialmente nulo, somado ao fato de se tratar de uma licitação envolvendo o valor de R$ 7.866.497,60 (sete milhões, oitocentos e sessenta e seis mil, quatrocentos e noventa e sete reais e sessenta centavos).
Às fls. 164/168, foi deferida a antecipação de tutela pretendida.
O Município de Maringá manejou pedido de reconsideração (fls. 177/202) e apresentou contra-minuta (fls. 341/355) onde pugnou pelo não provimento do recurso.
O Dr. Juiz da causa prestou informações às fls. 336, dando conta que a Recorrente cumpriu o disposto no art. 526, do Código de Processo Civil, e que, manteve a decisão ora recorrida.
Às fls. 491 o pedido de reconsideração do Município agravado restou indeferido.
A douta Procuradoria Geral de Justiça em r. parecer de fls. 516/519 opinou pelo provimento do presente recurso e, por conseqüência a reforma da decisão singular de 1º grau.
É o relatório.

VOTO
O caso em espécie versa sobre Agravo de Instrumento manejado contra decisão que indeferiu o pleito de concessão de liminar, consubstanciada na desclassificação da Agravante de certame licitatório, bem como, a recusa da Administração Municipal, ora Agravada, em conhecer do recurso administrativo da Recorrente.
Da análise do conteúdo dos autos em confronto com o teor da r. decisão monocrática, a par dos argumentos expendidos nas razões recursais, temos que o recurso oferece condições de êxito.
Cinge-se a controvérsia recursal, portanto, em saber é ou não possível a concessão de liminar na espécie, para o fim de determinar que a Agravante obtenha a resposta ao recurso administrativo manejado perante o Agravado.
Justifica-se a antecipação de tutela pelo princípio da necessidade, a partir da constatação de que sem ela a espera pela sentença de mérito importaria denegação de justiça, já que a efetividade da prestação jurisdicional restaria gravemente comprometida.
O poder discricionário do Magistrado se caracteriza pela liberdade de poder formular a si próprio uma norma de atuação, derivada de seu dever como órgão do Estado e do objeto a atingir, daí porque, a lei oferecendo parâmetros à atuação judicial, na verdade permite que o Julgador dê à causa soluções diversas, outorgando-lhe, igualmente, um poder/dever de conteúdo discricionário, tanto no aspecto processual como jurisdicional.
Assim, o deferimento da tutela antecipatória, decorre da livre convicção e prudente arbítrio do Magistrado, mas, desde que satisfeitos os requisitos legais, quais sejam: prova inequívoca e verossimilhança da alegação e fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do requerido.
No caso dos autos, o Dr. Juiz de Direito concluiu que a concessão liminar não se fazia possível porque naquele momento, não ficou convencido da presença da fumaça do bom direito da ora Agravante, limitando-se a transcrever a decisão indeferitória lançada nos autos de mandado de segurança nº 396/2008.
Todavia, diferentemente do que entendeu o Magistrado Singular, a decisão merece reforma, visto que no caso concreto, verifica-se que a Agravante demonstrou, em relevante fundamentação, a possibilidade de dano irreparável ao seu direito caso o recurso administrativo interposto não seja apreciado pelo Município Agravado e, a possibilidade de grave e efetiva lesão à ordem e à economia públicas.
Nesse sentido é o parecer da d. Procuradoria Geral de Justiça: “Nesse viés, por certo que a suspensão do procedimento licitatório se faz necessária para que o Município de Maringá se abstenha de praticar qualquer ato ligado ao certame nº 074/07, ou ao contrato decorrente deste, para o fim de impedir o pagamento da quantia de R$ 7.866.497,60 (sete milhões, oitocentos e sessenta e seis mil, quatrocentos e noventa e sete reais e sessenta centavos) até que seja verificada a legalidade do procedimento, evitando assim possíveis prejuízos ao erário público.” (fls. 519).
Demais disto, consta nos itens e 6.4.6 do Edital nº 074/07 (fls. 64 - TJ):
“6.4.6. Após, a Comissão de Licitação se reunirá sem a presença cós concorrentes e julgará as razões apresentadas, comunicando, posteriormente, o resultado desta análise às proponentes, através de fax ou e-mail e publicado no Órgão Oficial do Município.” (negrito não consta do original).

