Reexame necessário
REEXAME NECESSÁRIO N° 532049-4
COMARCA DE MARINGÁ - 4ª VARA CÍVEL
REMETENTE: JUIZ DE DIREITO
AUTOR: HERMOGENES BOTTI
RÉUS: RICARDO JOSÉ MAGALHÃES BARROS, LUIZ TURCHIARI JÚNIOR, SOTECOL - SOCIEDADE TÉCNICA DE COLETA DE LIXO LTDA. E MUNICÍPIO DE MARINGÁ
RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA
REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO POPULAR. ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADES NA EXECUÇÃO DO CONTRATO DE COLETA DE LIXO E VARRIÇÃO DAS VIAS PÚBLICAS DO MUNICÍPIO DE MARINGÁ, PELA EMPRESA CONTRATADA MEDIANTE PROCESSO LICITATÓRIO. ALEGADA LESIVIDADE AO ERÁRIO PÚBLICO, REPRESENTADA PELA COBRANÇA DE PREÇOS ELEVADOS PELA EMPRESA CONTRATADA.
1. DO AGRAVO RETIDO. DECISÃO QUE DECLAROU A PRECLUSÃO DA PROVA PERICIAL CONTÁBIL PELA AUSÊNCIA DE ADIANTAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. AGRAVO CONHECIDO. REEXAME NECESSÁRIO QUE COMPORTA A APRECIAÇÃO DE AGRAVO RETIDO INTERPOSTO PELA FAZENDA PÚBLICA, AINDA QUE NÃO REITERADO EXPRESSAMENTE PELAS PARTES. AÇÃO POPULAR. ADIANTAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. DESCABIMENTO. PAGAMENTO AO FINAL DA DEMANDA PELO VENCIDO. AGRAVO QUE, CONTUDO, PERDEU O OBJETO, EM RAZÃO DO RECONHECIMENTO EXPRESSO DO AUTOR PELA IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO POPULAR, MANIFESTADO EM ALEGAÇÕES FINAIS. AGRAVO RETIDO PREJUDICADO.
2. AÇÃO POPULAR. ILEGALIDADE DO ATO E LESIVIDADE AO ERÁRIO PÚBLICO NÃO CONFIGURADAS. AUTOR POPULAR ORIGINÁRIO QUE DESISTIU DA AÇÃO, SOB O FUNDAMENTO DE QUE AS CONTAS DO MUNICÍPIO REFERENTE AO EXERCÍCIO FINANCEIRO EM QUE OS ALEGADOS ATOS FORAM PRATICADOS TERIAM SIDO APROVADAS PELO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO. POLO ATIVO ASSUMIDO POR NOVO AUTOR POPULAR. INSTRUÇÃO PROBATÓRIA DEFICITÁRIA. ÔNUS DA PROVA QUE COMPETIA AO AUTOR DA AÇÃO, DO QUAL NÃO SE DESINCUMBIU A CONTENTO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 333, INCISO I DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUTOR, ADEMAIS, QUE SE CONVENCEU DA INEXISTÊNCIA DE PROVAS DOS FATOS ALEGADOS, RECONHECENDO EXPRESSAMENTE A IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO POPULAR. SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO.
AGRAVO RETIDO PREJUDICADO. SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Reexame Necessário nº 532049-4, sendo remetente o Juízo Direito, em que é Autor Hermógenes Botti e Réus Ricardo Magalhães Barros, Luiz Turchiari, Sotecol Sociedade Técnica de Coleta de Lixo Ltda.
Tratam estes autos de Reexame Necessário da sentença proferida às fls.1074/1088, nos autos n.º 0067/1994 de Ação Popular proposta inicialmente por Gelson Nery Nascimento contra Ricardo José Magalhães Barros e Outros, sendo admitido no polo ativo dos autos Hermógenes Botti, que deu prosseguimento à ação, que julgou improcedente a ação, em razão da falta de provas.
Consta da inicial da ação popular (fls.02/12) que a Administração Municipal denunciou perante a Câmara de Vereadores as irregularidades havidas na execução do contrato de coleta de lixo e varrição das vias públicas realizado com a Sotecol, e que a insurgência da administração contra as irregularidades provocou ação judicial da ré Sotecol contra o Município de Maringá. Nesta ação, o Município apresentou defesa e reconvenção; apesar disso, a discussão restou centrada apenas nas irregularidades da execução do contrato, havendo ilegalidade do próprio contrato.
O autor da ação sustentou, ainda, que a primeira observação a ser feita está na deliberação da administração anterior de privatizar a coleta de lixo e varrição de vias públicas. Para isso, disse demonstrar-se evidente fictícia mutação da realidade. Expõe, a seguir, que passou a se incutir na população a conveniência da privatização desses serviços e que matérias foram veiculadas pela imprensa, sugerindo implicitamente, diante dos problemas abordados, a gestão privada como a solução adequada.
Na sequência, alega que a repreensão pretendia com a ação popular é contra a artificialidade dos problemas cujo surgimento foi adredemente preparado e que apenas isso pode explicar o repentino descalabro em que se tornaram esses serviços, tão logo assumiu a administração pretérita os destinos do Município de Maringá. Alega que ocorreu no caso o que popularmente se convencionou denominar de “sucateamento”, prática muito disseminada pelo País e obtida à aquiescência tácita ou pela inércia da população, para a terceirização dos serviços de limpeza pública, iniciando-se neste ponto a materialização da nulidade apontada.
Destacou, ainda, que a lesividade desse ato à Administração Municipal está configurada nos preços excessivos cobrados e recebidos pela empresa Sotecol, o que culminou na prática de atos imorais e lesivos ao erário público, estando demonstrado então o interesse na propositura da ação. Descreve, em seguida, o Edital nº 022/90, apontando os itens quanto ao objeto da licitação, da proposta técnica e do julgamento, afirmando que a empresa Sotecol Ltda. foi classificada em primeiro lugar e que, à época dos fatos, o Decreto n.º 2300/86, artigo 3º, disciplinava o procedimento licitatório. Sustenta que não foi previsto qualquer critério para a concessão da pontuação deferida às empresas, restando evidenciada a nulidade do procedimento licitatório e, por conseqüência, do contrato e do aditivo firmado com a empresa Sotecol.
Ao final, pleiteou a procedência da ação com a declaração de nulidade do processo licitatório, do contrato e aditivos contratuais firmados com a empresa classificada, bem como dos pagamentos a ela realizados e, via de conseqüência, a condenação dos réus em perdas e danos.
Com a inicial foram juntados os documentos de fls.13/14.
Foram juntadas cópias das conclusões das sindicâncias realizadas às fls.16/22.
Ainda restaram juntados os documentos constantes de fls.23/129.
A empresa Sotecol - Sociedade Técnica de Coleta de Lixo Ltda apresentou resposta em fls.139/146, alegando preliminarmente a inépcia da inicial, pois não tem objeto e nem causa de pedir. Ainda, que a própria municipalidade encontra-se no pólo passivo da ação, o que torna o pedido impossível. Argüiu preliminar de litispendência, pois já pende ação perante a 3ª Vara de Maringá, em que os contratantes litigam sobre os mesmos direitos. No mérito, aduz que conforme o item 11.3 do edital, a licitação seguiu critérios objetivos para atribuição de notas, não havendo qualquer ilegalidade. Requereu a improcedência da ação.
O réu Ricardo José Magalhães Barros contestou a ação às fls. 149/155, assegurando que a ação popular tem fim estritamente “eleitoreiro”. Destacou que à época dos fatos, o prefeito de então, Said Ferreira, compareceu à Câmara Municipal para apresentar o resultado das auditorias e sindicâncias que realizara na Prefeitura, as quais tratavam da administração anterior e afirmavam a existência de um prejuízo de 35 milhões de dólares. Disse que nos dias seguintes o citado prefeito fez publicar manchetes em detrimento da imagem da administração do réu Ricardo Barros, sendo que este, então, passou a esperar por ações judiciais que aquele prefeito disse estar a providenciar. Alegou que somente passados quase dois anos houve a distribuição de 12 ações populares, entre elas a presente, as quais não foram instruídas com qualquer documento probatório e cujos autores são filiados ao Partido do citado Prefeito Said Ferreira. Pediu a improcedência da ação. Com a defesa, vieram os documentos de fls. 157/174.
Luiz Turchiari Junior, que integrou a Administração Municipal, afirmou que o conteúdo da inicial refere-se exclusivamente as imperfeições que determinariam a nulidade da licitação.
Por sua vez, Akito Willy Taguchi apresentou contestação às fls. 181/185, dizendo que o mérito da ação estava baseado na ilegalidade do contrato firmado entre o Município e a Socotel, e que a privatização da execução dos serviços de coleta de lixo e varrição eram realmente necessários, na medida em que os equipamentos estavam sucateados.
O Município de Maringá manifestou-se nos autos às fls. 188/196, assumindo o polo ativo da ação, ratificando os termos da petição inicial, além de discorrer sobre os princípios que regem a atividade da Administração Pública e, ao final, concluir que a hipótese aventada nestes autos de processo evidencia caso de infringência dos princípios que regem o procedimento licitatório, entre eles o da impessoalidade, igualdade, publicidade, motivação, objetividade, vinculação ao edital, probidade e moralidade. Em razão dessa argumentação sustenta que a licitação em comento deve ser declarada nula, uma vez que consubstanciou em ato ilegal e lesivo ao patrimônio público. Pugnou, assim, pela sua admissão no polo ativo da ação popular e a decretação de nulidade da licitação convocada pelo Edital n.º 22/90-DML-AS, referente à limpeza pública, com a condenação dos réus à devolução do que receberam ilegalmente. Foram juntados os documentos de fls.198/680.
