14.8.09

Apelação civil

APELAÇÃO CÍVEL Nº 578.271-2, DA 1ª VARA CÍVEL DE MARINGÁ.

APELANTE: MUNICÍPIO DE MARINGÁ

APELADO: LAÉRCIO ZAMBELLI

RELATOR: DES. DIMAS ORTÊNCIO DE MELO


APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. QUEDA DE PEDESTRE EM BUEIRO. MÁ CONSERVAÇÃO DO LACRE DE BUEIRO. CONDUTA OMISSIVA DO MUNICÍPIO. RESPONSABILIDADE CIVIL COMPROVADA. DANO MATERIAL E DANO MORAL CONFIGURADOS. DEVER DE INDENIZAR. ADEQUAÇÃO DO VALOR FIXADO NA SENTENÇA.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO








Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 578.271-2, da Comarca de Maringá, em que é apelante o Município de Maringá e apelado, Laércio Zambelli.


1. RELATÓRIO:

Laércio Zambelli ajuizou, perante o Juízo de Maringá, ação de indenização por danos materiais, estéticos e morais contra o Município de Maringá, buscando a condenação deste ao pagamento de indenização por danos materiais de R$ 2.600,00 e morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

A sentença (fls. 85/87) julgou parcialmente procedente o pedido formulado pelo autor, para condenar o Município ao pagamento de danos materiais de R$ 1.170,00, “corrigidos a partir de 3/09/2006 pelo INPC”, e danos morais de 20 salários mínimos vigentes na propositura da ação, “corrigidos pelo INPC, acrescidos de juros legais de mora de 1% desde a citação”.

Por conseqüência, condenou o Município ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios de 15% do valor da condenação, nos termos do art. 20, §3º, do Código de Processo Civil, e no limite do art. 11, §1º, da Lei n. 1.060/50.

Inconformado, o Município de Maringá recorre (fls. 93/101), alegando, em síntese: a) a responsabilidade, no caso, “deriva da teoria subjetiva da responsabilidade civil”; b) ausência de culpa omissiva por parte da Administração Pública e de seus servidores; c) que o valor dos danos morais deve ser reduzido, porque fixado além do razoável.

Foram apresentadas contra-razões (fls. 104/106).

A douta Procuradoria Geral de Justiça se manifestou pelo parcial provimento do recurso (fls. 117/129).

É o relatório.


2. VOTO

Presentes os requisitos de admissibilidade (adequação, tempestividade e preparo), não há obstáculo ao conhecimento do recurso.


Busca o apelante afastar sua responsabilidade sob a alegação de que não houve omissão culposa, ou então a redução do valor do dano moral.

O recurso não comporta provimento.

Pois bem, entende-se a responsabilidade civil do Estado como sendo a obrigação legal, que lhe é imposta, de ressarcir os danos causados a terceiro por suas atividades ou omissões.

No caso, a responsabilidade do Município é decorrente de sua conduta omissiva e culposa, concernente na má conservação de bueiro na Rua Capibaribe, que restou caracterizada pelas fotografias de fls. 16/19, na qual se nota a má conservação do lacre do bueiro, o que facilita a ocorrência de danos à população, como de fato aconteceu, bem como pela prova testemunhal colhida nos autos (fls. 72/73).

Confiram-se os elementos extraídos da prova testemunhal:

- Jaime de Carvalho: “na época dos fatos trabalhava com o autor e depois que ele chegou do hospital, tomou conhecimento que ele tinha caído no bueiro e conforme informações da filha do autor a tampa do bueiro estava quebrada além de haver grama que não dava visibilidade do bueiro...” (fl. 72).

- Antonio Carlos Rodrigues Matos: “ajudou a socorrer o autor e tomou conhecimento que ele se acidentou dentro de um bueiro, entretanto, o depoente não esteve no local e nem conhece o local do acidente. Que o autor ficou muito tempo parado em função do acidente (...). Que quando o depoente socorreu o autor ele estava com a perna sangrando ...” (fl. 73).