Esta Câmara cível já se posicionou a respeito:
“MANDADO DE SEGURANÇA. PREGÃO ELETRÔNICO. ADJUDICAÇÃO DO OBJETO DA LICITAÇÃO SEM ANTES TER SIDO JULGADO O RECURSO ADMINISTRATIVO INTERPOSTO POR UMA DAS LICITANTES. OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ESTRITA.
De acordo com o inc. XXI do art. 4.º da Lei Federal n.º 10.520/02 (Lei do Pregão Eletrônico), a autoridade administrativa competente somente fará a adjudicação do objeto da licitação ao licitante vencedor após o julgamento dos recursos interpostos.” (Apelação Cível nº 337180-6, Rel. Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau Xisto Pereira).

A documentação trazida aos autos demonstra, de forma cristalina a violação do direito líquido e certo da Agravante, quando a Administração Municipal deixou de conhecer do recurso administrativo em razão da impetração de mandado de segurança.
Constata-se, ainda, que a Recorrente sagrou-se vencedora em 03 (um) dos 04 (quatro) lotes de obras licitados na modalidade de menor preço e que o Agravado ao convocar todas as concorrentes a apresentarem os materiais, extrapolou as balizas do que consta do Edital, item 7.1, o seguinte (fl. 80):
“O licitante classificado em primeiro lugar para a execução dos serviços previstos em CADA LOTE firmará com o Município o respectivo contrato, que incluirá as condições estabelecidas neste Edital e outras necessárias à fiel execução do objeto da presente CONCORRÊNCIA, nos termos da minuta que integra o presente Edital na forma de Anexo III, para todos os efeitos legais e convencionais.”

O argumento do Agravado de que não conheceu do recurso administrativo interposto pela Agravante em razão da impetração de ação mandamental, também vai de encontro à Súmula nº 429 do Supremo Tribunal Federal: “A existência de recurso administrativo com efeito suspensivo não impede o uso do mandado de segurança contra omissão da autoridade.”
Tudo isso demonstra a fumaça do bom direito e do perigo da demora da pretensão da Agravante.
Não bastassem esses argumentos, a Lei nº 8.666/93, ainda explicita que interpostos os recursos, deles serão comunicados os demais licitantes, que poderão impugná-los também no prazo de 5 (cinco) dias úteis o, se de convite tratar, no prazo de 2 (dois) dias úteis. O recurso será dirigido à autoridade superior, por intermédio da que praticou o ato recorrido, a qual poderá reconsiderar sua decisão, no prazo de 5 (cinco) dias úteis, ou, nesse mesmo prazo, fazê-lo subir, devidamente informado, devendo, neste caso, a decisão ser proferida dentro do prazo de 5 (cinco) dias úteis, contado do recebimento do recurso, sob pena de responsabilidade (§ 4º do art. 109).
Desse modo, não parece possível exigir do licitante/Agravante nada além ou aquém das disposições a que faz alusão o Edital e a própria Lei 8.666/93. Poder-se-ia admitir um maior rigor na análise da documentação dos concorrentes, mas não inovar no que diz respeito a exigências, sob pena de violação dos dispositivos legais acima referidos.
Nestas condições, é de se dar provimento ao recurso para reformar a decisão recorrida.

DECISÃO
Acordam os integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento ao recurso.
Participaram do julgamento as Desembargadoras Lélia Samardã Giacomet e Regina Afonso Portes.
Curitiba, 23 de junho de 2009.

Des. Salvatore Antonio Astuti
Relator