O autor da ação refutou os termos das defesas apresentadas, formulado pedido de produção de provas consistentes em perícia técnica, prova testemunhal, depoimento pessoal das partes e oitiva de testemunhas. O Município de Maringá, também requereu a produção de prova pericial, tomada de depoimentos pessoais e prova testemunhal.
Posteriormente, à fl. 701 Gelson Nery Nascimento requereu a desistência da presente ação, tendo em vista que o Tribunal de Contas do Município não encontrou nada de irregular nas contas da administração do ex-prefeito Ricardo Barros.
Hermógenes Botti, alegando os princípios da economia e celeridade processual, requereu sua admissão nos autos para promover o seguimento da ação, sendo deferido o pedido por meio do despacho de fls.744.
Pelo despacho de fl. 772 foi deferida a produção de provas testemunhal e pericial, sendo que para esta foi nomeado perito e apresentados quesitos e assistentes técnicos pelas partes. Pela petição de fl. 814 o Município discordou do valor dos honorários apresentados pelo perito.
À fl. 919 o Juiz singular despachou dando por preclusa a prova pericial, porque não custeada a tempo pela parte a quem competia o ônus, decisão esta que foi objeto de agravo de instrumento interposto pelo réu Ricardo Barros (fls. 923/933), ao qual esta Corte negou seguimento por ausência de interesse recursal (fls. 945/948 e 964/967).
Em seguida, às fls. 972/986 o Município de Maringá interpôs Agravo de Instrumento contra a mesma decisão que declarou a preclusão da produção de prova pericial, o qual foi convertido em agravo retido, com fulcro no artigo 527, Inciso II do Código de Processo Civil (decisão de fl. 1006).
Em audiência de instrução e julgamento (fls.1020) foi ouvida uma testemunha (depoimento de fl. 1025), sendo marcada nova data para oitiva de outras testemunhas. Em nova audiência de instrução (Termo de fls.1030) foram tomados mais dois depoimentos (fls. 1031 e 1032) e, então, encerrada a instrução.
Em alegações finais de fls. 1033/1036 o autor da ação requereu fosse extinto o presente feito com julgamento de mérito, reconhecendo a improcedência do pedido feito com a inicial em razão de que a demanda ter perdido o objeto em uma parte e que as demais questões restaram improcedentes.
Às fls.1037/1038 constam as alegações do Município de Maringá informando que já transacionou com a empresa Sotecol e que não há mais nada a questionar quanto ao contrato.
Às fls.1039/1042, acham-se as alegações finais de Luiz Turchiari Júnior e às fls.1043/1045, estão as alegações finais da empresa Sotecol, pugnando pela improcedência da ação popular. As alegações de Ricardo José Magalhãoes Barros acham-se às fls.1048/1050, pedindo a improcedência da ação.
O representante do Ministério Público de 1º grau emitiu o parecer de fls.1051/1065, opinando pelo indeferimento da inicial, bem como em razão da falta de outras provas, opinou pela improcedência da ação proposta.
Sobreveio assim a sentença (fls.1074/1088), que julgou improcedente o pedido formulado na ação popular, sob o fundamento de que não restaram evidenciadas a ilegalidade e a lesividade ao patrimônio público.
Não houve a interposição de recursos voluntários, e os autos subiram para o necessário reexame.
A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se em fls.1102/1105 pelo conhecimento e desprovimento do necessário exame.
É o relatório.
Voto.
O fundamento do Reexame Necessário, em sede de Ação Popular, encontra-se positivado no artigo 19 da Lei 4.717/65.
Agravo Retido:
De início cumpre analisar o agravo retido interposto pelo Município de Maringá, às fls. 972/986 (originalmente agravo de instrumento convertido em retido por este Tribunal, pela decisão de fl. 1.006), contra a decisão do Juiz singular que declarou a preclusão da produção da prova pericial, porque não custeada, a tempo, pela parte a quem competia o ônus (decisão de fl. 919).
O agravo deve ser conhecido, porquanto ainda que se trate de remessa ex officio, cumpre verificar que, no caso, o agravo retido foi interposto pela Fazenda Pública. Sendo assim, não se fazia necessária a sua reiteração pelas partes, eis que a remessa ex officio abrangerá a questão, podendo o Tribunal apreciar tanto a sentença como a decisão que houvera sido impugnada pelo agravo retido.
No caso dos autos a produção de prova pericial foi requerida por ambas as partes, e por diversas vezes reiterado. O autor requereu o rateamento entre as partes dos respectivos honorários periciais; o réu disse não competir a ele o pagamento; enquanto que o Município, ora Agravante, manifestou sua indisponibilidade financeira de arcar com tais despesas processuais (fl. 814).
Diante desse impasse das partes, o juiz entendeu por bem em declarar a preclusão da produção da prova por falta de pagamento dos respectivos.
Não agiu com acerto naquela oportunidade o julgador singular.
Isso porque o artigo 5.º, Inciso LXXIII da Constituição Federal e o artigo 10 da Lei 4.717/65 isentam as partes da ação popular do adiantamento de custas processuais - entre elas os honorários periciais - as quais deverão ser pagas a final da lide.
Em razão disso, o pagamento do perito deve se feito ao final do processo pela parte vencida, sob pena de cerceamento de defesa.
É esse o entendimento reiterado da jurisprudência, a exemplo dos seguintes julgados esta Corte:
Agravo de instrumento. Ação popular. Indeferimento de prova pericial. Cerceamento de defesa. Ocorrência. Pagamento dos honorários periciais ao final. Alternativamente, perícia bancada pelo estado do Paraná. Havendo questão de fato a ser elucidada, o indeferimento de pedido de prova pericial requerida Ministério Público, com o argumento de que esta instituição não dispõe de verba para o custeio da prova, importa em cerceamento de defesa. O pagamento dos honorários periciais deverá ocorrer ao final da demanda ou, caso nenhum perito aceite essa condição, ser feito pelo Estado do Paraná, ou, ainda, a prova ser efetivada por órgão oficial. (TJPR - Ac. 24936 - Ag Instr 1.0167508-9 - 2.ª CCv - Rel. Pericles Bellusci de Batista Pereira - DJPR 6873 de 20/05/2005)
PROCESSO CIVIL. AÇÃO POPULAR. ADIANTAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. DESCABIMENTO. PAGAMENTO AO FINAL DA DEMANDA PELO VENCIDO.1.Em ação popular é vedado o adiantamento dos honorários periciais, devendo o pagamento ser feito ao final do processo pela parte vencida. Incidência do artigo 7º, LXXIII da Lei Fundamental e artigo 10 da Lei nº 4.717/65.2.Caso o perito não concorde em receber seus honorários somente ao final do processo, deverá ser “requisitada a realização da perícia perante ente público responsável pelo custeio daquela”(acórdão nº 10457, 6ª Câmara Cível, rel. Des. Noronha). (TJPR - Ac. 25415 - Ag Instr 1.0172546-2 - 1.ª CCv - Rel. Ulysses Lopes - DJPR 6873 de 20/05/2005)
Assim, de fato, a situação posta a lume não comportava a declaração de preclusão da prova pericial, pois esta deveria ser realizada independentemente de pagamento dos honorários, os quais seriam adimplidos a final.
Entrementes, no caso dos autos o agravo retido - que tinha por finalidade buscar a reforma da decisão agravada para que fosse produzida a prova pericial requerida - perdeu o objeto, o que se conclui diante da manifestação expressa do autor popular, que nas suas alegações finais quando se manifestou pela inocorrência de ato ilegal e lesivo inicialmente apontado na ação proposta e acabou reconhecendo a improcedência da ação popular (fls. 1033/1036), sendo seguido no mesmo sentido pelo Município Agravante (fls. 1037/1038) e pelos outros réus da ação.
Deste modo, o agravo retido restou prejudicado, diante da perda do objeto, pois não haveria mais necessidade de se produzir a prova pericial técnica requerida anteriormente para corroborar a argumentação da Fazenda Pública.
Do reexame necessário:
Cuida-se de Reexame Necessário de sentença proferida nos autos de Ação Popular sob n.º 0067/1994 que julgou improcedente a ação movida inicialmente por Gelson Nery Nascimento contra Ricardo José Magalhães Barros e Outros, sendo admitido no polo ativo dos autos Hermógenes Botti, que deu prosseguimento à ação.
Extrai-se dos autos que em fevereiro de 1994 Gelson Nery Nascimento ajuizou a presente ação popular contra Ricardo José Magalhães Barros, Akito Willy Taguchi, Luiz Turchiari Júnior, Sotecol - Sociedade Técnica de Coleta de Lixo e o Município de Maringá pretendendo apurar irregularidades supostamente havidas na execução do contrato de coleta de lixo e varrição das vias públicas realizada com a ré Sotecol, bem como a condenação dos responsáveis em perdas e danos sofridos pelo erário público.
Para tanto, o autor aduziu, em síntese, que a lesividade deste ato está materializado nos elevados preços cobrados e recebidos pela Sotecol, em prejuízo da administração municipal, o que implicou na prática de atos imorais e lesivos ao patrimônio público, que devem ser ressarcidos.