Com efeito, em se tratando de ato omissivo do Poder Público, em pesem os fundamentos da sentença, a responsabilidade civil é subjetiva, exigindo dolo ou culpa numa de suas três modalidades: negligência, imprudência e imperícia, “não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a ‘faute du service dos franceses’” (RE nº 179.147-SP, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJU 27.02.1998).

Ademais, compete aos Municípios manter em condições adequadas as vias públicas, de forma a assegurar a integridade física dos pedestres e condutores de veículos, sob pena de responder por eventuais danos que terceiros venham a suportar.

Nesse sentido:

EMENTA: DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. MUNICÍPIO. INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. BURACO EM VIA PÚBLICA. QUEDA DE PEDESTRE. INEXISTÊNCIA DE LACRE OU TAMPA DE PROTEÇÃO ADEQUADOS. CULPA. CARACTERIZAÇÃO. INTELIGÊNCIA DO § 6º DO ARTIGO 37 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. Demonstrado que o acidente sofrido pela vítima - queda em bueiro desprovido de proteção adequada - deu-se por falha de fiscalização, manutenção e segurança do sistema a ele afeto, deve responder o ente público municipal pelos danos físicos e morais decorrentes. 2. A obrigação de indenizar está conectada ao desfalque sofrido pela vítima, em seu patrimônio, em razão do ato ilícito. 3. Na fixação do dano moral, verificado que estes foram arbitrados em quantia exacerbada, impõe-se a necessária redução, em conta das circunstâncias pessoais e materiais do caso, analisadas à luz do princípio da razoabilidade. 4. Sendo condenada a Fazenda, na fixação da sucumbência, deve-se aplicar o § 4º do art. 20 do CPCivil. Apelação parcialmente provida. (TJ/PR, 5ª CC, Apelação Cível n. 365.361-2, Rel. Rosene Arão de Cristo Pereira, DJ 01/06/2007).

REEXAME NECESSÁRIO. CONHECIMENTO DE OFÍCIO. ARTIGO 475, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, ESTÉTICOS E MORAIS - QUEDA EM BUEIRO - SEQÜELAS RESULTANTES - CONDUTA OMISSIVA DO MUNICÍPIO - RESPONSABILIDADE CIVIL - PROVA - ART. 333, I, DO CPC. - OBSERVÂNCIA - FATO MODIFICATIVO NÃO EVIDENCIADO. DANO MATERIAL COMPROVADO. DANOS ESTÉTICOS E MORAIS CARACTERIZADOS. DEVER DE INDENIZAR. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - FIXAÇÃO - ART. 20, § 4º, DO CPC. REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO DE OFÍCIO. RECURSO DO AUTOR PROVIDO. RECURSO DO MUNICÍPIO NÃO PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA PARCIALMENTE EM GRAU DE REEXAME NECESSÁRIO. 1. Ausência do serviço ou defeito no seu funcionamento configura a responsabilidade prevista na teoria da culpa administrativa. (...) (TJ/PR, 4ª CC, Apelação Civil n. 375.218-9, Rel. Luis Espíndola, DJ 20/07/2007).

Ora, como bem observado na sentença, “um bueiro com tampa frágil e com falta de manutenção, pode causar inúmeros acidentes” (fl. 85).

Configurada, portanto, a culpa da Administração Pública municipal, decorrente de sua conduta omissiva, como visto acima.

O dano, por sua vez, restou comprovado pelas fotografias de fls. 20/21, pela ficha de atendimento hospitalar de fl. 22, pelos atestados de fls. 23/24 e pelos receituários médicos de fls. 25/27.

Ademais, não se verifica, no caso, nenhuma das excludentes da responsabilidade do Estado, quais sejam, culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior, restando caracterizada a responsabilidade do Município por ato omissivo.

Assim, comprovados a conduta omissiva e culposa do Município, a ocorrência do dano e o nexo causal, inegável o dever de indenizar, como bem concluiu o juiz de primeiro grau, que determinou os danos materiais, na modalidade de lucros cessantes, a serem indenizados, no valor de R$ 1.170,00.