Os réus, por sua vez, negam todas as acusações, aduzindo que a licitação seguiu os procedimentos corretos, assim como o respectivo contrato, concluindo que a ação popular foi ajuizada com fim estritamente “eleitoreiro”, por rival político do primeiro réu, Ricardo José Magalhães Barros.
Pois bem.
A ação popular é garantida constitucionalmente pelo artigo 5.º, Inciso LXXIII da Carta Magna e regulada pela Lei 4.717/65, e seu conceito, nas palavras do mestre Hely Lopes MEIRELLES1, corresponde ao “meio constitucional posto à disposição de qualquer cidadão para obter a invalidação de atos ou contratos administrativos - ou a estes equiparados - ilegais e lesivos ao patrimônio federal, estadual e municipal, ou de suas autarquias, entidades paraestatais e pessoas jurídicas subvencionadas com dinheiro público.”
E prossegue o administrativista2:
“E um instrumento de defesa dos interesses da coletividade, utilizável por qualquer de seus membros. Por ela não se amparam direitos individuais próprios, mas sim interesses da comunidade. O beneficiário direto e imediato desta ação é o autor; é o povo, titular do direito subjetivo ao governo honesto. O cidadão a promove em nome da coletividade, no uso de uma prerrogativa cívica que a Constituição da República lhe outorga.
(...)
Entretanto, a ação popular vem sendo desvirtuada e utilizada como meio de oposição política de uma Administração a outra, o que exige do Judiciário redobrada prudência no seu julgamento, para que não a transforme em instrumento de vindita partidária, nem impeça a realização de obras e serviços públicos essenciais à comunidade que ela visa a proteger”.
Assim, a ação popular tem por escopo a anulação de ato lesivo ao patrimônio público. Para tanto, se faz, porém, indispensável a presença dos elementos ilegalidade do ato e lesividade ao erário, para que possam legitimar referida ação.
É este o entendimento exarado pela doutrina, conforme lição de Rodolfo de Camargo MANCUSO3:
“(...) nos casos mais ocorrentes continuará sendo necessário que a causa de pedir na ação popular invoque o binômio ilegalidade-lesividade, mormente nos casos onde a procedência da ação (ou a concessão da liminar - Lei 4.717/65, § 4.º do art. 5.º) venham a ter reflexos relevantíssimos na administração pública, como se dá quando existe obra vultuosa em andamento, cuja paralisação não raro se revela ainda mais danosa ao patrimônio público do que a própria finalização do ato sindicado”.
Sobre o ato lesivo, a obra do já citado Hely Lopes MEIRELLES4 enfatiza que “na conceituação atual, lesivo é o ato ou omissão administrativa que desfalca o erário ou prejudica a Administração, assim como o que ofende bens ou valores artísticos, cívicos, culturais, ambientais ou históricos da comunidade. E essa lesão tanto pode ser efetiva quanto legalmente presumida, visto que a lei regulamentar estabelece casos de presunção de lesividade (art. 4.º), para os quais basta a prova da prática do ato naquelas circunstâncias, para considerar-se lesivo e nulo de pleno direito (STF, RTJ 103/683). Nos demais casos impõe-se a dupla demonstração de ilegalidade e da lesão efetiva ao patrimônio protegível pela ação popular. Sem estes três requisitos - condição de eleitor, ilegalidade e lesividade - que constituem os pressupostos da demanda, não se viabiliza a ação popular.”
Vislumbra-se, assim, que para a ação popular se faz imprescindível a presença, dentre outros elementos, os da ilegalidade do ato praticado e da lesividade ao patrimônio público.
No caso dos autos, repita-se, a pretensão inicial indicava a existência de ato ilegal e lesivo caracterizado pela execução do contrato de coleta de lixo e varrição das vias públicas realizada com a ré Sotecol, o qual foi levado a efeito após licitação. A ilegalidade, segundo o autor, estaria representada pelo favorecimento da empresa requerida e vencedora da licitação (Sotecol), por ocasião da quesitação técnica, a qual teria ocorrido sem critérios; enquanto que a lesividade ao erário público estava caracterizada pelo excesso de valores pagos pela municipalidade à empresa contratada.
Sucede que o cotejo das alegações iniciais do autor (causa de pedir) com as provas trazidas aos autos não permite concluir pela presença desses requisitos essenciais, que pudessem levar à procedência da ação.
Com a inicial o autor não juntou qualquer documento que pudesse comprovar os fatos alegados, requerendo, por isso, produção de prova oral e pericial.
No curso do processo o autor originário da ação popular, Gelson Nery Nascimento, em petição de fl. 701 desistiu da ação, fundamentado na aprovação das contas do Município, referente ao exercício financeiro, em que foi praticado o ato impugnado (1992), pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná, conforme consta da cópia do parecer de fl. 702.
Não obstante a informação trazida pelo autor desistente da ação, assumiu o seu polo ativo o Sr. Hermógenes Botti pretendendo o prosseguimento do feito. Assim, na sequência, foi deferida a produção de prova pericial contábil para apurar supostas irregularidades e lesividade ao erário público.
Ocorre que as partes divergiram com relação ao pagamento dos honorários periciais - o réu dizendo que a ele não cabia o pagamento (fl. 794 e 874), o Município atestando sua impossibilidade para o respectivo pagamento (fl. 814) e o autor pleiteando o seu rateio entre as partes (fl. 820) - o que culminou com a declaração de preclusão de tal prova, pelo despacho de fl. 919, diante da falta de pagamento dos honorários periciais arbitrados para tanto. Contra tal decisão se insurgiram as partes através de agravo de instrumento, sendo que ao recurso do réu qual foi negado seguimento (fls. 945/948) e o do Município de Maringá foi convertido em agravo retido (fl. 1006), já apreciado em item próprio deste voto.
A prova oral produzida tampouco trouxe a lume a tese dos Autores. A testemunha Eduardo Augusto Giannini, cujo depoimento consta da fl. 1025, afirmou que o certame objeto da presente lide que teve como vencedora a empresa ré (Sotecol) “seguiu os parâmetros do estabelecidos no item 9.2 e 11.3 do edital de licitação”, não trazendo qualquer assertiva que pudesse demonstra eventual irregularidade no processo licitatório ou no contrato firmado entre o Município e a empresa ré.
As outras duas testemunhas ouvidas conforme termos de fls. 1031 e 1032 nada souberam afirmar sobre os detalhes da licitação em comento, nem sobre a classificação da ré Sotecol, nem sobre o contrato ou o acordo firmado entre as partes.
De igual modo, nenhuma outra prova há nos autos que possa sustentar a tese de ato ilegal e lesivo ao patrimônio público municipal, como alegado na inicial.
Com efeito, diante da negativa da parte ré sobre as alegações iniciais o ônus da prova acerca da ilegalidade e lesividade do ato apontado pertencia exclusivamente aos autores, a teor do que dispõe o artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil, ônus do qual, contudo, não se desincumbiram.
Em comentário a citado dispositivo Vicente GRECO FILHO5 leciona:
“O autor, na inicial, afirma certos fatos porque deles pretende determinada conseqüência de direito; esses são os fatos constitutivos que lhe incumbe provar sob pena de perder a demanda.
A dúvida ou insuficiência de prova quanto a fato constitutivo milita contra o autor.
O juiz julgará o pedido improcedente se o autor não provar suficientemente o fato constitutivo de seu direito.”
Ainda sobre o ônus da prova vale destacar os ensinamentos de ARRUDA ALVIM6:
“De um modo geral, podemos dizer que, recaindo sobre uma das partes o ônus de prova relativamente a tais e quais fatos, não cumprindo esse ônus e inexistindo nos autos quaisquer outros elementos, pressupor-se-á um estado de fato contrário a essa parte. Assim, quem devia provar e não o fez perderá a demanda.
Assim, tendo o réu negado a autoridade do fato do qual nasceria sua obrigação, incumbe ao autor o ônus da prova, sob pena de absolvição do réu.”
E o já citado autor Rodolfo de Camargo MANCUSO7 em sua obra especifica sobre a ação popular, destaca:
“No plano substancial, onde incidirá, propriamente, a decisão sobre o mérito da controvérsia, deve o autor popular desincumbir-se do ônus de provar o ‘fato constitututivo’ de sua pretensão (CPC. Art. 333, I). Não lhe bastará alongar-se acerca das conotações jurídicas da lide: as regras ‘da mihi factum dabo tibi jus’ e ‘jura novit curia’, indicam que a tarefa do autor é relatar com precisão os fatos, sobrelebando-lhes todos os aspectos mais importantes e, principalmente, calçando-lhes desde logo com as provas documentais de que dispuser; ao depois cuidará de atribuir-lhes a conseqüência jurídica que entenda pertinente. Esta segunda parte não se afigura tão importante quanto aquela primeira, até porque, excluídas as vedações quanto à prolação da sentença ‘fora da lide’ (CPC, art. 460), é possível que o juiz dê pela procedência da ação, mas por fundamento jurídico ‘outro’ que não o acenado pelo autor, já que o magistrado forma livremente sua convicção (CPC, art. 131).”
E mais adiante pondera o mesmo autor8:
“Naturalmente, tudo o que antes se disse sobre a massa probatória na ação popular tem como pressuposto lógico o sistema de distribuição do ônus da prova, cuja finalidade é a de facilitar a tarefa do julgador (‘regras de julgamento’), quando se depare com um caso de insuficiência de prova, já que, obviamente, quando a prova a favor do autor (tese) ou do réu (antítese) for consistente, a ação será julgada procedente no primeiro caso e improcedente no segundo. Nos demais casos, terá muita importância o critério estabelecido no art. 333, I, do CPC, que carreia ao autor o ônus de provar o ‘fato constitutivo’ de sua pretensão (cf. também art. 282, VI), e, para o réu, a prova das exceções, objeções e defesas diretas e indiretas, ou seja, dos fatos modificativos, extintivos ou impeditivos (art. 333, II): ‘reus ins exceptio fit actor’.
Nesse sentido é pautada a jurisprudência em casos análogos ao dos autos, como se destaca dos seguintes julgados desta Corte:
REEXAME NECESSÁRIO - AÇÃO POPULAR - ALEGAÇÕES DE QUE OBRAS MUNICIPAIS TERIAM CAUSADO DANOS AO PATRIMÔNIO, MEIO AMBIENTE E BEM PÚBLICO DA CIDADE - ILEGALIDADE E LESIVIDADE NÃO COMPROVADAS - ÔNUS DA PROVA - INCUMBÊNCIA AO AUTOR - SENTENÇA MANTIDA EM GRAU DE REEXAME NECESSÁRIO. (TJPR - Ac. 30205 - Reex Nec 0412422-5 - 4.ª CCv - Rel. Regina Afonso Portes - DJPR 7582 de 28/03/2008)
APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO POPULAR. ISENÇÃO DE CUSTAS E ÔNUS SUCUMBENCIAIS. AUSÊNCIA DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEL. CONSTRUÇÃO DE GINÁSIO DE ESPORTES. LESIVIDADE E ILEGALIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. 1. A sentença que repele pretensão deduzida em ação popular, por força de lei, está sujeita ao reexame necessário. 2. Diante do reconhecimento que não houve má-fé no ajuizamento desta ação popular fica a apelante isenta do pagamento das custas processuais e do ônus da sucumbência. Inteligência do inciso LXXIII do artigo 5º da CF. 3. Para a viabilidade da ação popular necessário a presença de três pressupostos, quais sejam, a condição de eleitor do sujeito ativo, ilegalidade ou ilegitimidade do ato a invalidar e dano ao erário público. 4. O fato de a Constituição Federal de 1988 ter alargado as hipóteses de cabimento da ação popular não tem o efeito de eximir o autor de comprovar a lesividade do ato, mesmo em se tratando de lesão à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimônio histórico e cultural. 5. Não logrando êxito em demonstrar a presença dos pressupostos de ilegalidade ou ilegitimidade do ato a invalidar e dano ao erário público, a pretensão deduzida não tem condições de prosperar, mesmo porque não se desincumbiu do ônus probatório que lhe cabia. Apelação desprovida. Sentença reformada parcialmente em sede de Reexame Necessário. (TJPR - Ac. 21309 - ApCvReex 0421526-7 - 5.ª CCv - Rel. Rosene Arão de Cristo Pereira - DJPR 7664 de 25/07/2008)
REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO POPULAR CONTRA ATO DO PREFEITO. DESTRUIÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS REALIZADAS NA GESTÃO ANTERIOR. ÔNUS DA PROVA A CARGO DO AUTOR. EXEGESE DO ARTIGO 333, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ILEGALIDADE DO ATO E LESIVIDADE AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. PRETENSÃO NÃO ACOLHIDA. SENTENÇA CONFIRMADA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO. A ação popular exige para a procedência do pedido nela formulado, dentre outros requisitos, a comprovação da ilegalidade do ato praticado e da lesividade ao patrimônio público, cujo ônus probatório incumbe ao autor. (TJPR - Ac. 28714 - Reex Nec 0415318-8 - 4.ª CCv - Rel. Abraham Lincoln Calixto - DJPR de 7460 de 28/09/2007)
APELAÇÃO CÍVEL. AUSÊNCIA DE ATAQUE DA SENTENÇA RECORRIDA NAS RAZÕES RECURSAIS. REPRODUÇÃO DOS ARGUMENTOS ANTERIORMENTE ARTICULADOS. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 514, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO NÃO CONHECIDO. O recurso de apelação não pode ser conhecido, tendo em vista que as razões recursais deixaram de atacar a decisão monocrática, repetindo apenas os argumentos expostos em momento anterior. REEXAME NECESSÁRIO - CONHECIMENTO DE OFÍCIO - AÇÃO POPULAR - ALEGAÇÃO DE MÁ EXECUÇÃO DE OBRAS DE PAVIMENTAÇÃO URBANA - AUSÊNCIA DE PROVA PERICIAL - IMPRESCINDIBILIDADE - PEDIDO IMPROCEDENTE - PRELIMINARES AFASTADAS - SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO. As preliminares de ilegitimidade passiva e carência de ação por falta de interesse de agir foram corretamente afastadas. A prova pericial é fundamental para a apuração de eventual má execução de obras de pavimentação urbana, sendo que a sua não produção impede a procedência do pedido, vez que o autor não comprovou o fato constitutivo de seu direito (art. 333, inciso I, do Código de Processo Civil). (TJPR - Ac. 18000 - Ap Cível 0402132-3 - 5.ª CCv - Rel. Luiz Mateus de Lima - DJPR 7416 de 27/07/2007)
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO POPULAR - ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE DA LEI MUNICIPAL QUE INSTITUIU PROGRAMA DE INCENTIVO AO ESPORTE AMADOR NO MUNICÍPIO DE MARINGÁ - ÔNUS DA PROVA - ART. 333, I, DO CPC - ILEGALIDADE/LESIVIDADE DO ATO NÃO COMPROVADAS - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. A anulação de atos lesivos ao patrimônio público, por meio da ação popular, carece da constatação da ilegalidade ou da irregularidade do ato e dos prejuízos causados ao patrimônio público. O ônus da prova dos fatos constitutivos de seu direito é do autor, nos termos do art. 333, I, do CPC. Não estando comprovada a suposta ilegalidade, nem a lesividade alegada, não há como se anular os atos da autoridade administrativa. (TJPR - Ac. 17259 - Ap. Cível 0314378-8 - 5.ª CCv - Rel. Francisco Luiz Macedo Junior - DJPR 7348 de 20/04/2007)
Corrobora com a ausência de prova acerca dos requisitos da ação popular o fato de, reprise-se, o próprio autor originário ter desistido da ação em razão da aprovação das contas pelo Tribunal de Contas do Município do exercício financeiro em que teria ocorrido os fatos deduzidos na inicial, o que demonstraria a ausência de prejuízo ao erário público.
Cumpre destacar, ainda - não fosse a evidente ausência de prova - que o autor popular sucessor do originário, Sr. Hermógenes Botti em suas alegações finais trazidas às fls. 1033/1036, expressamente mencionou que a motivação da ação principal relativa ao prejuízo que o contrato firmado com a empresa Sotecol teria trazido ao erário público (diferença entre o valor da licitação e o valor contratado) já teria sido objeto de transação entre as partes (Sotecol e Município), com a dedução de eventual prejuízo, o que motivou, inclusive, a conclusão do próprio autor pela inocência do Requerido neste pedido e pela conseqüente improcedência dos pedidos.
Da mesma forma, o Município autor, também em alegações finais (fls. 1037/1038) afirmou que foram utilizados critérios objetivos por ocasião da licitação, estando ausente qualquer ilegalidade ou irregularidade no ato, bem como que eventual prejuízo causado foi suprido com o acordo firmado entre as partes (fls. 865/871), pelo que disse não ter nada mais a questionar quanto a referido contrato.
Assim, os próprios autores reconhecem que não restou evidenciado nos autos os fatos constitutivos de seu direito acerca da irregularidade do ato e conseqüente lesividade ao patrimônio público, requisitos estes exigidos de forma cumulativa para a procedência da ação popular.
Outrossim, essa foi também a conclusão do Ministério Público, tanto em primeiro grau como em segundo grau, que se convenceu pela inexistência de provas, manifestando-se pela improcedência do pedido e manutenção da sentença em grau de reexame.
Diante disso, não tendo os autores se desincumbido do ônus de provar a ocorrência dos fatos narrados na inicial, fornecendo as provas necessárias para a análise dos atos impugnados, nos termos do artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil, mas, ao contrário, tendo eles se convencido expressamente da inocorrência de prática de ato ilegal e lesivo ao patrimônio público, impõe-se a improcedência dos pedidos, pelo que deve ser mantida na íntegra a sentença ora em reexame.
Ante o exposto, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em declarar prejudicado do agravo retido e manter a sentença em grau de reexame necessário, nos termos do voto da Relatora.
Presidiu o julgamento a Desembargadora Regina Afonso Portes, sem voto, tendo dele participado a Desembargadora Lélia Samardã Giacomet e a Juíza Substituta em Segundo Grau Vânia Maria da S. Kramer.
Curitiba, 07 de julho de 2009.
MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA
Desembargadora Relatora
1 MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança..., 31.ª ed. - São Paulo : Malheiros, 2008, p. 126-127.
2 Ob. cit., p. 127.
3 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Popular, 6.ª ed. - São Paulo : RT, 2008, p. 125.