Os danos morais, igualmente, são devidos, em que pese à insurgência do Município apelante, pois notórios os transtornos morais sofridos pela vítima, pela queda no bueiro, que lhe ocasionou lesões na perna.

Ora, o dano moral se presume, pois o abalo emocional sofrido pela vítima com o dano decorrente do ato omissivo e culposo do Município é evidente, só podendo ser afastado por prova robusta em contrário relativa às circunstâncias do evento danoso, o que não ocorreu no caso.

E a indenização não serve apenas como reparo da dor sofrida pela vítima, mas para restauração de sua dignidade, até porque não se trata de dano com repercussão patrimonial. Assim, não deve ser ínfima, ao ponto de desvalorizar o dano moral, nem exagerada, ao ponto de causar enriquecimento indevido do ofendido.

De qualquer forma, nos casos de indenização por danos extrapatrimoniais, “é evidente que nunca atingiremos a perfeita equivalência entre a lesão e a indenização, por mais apurada e justa que seja a avaliação do magistrado, não importando também que existam ou não artigos de lei apontando parâmetro”1.

Na doutrina, elementar a lição de Pontes de Miranda, no sentido de que “embora o dano moral seja um sentimento de pesar íntimo da pessoa ofendida, para o qual se não encontra estimação perfeitamente adequada, não é isso razão para que se lhe recuse uma compensação qualquer. Essa será estabelecida, como e quando possível, por meio de uma soma, que não importando uma exata reparação, todavia representará a única salvação cabível, nos limites das forças humanas. O dinheiro não os extinguirá de todo, não os atenuará mesmo por sua natureza, mas, pelas vantagens que o seu valor permutativo poderá proporcionar, compensando, indiretamente e parcialmente, embora, o suplício moral que os vitimados experimentam.” (in Tratado volume 53/228).

Em caso semelhante ao em análise, esta Corte já decidiu:

EMENTA: CIVIL - RESPONSABILIDADE CIVIL - SERVIÇO MUNICIPAL DE ÁGUA E ESGOTO - INDENIZAÇÃO - DANOS MATERIAIS E MORAIS - BURACO NA VIA PÚBLICA - QUEDA DE TRANSEUNTE - INEXISTÊNCIA DE LACRE OU TAMPA DE PROTEÇÃO ADEQUADOS - CULPA - CARACTERIZAÇÃO - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 37, § 6º, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
1. Demonstrado que o acidente sofrido pela vítima, por sua queda num bueiro desprovido de proteção adequada, deu-se por falha de fiscalização, manutenção e segurança do sistema a ele afeto, deve responder o ente público municipal pelos danos físicos e morais decorrentes. (...) (TJ/PR, 2ª CC, Apelação Cível n. 167.592-1, Rel. Luiz Cezar de Oliveira, DJ 26/08/2005).

Por fim, com relação ao valor do dano moral, embora não existam parâmetros concretos para a fixação, à luz do princípio da razoabilidade e levando em conta fatores como grau da culpa, extensão do dano, condições pessoais do ofendido e capacidade financeira dos envolvidos, entendo suficiente o valor fixado na sentença (20 salários mínimos, vigentes na época da propositura da ação2), por ser compatível com as circunstâncias do caso.


2.3. Por essas razões, voto pelo não provimento do recurso do Município.


3. DECISÃO:

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Terceira Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso do Município, nos termos do voto do Relator.

Participaram do julgamento o Desembargador Ruy Francisco Thomaz e o Juiz Substituto em Segundo Grau Espedito Reis do Amaral.

Curitiba, 04 de agosto de 2009.


DIMAS ORTÊNCIO DE MELO
Relator


1 VENOSA, Silvio de Sálvio. Op. Cit., p. 284.
2 O salário mínimo vigente na época da propositura da ação (2007) era de R$ 380,00, nos termos da Lei n. 11.498/2007.