4 Ob. cit., p. 129.
5 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro, 13.ª ed. - São Paulo : Saraiva, 1999, p. 189
6 ALVIM, Arruda. Manual de Direito Processual Civil, vol. 2, 12.ª ed. - São Paulo : RT, 2008, p. 505.
7 Ob. cit., p. 302.
8 Ob. cit., p. 306
COMARCA DE MARINGÁ - 4ª VARA CÍVEL
REMETENTE: JUIZ DE DIREITO
AUTOR: HERMOGENES BOTTI
RÉUS: RICARDO JOSÉ MAGALHÃES BARROS, LUIZ TURCHIARI JÚNIOR, SOTECOL - SOCIEDADE TÉCNICA DE COLETA DE LIXO LTDA. E MUNICÍPIO DE MARINGÁ
RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA
REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO POPULAR. ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADES NA EXECUÇÃO DO CONTRATO DE COLETA DE LIXO E VARRIÇÃO DAS VIAS PÚBLICAS DO MUNICÍPIO DE MARINGÁ, PELA EMPRESA CONTRATADA MEDIANTE PROCESSO LICITATÓRIO. ALEGADA LESIVIDADE AO ERÁRIO PÚBLICO, REPRESENTADA PELA COBRANÇA DE PREÇOS ELEVADOS PELA EMPRESA CONTRATADA.
1. DO AGRAVO RETIDO. DECISÃO QUE DECLAROU A PRECLUSÃO DA PROVA PERICIAL CONTÁBIL PELA AUSÊNCIA DE ADIANTAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. AGRAVO CONHECIDO. REEXAME NECESSÁRIO QUE COMPORTA A APRECIAÇÃO DE AGRAVO RETIDO INTERPOSTO PELA FAZENDA PÚBLICA, AINDA QUE NÃO REITERADO EXPRESSAMENTE PELAS PARTES. AÇÃO POPULAR. ADIANTAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. DESCABIMENTO. PAGAMENTO AO FINAL DA DEMANDA PELO VENCIDO. AGRAVO QUE, CONTUDO, PERDEU O OBJETO, EM RAZÃO DO RECONHECIMENTO EXPRESSO DO AUTOR PELA IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO POPULAR, MANIFESTADO EM ALEGAÇÕES FINAIS. AGRAVO RETIDO PREJUDICADO.
2. AÇÃO POPULAR. ILEGALIDADE DO ATO E LESIVIDADE AO ERÁRIO PÚBLICO NÃO CONFIGURADAS. AUTOR POPULAR ORIGINÁRIO QUE DESISTIU DA AÇÃO, SOB O FUNDAMENTO DE QUE AS CONTAS DO MUNICÍPIO REFERENTE AO EXERCÍCIO FINANCEIRO EM QUE OS ALEGADOS ATOS FORAM PRATICADOS TERIAM SIDO APROVADAS PELO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO. POLO ATIVO ASSUMIDO POR NOVO AUTOR POPULAR. INSTRUÇÃO PROBATÓRIA DEFICITÁRIA. ÔNUS DA PROVA QUE COMPETIA AO AUTOR DA AÇÃO, DO QUAL NÃO SE DESINCUMBIU A CONTENTO. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 333, INCISO I DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUTOR, ADEMAIS, QUE SE CONVENCEU DA INEXISTÊNCIA DE PROVAS DOS FATOS ALEGADOS, RECONHECENDO EXPRESSAMENTE A IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO POPULAR. SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO.
AGRAVO RETIDO PREJUDICADO. SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Reexame Necessário nº 532049-4, sendo remetente o Juízo Direito, em que é Autor Hermógenes Botti e Réus Ricardo Magalhães Barros, Luiz Turchiari, Sotecol Sociedade Técnica de Coleta de Lixo Ltda.
Tratam estes autos de Reexame Necessário da sentença proferida às fls.1074/1088, nos autos n.º 0067/1994 de Ação Popular proposta inicialmente por Gelson Nery Nascimento contra Ricardo José Magalhães Barros e Outros, sendo admitido no polo ativo dos autos Hermógenes Botti, que deu prosseguimento à ação, que julgou improcedente a ação, em razão da falta de provas.
Consta da inicial da ação popular (fls.02/12) que a Administração Municipal denunciou perante a Câmara de Vereadores as irregularidades havidas na execução do contrato de coleta de lixo e varrição das vias públicas realizado com a Sotecol, e que a insurgência da administração contra as irregularidades provocou ação judicial da ré Sotecol contra o Município de Maringá. Nesta ação, o Município apresentou defesa e reconvenção; apesar disso, a discussão restou centrada apenas nas irregularidades da execução do contrato, havendo ilegalidade do próprio contrato.
O autor da ação sustentou, ainda, que a primeira observação a ser feita está na deliberação da administração anterior de privatizar a coleta de lixo e varrição de vias públicas. Para isso, disse demonstrar-se evidente fictícia mutação da realidade. Expõe, a seguir, que passou a se incutir na população a conveniência da privatização desses serviços e que matérias foram veiculadas pela imprensa, sugerindo implicitamente, diante dos problemas abordados, a gestão privada como a solução adequada.
Na sequência, alega que a repreensão pretendia com a ação popular é contra a artificialidade dos problemas cujo surgimento foi adredemente preparado e que apenas isso pode explicar o repentino descalabro em que se tornaram esses serviços, tão logo assumiu a administração pretérita os destinos do Município de Maringá. Alega que ocorreu no caso o que popularmente se convencionou denominar de “sucateamento”, prática muito disseminada pelo País e obtida à aquiescência tácita ou pela inércia da população, para a terceirização dos serviços de limpeza pública, iniciando-se neste ponto a materialização da nulidade apontada.
Destacou, ainda, que a lesividade desse ato à Administração Municipal está configurada nos preços excessivos cobrados e recebidos pela empresa Sotecol, o que culminou na prática de atos imorais e lesivos ao erário público, estando demonstrado então o interesse na propositura da ação. Descreve, em seguida, o Edital nº 022/90, apontando os itens quanto ao objeto da licitação, da proposta técnica e do julgamento, afirmando que a empresa Sotecol Ltda. foi classificada em primeiro lugar e que, à época dos fatos, o Decreto n.º 2300/86, artigo 3º, disciplinava o procedimento licitatório. Sustenta que não foi previsto qualquer critério para a concessão da pontuação deferida às empresas, restando evidenciada a nulidade do procedimento licitatório e, por conseqüência, do contrato e do aditivo firmado com a empresa Sotecol.
Ao final, pleiteou a procedência da ação com a declaração de nulidade do processo licitatório, do contrato e aditivos contratuais firmados com a empresa classificada, bem como dos pagamentos a ela realizados e, via de conseqüência, a condenação dos réus em perdas e danos.
Com a inicial foram juntados os documentos de fls.13/14.
Foram juntadas cópias das conclusões das sindicâncias realizadas às fls.16/22.
Ainda restaram juntados os documentos constantes de fls.23/129.
A empresa Sotecol - Sociedade Técnica de Coleta de Lixo Ltda apresentou resposta em fls.139/146, alegando preliminarmente a inépcia da inicial, pois não tem objeto e nem causa de pedir. Ainda, que a própria municipalidade encontra-se no pólo passivo da ação, o que torna o pedido impossível. Argüiu preliminar de litispendência, pois já pende ação perante a 3ª Vara de Maringá, em que os contratantes litigam sobre os mesmos direitos. No mérito, aduz que conforme o item 11.3 do edital, a licitação seguiu critérios objetivos para atribuição de notas, não havendo qualquer ilegalidade. Requereu a improcedência da ação.
O réu Ricardo José Magalhães Barros contestou a ação às fls. 149/155, assegurando que a ação popular tem fim estritamente “eleitoreiro”. Destacou que à época dos fatos, o prefeito de então, Said Ferreira, compareceu à Câmara Municipal para apresentar o resultado das auditorias e sindicâncias que realizara na Prefeitura, as quais tratavam da administração anterior e afirmavam a existência de um prejuízo de 35 milhões de dólares. Disse que nos dias seguintes o citado prefeito fez publicar manchetes em detrimento da imagem da administração do réu Ricardo Barros, sendo que este, então, passou a esperar por ações judiciais que aquele prefeito disse estar a providenciar. Alegou que somente passados quase dois anos houve a distribuição de 12 ações populares, entre elas a presente, as quais não foram instruídas com qualquer documento probatório e cujos autores são filiados ao Partido do citado Prefeito Said Ferreira. Pediu a improcedência da ação. Com a defesa, vieram os documentos de fls. 157/174.
Luiz Turchiari Junior, que integrou a Administração Municipal, afirmou que o conteúdo da inicial refere-se exclusivamente as imperfeições que determinariam a nulidade da licitação.
Por sua vez, Akito Willy Taguchi apresentou contestação às fls. 181/185, dizendo que o mérito da ação estava baseado na ilegalidade do contrato firmado entre o Município e a Socotel, e que a privatização da execução dos serviços de coleta de lixo e varrição eram realmente necessários, na medida em que os equipamentos estavam sucateados.
O Município de Maringá manifestou-se nos autos às fls. 188/196, assumindo o polo ativo da ação, ratificando os termos da petição inicial, além de discorrer sobre os princípios que regem a atividade da Administração Pública e, ao final, concluir que a hipótese aventada nestes autos de processo evidencia caso de infringência dos princípios que regem o procedimento licitatório, entre eles o da impessoalidade, igualdade, publicidade, motivação, objetividade, vinculação ao edital, probidade e moralidade. Em razão dessa argumentação sustenta que a licitação em comento deve ser declarada nula, uma vez que consubstanciou em ato ilegal e lesivo ao patrimônio público. Pugnou, assim, pela sua admissão no polo ativo da ação popular e a decretação de nulidade da licitação convocada pelo Edital n.º 22/90-DML-AS, referente à limpeza pública, com a condenação dos réus à devolução do que receberam ilegalmente. Foram juntados os documentos de fls.198/680.
O autor da ação refutou os termos das defesas apresentadas, formulado pedido de produção de provas consistentes em perícia técnica, prova testemunhal, depoimento pessoal das partes e oitiva de testemunhas. O Município de Maringá, também requereu a produção de prova pericial, tomada de depoimentos pessoais e prova testemunhal.
Posteriormente, à fl. 701 Gelson Nery Nascimento requereu a desistência da presente ação, tendo em vista que o Tribunal de Contas do Município não encontrou nada de irregular nas contas da administração do ex-prefeito Ricardo Barros.
Hermógenes Botti, alegando os princípios da economia e celeridade processual, requereu sua admissão nos autos para promover o seguimento da ação, sendo deferido o pedido por meio do despacho de fls.744.
Pelo despacho de fl. 772 foi deferida a produção de provas testemunhal e pericial, sendo que para esta foi nomeado perito e apresentados quesitos e assistentes técnicos pelas partes. Pela petição de fl. 814 o Município discordou do valor dos honorários apresentados pelo perito.
À fl. 919 o Juiz singular despachou dando por preclusa a prova pericial, porque não custeada a tempo pela parte a quem competia o ônus, decisão esta que foi objeto de agravo de instrumento interposto pelo réu Ricardo Barros (fls. 923/933), ao qual esta Corte negou seguimento por ausência de interesse recursal (fls. 945/948 e 964/967).
Em seguida, às fls. 972/986 o Município de Maringá interpôs Agravo de Instrumento contra a mesma decisão que declarou a preclusão da produção de prova pericial, o qual foi convertido em agravo retido, com fulcro no artigo 527, Inciso II do Código de Processo Civil (decisão de fl. 1006).
Em audiência de instrução e julgamento (fls.1020) foi ouvida uma testemunha (depoimento de fl. 1025), sendo marcada nova data para oitiva de outras testemunhas. Em nova audiência de instrução (Termo de fls.1030) foram tomados mais dois depoimentos (fls. 1031 e 1032) e, então, encerrada a instrução.
Em alegações finais de fls. 1033/1036 o autor da ação requereu fosse extinto o presente feito com julgamento de mérito, reconhecendo a improcedência do pedido feito com a inicial em razão de que a demanda ter perdido o objeto em uma parte e que as demais questões restaram improcedentes.
Às fls.1037/1038 constam as alegações do Município de Maringá informando que já transacionou com a empresa Sotecol e que não há mais nada a questionar quanto ao contrato.
Às fls.1039/1042, acham-se as alegações finais de Luiz Turchiari Júnior e às fls.1043/1045, estão as alegações finais da empresa Sotecol, pugnando pela improcedência da ação popular. As alegações de Ricardo José Magalhãoes Barros acham-se às fls.1048/1050, pedindo a improcedência da ação.
O representante do Ministério Público de 1º grau emitiu o parecer de fls.1051/1065, opinando pelo indeferimento da inicial, bem como em razão da falta de outras provas, opinou pela improcedência da ação proposta.
Sobreveio assim a sentença (fls.1074/1088), que julgou improcedente o pedido formulado na ação popular, sob o fundamento de que não restaram evidenciadas a ilegalidade e a lesividade ao patrimônio público.
Não houve a interposição de recursos voluntários, e os autos subiram para o necessário reexame.
A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se em fls.1102/1105 pelo conhecimento e desprovimento do necessário exame.
É o relatório.
Voto.
O fundamento do Reexame Necessário, em sede de Ação Popular, encontra-se positivado no artigo 19 da Lei 4.717/65.
Agravo Retido:
De início cumpre analisar o agravo retido interposto pelo Município de Maringá, às fls. 972/986 (originalmente agravo de instrumento convertido em retido por este Tribunal, pela decisão de fl. 1.006), contra a decisão do Juiz singular que declarou a preclusão da produção da prova pericial, porque não custeada, a tempo, pela parte a quem competia o ônus (decisão de fl. 919).
O agravo deve ser conhecido, porquanto ainda que se trate de remessa ex officio, cumpre verificar que, no caso, o agravo retido foi interposto pela Fazenda Pública. Sendo assim, não se fazia necessária a sua reiteração pelas partes, eis que a remessa ex officio abrangerá a questão, podendo o Tribunal apreciar tanto a sentença como a decisão que houvera sido impugnada pelo agravo retido.
No caso dos autos a produção de prova pericial foi requerida por ambas as partes, e por diversas vezes reiterado. O autor requereu o rateamento entre as partes dos respectivos honorários periciais; o réu disse não competir a ele o pagamento; enquanto que o Município, ora Agravante, manifestou sua indisponibilidade financeira de arcar com tais despesas processuais (fl. 814).
Diante desse impasse das partes, o juiz entendeu por bem em declarar a preclusão da produção da prova por falta de pagamento dos respectivos.
Não agiu com acerto naquela oportunidade o julgador singular.
Isso porque o artigo 5.º, Inciso LXXIII da Constituição Federal e o artigo 10 da Lei 4.717/65 isentam as partes da ação popular do adiantamento de custas processuais - entre elas os honorários periciais - as quais deverão ser pagas a final da lide.
Em razão disso, o pagamento do perito deve se feito ao final do processo pela parte vencida, sob pena de cerceamento de defesa.
É esse o entendimento reiterado da jurisprudência, a exemplo dos seguintes julgados esta Corte:
Agravo de instrumento. Ação popular. Indeferimento de prova pericial. Cerceamento de defesa. Ocorrência. Pagamento dos honorários periciais ao final. Alternativamente, perícia bancada pelo estado do Paraná. Havendo questão de fato a ser elucidada, o indeferimento de pedido de prova pericial requerida Ministério Público, com o argumento de que esta instituição não dispõe de verba para o custeio da prova, importa em cerceamento de defesa. O pagamento dos honorários periciais deverá ocorrer ao final da demanda ou, caso nenhum perito aceite essa condição, ser feito pelo Estado do Paraná, ou, ainda, a prova ser efetivada por órgão oficial. (TJPR - Ac. 24936 - Ag Instr 1.0167508-9 - 2.ª CCv - Rel. Pericles Bellusci de Batista Pereira - DJPR 6873 de 20/05/2005)
PROCESSO CIVIL. AÇÃO POPULAR. ADIANTAMENTO DE HONORÁRIOS PERICIAIS. DESCABIMENTO. PAGAMENTO AO FINAL DA DEMANDA PELO VENCIDO.1.Em ação popular é vedado o adiantamento dos honorários periciais, devendo o pagamento ser feito ao final do processo pela parte vencida. Incidência do artigo 7º, LXXIII da Lei Fundamental e artigo 10 da Lei nº 4.717/65.2.Caso o perito não concorde em receber seus honorários somente ao final do processo, deverá ser “requisitada a realização da perícia perante ente público responsável pelo custeio daquela”(acórdão nº 10457, 6ª Câmara Cível, rel. Des. Noronha). (TJPR - Ac. 25415 - Ag Instr 1.0172546-2 - 1.ª CCv - Rel. Ulysses Lopes - DJPR 6873 de 20/05/2005)
Assim, de fato, a situação posta a lume não comportava a declaração de preclusão da prova pericial, pois esta deveria ser realizada independentemente de pagamento dos honorários, os quais seriam adimplidos a final.
Entrementes, no caso dos autos o agravo retido - que tinha por finalidade buscar a reforma da decisão agravada para que fosse produzida a prova pericial requerida - perdeu o objeto, o que se conclui diante da manifestação expressa do autor popular, que nas suas alegações finais quando se manifestou pela inocorrência de ato ilegal e lesivo inicialmente apontado na ação proposta e acabou reconhecendo a improcedência da ação popular (fls. 1033/1036), sendo seguido no mesmo sentido pelo Município Agravante (fls. 1037/1038) e pelos outros réus da ação.
Deste modo, o agravo retido restou prejudicado, diante da perda do objeto, pois não haveria mais necessidade de se produzir a prova pericial técnica requerida anteriormente para corroborar a argumentação da Fazenda Pública.
Do reexame necessário:
Cuida-se de Reexame Necessário de sentença proferida nos autos de Ação Popular sob n.º 0067/1994 que julgou improcedente a ação movida inicialmente por Gelson Nery Nascimento contra Ricardo José Magalhães Barros e Outros, sendo admitido no polo ativo dos autos Hermógenes Botti, que deu prosseguimento à ação.
Extrai-se dos autos que em fevereiro de 1994 Gelson Nery Nascimento ajuizou a presente ação popular contra Ricardo José Magalhães Barros, Akito Willy Taguchi, Luiz Turchiari Júnior, Sotecol - Sociedade Técnica de Coleta de Lixo e o Município de Maringá pretendendo apurar irregularidades supostamente havidas na execução do contrato de coleta de lixo e varrição das vias públicas realizada com a ré Sotecol, bem como a condenação dos responsáveis em perdas e danos sofridos pelo erário público.
Para tanto, o autor aduziu, em síntese, que a lesividade deste ato está materializado nos elevados preços cobrados e recebidos pela Sotecol, em prejuízo da administração municipal, o que implicou na prática de atos imorais e lesivos ao patrimônio público, que devem ser ressarcidos.
Os réus, por sua vez, negam todas as acusações, aduzindo que a licitação seguiu os procedimentos corretos, assim como o respectivo contrato, concluindo que a ação popular foi ajuizada com fim estritamente “eleitoreiro”, por rival político do primeiro réu, Ricardo José Magalhães Barros.
Pois bem.
A ação popular é garantida constitucionalmente pelo artigo 5.º, Inciso LXXIII da Carta Magna e regulada pela Lei 4.717/65, e seu conceito, nas palavras do mestre Hely Lopes MEIRELLES1, corresponde ao “meio constitucional posto à disposição de qualquer cidadão para obter a invalidação de atos ou contratos administrativos - ou a estes equiparados - ilegais e lesivos ao patrimônio federal, estadual e municipal, ou de suas autarquias, entidades paraestatais e pessoas jurídicas subvencionadas com dinheiro público.”
E prossegue o administrativista2:
“E um instrumento de defesa dos interesses da coletividade, utilizável por qualquer de seus membros. Por ela não se amparam direitos individuais próprios, mas sim interesses da comunidade. O beneficiário direto e imediato desta ação é o autor; é o povo, titular do direito subjetivo ao governo honesto. O cidadão a promove em nome da coletividade, no uso de uma prerrogativa cívica que a Constituição da República lhe outorga.
(...)
Entretanto, a ação popular vem sendo desvirtuada e utilizada como meio de oposição política de uma Administração a outra, o que exige do Judiciário redobrada prudência no seu julgamento, para que não a transforme em instrumento de vindita partidária, nem impeça a realização de obras e serviços públicos essenciais à comunidade que ela visa a proteger”.
Assim, a ação popular tem por escopo a anulação de ato lesivo ao patrimônio público. Para tanto, se faz, porém, indispensável a presença dos elementos ilegalidade do ato e lesividade ao erário, para que possam legitimar referida ação.
É este o entendimento exarado pela doutrina, conforme lição de Rodolfo de Camargo MANCUSO3:
“(...) nos casos mais ocorrentes continuará sendo necessário que a causa de pedir na ação popular invoque o binômio ilegalidade-lesividade, mormente nos casos onde a procedência da ação (ou a concessão da liminar - Lei 4.717/65, § 4.º do art. 5.º) venham a ter reflexos relevantíssimos na administração pública, como se dá quando existe obra vultuosa em andamento, cuja paralisação não raro se revela ainda mais danosa ao patrimônio público do que a própria finalização do ato sindicado”.
Sobre o ato lesivo, a obra do já citado Hely Lopes MEIRELLES4 enfatiza que “na conceituação atual, lesivo é o ato ou omissão administrativa que desfalca o erário ou prejudica a Administração, assim como o que ofende bens ou valores artísticos, cívicos, culturais, ambientais ou históricos da comunidade. E essa lesão tanto pode ser efetiva quanto legalmente presumida, visto que a lei regulamentar estabelece casos de presunção de lesividade (art. 4.º), para os quais basta a prova da prática do ato naquelas circunstâncias, para considerar-se lesivo e nulo de pleno direito (STF, RTJ 103/683). Nos demais casos impõe-se a dupla demonstração de ilegalidade e da lesão efetiva ao patrimônio protegível pela ação popular. Sem estes três requisitos - condição de eleitor, ilegalidade e lesividade - que constituem os pressupostos da demanda, não se viabiliza a ação popular.”
Vislumbra-se, assim, que para a ação popular se faz imprescindível a presença, dentre outros elementos, os da ilegalidade do ato praticado e da lesividade ao patrimônio público.
No caso dos autos, repita-se, a pretensão inicial indicava a existência de ato ilegal e lesivo caracterizado pela execução do contrato de coleta de lixo e varrição das vias públicas realizada com a ré Sotecol, o qual foi levado a efeito após licitação. A ilegalidade, segundo o autor, estaria representada pelo favorecimento da empresa requerida e vencedora da licitação (Sotecol), por ocasião da quesitação técnica, a qual teria ocorrido sem critérios; enquanto que a lesividade ao erário público estava caracterizada pelo excesso de valores pagos pela municipalidade à empresa contratada.
Sucede que o cotejo das alegações iniciais do autor (causa de pedir) com as provas trazidas aos autos não permite concluir pela presença desses requisitos essenciais, que pudessem levar à procedência da ação.
Com a inicial o autor não juntou qualquer documento que pudesse comprovar os fatos alegados, requerendo, por isso, produção de prova oral e pericial.
No curso do processo o autor originário da ação popular, Gelson Nery Nascimento, em petição de fl. 701 desistiu da ação, fundamentado na aprovação das contas do Município, referente ao exercício financeiro, em que foi praticado o ato impugnado (1992), pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná, conforme consta da cópia do parecer de fl. 702.
Não obstante a informação trazida pelo autor desistente da ação, assumiu o seu polo ativo o Sr. Hermógenes Botti pretendendo o prosseguimento do feito. Assim, na sequência, foi deferida a produção de prova pericial contábil para apurar supostas irregularidades e lesividade ao erário público.
Ocorre que as partes divergiram com relação ao pagamento dos honorários periciais - o réu dizendo que a ele não cabia o pagamento (fl. 794 e 874), o Município atestando sua impossibilidade para o respectivo pagamento (fl. 814) e o autor pleiteando o seu rateio entre as partes (fl. 820) - o que culminou com a declaração de preclusão de tal prova, pelo despacho de fl. 919, diante da falta de pagamento dos honorários periciais arbitrados para tanto. Contra tal decisão se insurgiram as partes através de agravo de instrumento, sendo que ao recurso do réu qual foi negado seguimento (fls. 945/948) e o do Município de Maringá foi convertido em agravo retido (fl. 1006), já apreciado em item próprio deste voto.
A prova oral produzida tampouco trouxe a lume a tese dos Autores. A testemunha Eduardo Augusto Giannini, cujo depoimento consta da fl. 1025, afirmou que o certame objeto da presente lide que teve como vencedora a empresa ré (Sotecol) “seguiu os parâmetros do estabelecidos no item 9.2 e 11.3 do edital de licitação”, não trazendo qualquer assertiva que pudesse demonstra eventual irregularidade no processo licitatório ou no contrato firmado entre o Município e a empresa ré.
As outras duas testemunhas ouvidas conforme termos de fls. 1031 e 1032 nada souberam afirmar sobre os detalhes da licitação em comento, nem sobre a classificação da ré Sotecol, nem sobre o contrato ou o acordo firmado entre as partes.
De igual modo, nenhuma outra prova há nos autos que possa sustentar a tese de ato ilegal e lesivo ao patrimônio público municipal, como alegado na inicial.
Com efeito, diante da negativa da parte ré sobre as alegações iniciais o ônus da prova acerca da ilegalidade e lesividade do ato apontado pertencia exclusivamente aos autores, a teor do que dispõe o artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil, ônus do qual, contudo, não se desincumbiram.
Em comentário a citado dispositivo Vicente GRECO FILHO5 leciona:
“O autor, na inicial, afirma certos fatos porque deles pretende determinada conseqüência de direito; esses são os fatos constitutivos que lhe incumbe provar sob pena de perder a demanda.
A dúvida ou insuficiência de prova quanto a fato constitutivo milita contra o autor.
O juiz julgará o pedido improcedente se o autor não provar suficientemente o fato constitutivo de seu direito.”
Ainda sobre o ônus da prova vale destacar os ensinamentos de ARRUDA ALVIM6:
“De um modo geral, podemos dizer que, recaindo sobre uma das partes o ônus de prova relativamente a tais e quais fatos, não cumprindo esse ônus e inexistindo nos autos quaisquer outros elementos, pressupor-se-á um estado de fato contrário a essa parte. Assim, quem devia provar e não o fez perderá a demanda.
Assim, tendo o réu negado a autoridade do fato do qual nasceria sua obrigação, incumbe ao autor o ônus da prova, sob pena de absolvição do réu.”
E o já citado autor Rodolfo de Camargo MANCUSO7 em sua obra especifica sobre a ação popular, destaca:
“No plano substancial, onde incidirá, propriamente, a decisão sobre o mérito da controvérsia, deve o autor popular desincumbir-se do ônus de provar o ‘fato constitututivo’ de sua pretensão (CPC. Art. 333, I). Não lhe bastará alongar-se acerca das conotações jurídicas da lide: as regras ‘da mihi factum dabo tibi jus’ e ‘jura novit curia’, indicam que a tarefa do autor é relatar com precisão os fatos, sobrelebando-lhes todos os aspectos mais importantes e, principalmente, calçando-lhes desde logo com as provas documentais de que dispuser; ao depois cuidará de atribuir-lhes a conseqüência jurídica que entenda pertinente. Esta segunda parte não se afigura tão importante quanto aquela primeira, até porque, excluídas as vedações quanto à prolação da sentença ‘fora da lide’ (CPC, art. 460), é possível que o juiz dê pela procedência da ação, mas por fundamento jurídico ‘outro’ que não o acenado pelo autor, já que o magistrado forma livremente sua convicção (CPC, art. 131).”
E mais adiante pondera o mesmo autor8:
“Naturalmente, tudo o que antes se disse sobre a massa probatória na ação popular tem como pressuposto lógico o sistema de distribuição do ônus da prova, cuja finalidade é a de facilitar a tarefa do julgador (‘regras de julgamento’), quando se depare com um caso de insuficiência de prova, já que, obviamente, quando a prova a favor do autor (tese) ou do réu (antítese) for consistente, a ação será julgada procedente no primeiro caso e improcedente no segundo. Nos demais casos, terá muita importância o critério estabelecido no art. 333, I, do CPC, que carreia ao autor o ônus de provar o ‘fato constitutivo’ de sua pretensão (cf. também art. 282, VI), e, para o réu, a prova das exceções, objeções e defesas diretas e indiretas, ou seja, dos fatos modificativos, extintivos ou impeditivos (art. 333, II): ‘reus ins exceptio fit actor’.
Nesse sentido é pautada a jurisprudência em casos análogos ao dos autos, como se destaca dos seguintes julgados desta Corte:
REEXAME NECESSÁRIO - AÇÃO POPULAR - ALEGAÇÕES DE QUE OBRAS MUNICIPAIS TERIAM CAUSADO DANOS AO PATRIMÔNIO, MEIO AMBIENTE E BEM PÚBLICO DA CIDADE - ILEGALIDADE E LESIVIDADE NÃO COMPROVADAS - ÔNUS DA PROVA - INCUMBÊNCIA AO AUTOR - SENTENÇA MANTIDA EM GRAU DE REEXAME NECESSÁRIO. (TJPR - Ac. 30205 - Reex Nec 0412422-5 - 4.ª CCv - Rel. Regina Afonso Portes - DJPR 7582 de 28/03/2008)
APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO POPULAR. ISENÇÃO DE CUSTAS E ÔNUS SUCUMBENCIAIS. AUSÊNCIA DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEL. CONSTRUÇÃO DE GINÁSIO DE ESPORTES. LESIVIDADE E ILEGALIDADE. NÃO COMPROVAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. 1. A sentença que repele pretensão deduzida em ação popular, por força de lei, está sujeita ao reexame necessário. 2. Diante do reconhecimento que não houve má-fé no ajuizamento desta ação popular fica a apelante isenta do pagamento das custas processuais e do ônus da sucumbência. Inteligência do inciso LXXIII do artigo 5º da CF. 3. Para a viabilidade da ação popular necessário a presença de três pressupostos, quais sejam, a condição de eleitor do sujeito ativo, ilegalidade ou ilegitimidade do ato a invalidar e dano ao erário público. 4. O fato de a Constituição Federal de 1988 ter alargado as hipóteses de cabimento da ação popular não tem o efeito de eximir o autor de comprovar a lesividade do ato, mesmo em se tratando de lesão à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimônio histórico e cultural. 5. Não logrando êxito em demonstrar a presença dos pressupostos de ilegalidade ou ilegitimidade do ato a invalidar e dano ao erário público, a pretensão deduzida não tem condições de prosperar, mesmo porque não se desincumbiu do ônus probatório que lhe cabia. Apelação desprovida. Sentença reformada parcialmente em sede de Reexame Necessário. (TJPR - Ac. 21309 - ApCvReex 0421526-7 - 5.ª CCv - Rel. Rosene Arão de Cristo Pereira - DJPR 7664 de 25/07/2008)
REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO POPULAR CONTRA ATO DO PREFEITO. DESTRUIÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS REALIZADAS NA GESTÃO ANTERIOR. ÔNUS DA PROVA A CARGO DO AUTOR. EXEGESE DO ARTIGO 333, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ILEGALIDADE DO ATO E LESIVIDADE AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. PRETENSÃO NÃO ACOLHIDA. SENTENÇA CONFIRMADA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO. A ação popular exige para a procedência do pedido nela formulado, dentre outros requisitos, a comprovação da ilegalidade do ato praticado e da lesividade ao patrimônio público, cujo ônus probatório incumbe ao autor. (TJPR - Ac. 28714 - Reex Nec 0415318-8 - 4.ª CCv - Rel. Abraham Lincoln Calixto - DJPR de 7460 de 28/09/2007)
APELAÇÃO CÍVEL. AUSÊNCIA DE ATAQUE DA SENTENÇA RECORRIDA NAS RAZÕES RECURSAIS. REPRODUÇÃO DOS ARGUMENTOS ANTERIORMENTE ARTICULADOS. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 514, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO NÃO CONHECIDO. O recurso de apelação não pode ser conhecido, tendo em vista que as razões recursais deixaram de atacar a decisão monocrática, repetindo apenas os argumentos expostos em momento anterior. REEXAME NECESSÁRIO - CONHECIMENTO DE OFÍCIO - AÇÃO POPULAR - ALEGAÇÃO DE MÁ EXECUÇÃO DE OBRAS DE PAVIMENTAÇÃO URBANA - AUSÊNCIA DE PROVA PERICIAL - IMPRESCINDIBILIDADE - PEDIDO IMPROCEDENTE - PRELIMINARES AFASTADAS - SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO. As preliminares de ilegitimidade passiva e carência de ação por falta de interesse de agir foram corretamente afastadas. A prova pericial é fundamental para a apuração de eventual má execução de obras de pavimentação urbana, sendo que a sua não produção impede a procedência do pedido, vez que o autor não comprovou o fato constitutivo de seu direito (art. 333, inciso I, do Código de Processo Civil). (TJPR - Ac. 18000 - Ap Cível 0402132-3 - 5.ª CCv - Rel. Luiz Mateus de Lima - DJPR 7416 de 27/07/2007)
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO POPULAR - ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE DA LEI MUNICIPAL QUE INSTITUIU PROGRAMA DE INCENTIVO AO ESPORTE AMADOR NO MUNICÍPIO DE MARINGÁ - ÔNUS DA PROVA - ART. 333, I, DO CPC - ILEGALIDADE/LESIVIDADE DO ATO NÃO COMPROVADAS - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. A anulação de atos lesivos ao patrimônio público, por meio da ação popular, carece da constatação da ilegalidade ou da irregularidade do ato e dos prejuízos causados ao patrimônio público. O ônus da prova dos fatos constitutivos de seu direito é do autor, nos termos do art. 333, I, do CPC. Não estando comprovada a suposta ilegalidade, nem a lesividade alegada, não há como se anular os atos da autoridade administrativa. (TJPR - Ac. 17259 - Ap. Cível 0314378-8 - 5.ª CCv - Rel. Francisco Luiz Macedo Junior - DJPR 7348 de 20/04/2007)
Corrobora com a ausência de prova acerca dos requisitos da ação popular o fato de, reprise-se, o próprio autor originário ter desistido da ação em razão da aprovação das contas pelo Tribunal de Contas do Município do exercício financeiro em que teria ocorrido os fatos deduzidos na inicial, o que demonstraria a ausência de prejuízo ao erário público.
Cumpre destacar, ainda - não fosse a evidente ausência de prova - que o autor popular sucessor do originário, Sr. Hermógenes Botti em suas alegações finais trazidas às fls. 1033/1036, expressamente mencionou que a motivação da ação principal relativa ao prejuízo que o contrato firmado com a empresa Sotecol teria trazido ao erário público (diferença entre o valor da licitação e o valor contratado) já teria sido objeto de transação entre as partes (Sotecol e Município), com a dedução de eventual prejuízo, o que motivou, inclusive, a conclusão do próprio autor pela inocência do Requerido neste pedido e pela conseqüente improcedência dos pedidos.
Da mesma forma, o Município autor, também em alegações finais (fls. 1037/1038) afirmou que foram utilizados critérios objetivos por ocasião da licitação, estando ausente qualquer ilegalidade ou irregularidade no ato, bem como que eventual prejuízo causado foi suprido com o acordo firmado entre as partes (fls. 865/871), pelo que disse não ter nada mais a questionar quanto a referido contrato.
Assim, os próprios autores reconhecem que não restou evidenciado nos autos os fatos constitutivos de seu direito acerca da irregularidade do ato e conseqüente lesividade ao patrimônio público, requisitos estes exigidos de forma cumulativa para a procedência da ação popular.
Outrossim, essa foi também a conclusão do Ministério Público, tanto em primeiro grau como em segundo grau, que se convenceu pela inexistência de provas, manifestando-se pela improcedência do pedido e manutenção da sentença em grau de reexame.
Diante disso, não tendo os autores se desincumbido do ônus de provar a ocorrência dos fatos narrados na inicial, fornecendo as provas necessárias para a análise dos atos impugnados, nos termos do artigo 333, inciso I, do Código de Processo Civil, mas, ao contrário, tendo eles se convencido expressamente da inocorrência de prática de ato ilegal e lesivo ao patrimônio público, impõe-se a improcedência dos pedidos, pelo que deve ser mantida na íntegra a sentença ora em reexame.
Ante o exposto, ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em declarar prejudicado do agravo retido e manter a sentença em grau de reexame necessário, nos termos do voto da Relatora.
Presidiu o julgamento a Desembargadora Regina Afonso Portes, sem voto, tendo dele participado a Desembargadora Lélia Samardã Giacomet e a Juíza Substituta em Segundo Grau Vânia Maria da S. Kramer.
Curitiba, 07 de julho de 2009.
MARIA APARECIDA BLANCO DE LIMA
Desembargadora Relatora
1 MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança..., 31.ª ed. - São Paulo : Malheiros, 2008, p. 126-127.
2 Ob. cit., p. 127.
3 MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Ação Popular, 6.ª ed. - São Paulo : RT, 2008, p. 125.
4 Ob. cit., p. 129.
5 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro, 13.ª ed. - São Paulo : Saraiva, 1999, p. 189
6 ALVIM, Arruda. Manual de Direito Processual Civil, vol. 2, 12.ª ed. - São Paulo : RT, 2008, p. 505.
7 Ob. cit., p. 302.
8 Ob. cit., p. 306
<< Home