10.10.09

Apelação cível

APELAÇÃO CÍVEL Nº 452.740-0 - DA COMARCA DE MARINGÁ - 6ª VARA CÍVEL

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ.
APELADO: ESPÓLIO DE JOSÉ CLÁUDIO PEREIRA NETO.
INTERESSADO: MUNICÍPIO DE MARINGÁ.

RELATOR: Juiz ROGÉRIO RIBAS, Subst. de 2º Grau.(1)


Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PREFEITO MUNICIPAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. UTILIZAÇÃO DA BANDEIRA MUNICIPAL REESTILIZADA, COM A FRASE “GOVERNO POPULAR DE MARINGÁ - DESENVOLVIMENTO E IGUALDADE”. CRIAÇÃO DE SÍMBOLO PARA DESTACAR A AÇÃO DE GOVERNO CONSISTENTE NO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO. CRIAÇÃO E DISTRIBUIÇÃO DE INFORMATIVO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS DA ADMINISTRAÇÃO. NÃO CONSTATAÇÃO DE INTENTO DE PROMOÇÃO PESSOAL. AUSÊNCIA DE ATO DOLOSO OU DE MÁ-FÉ. ATITUDES DO PREFEITO QUE PERMITEM CONCLUIR PELA SUA INTENÇÃO APENAS DE DESTACAR E VALORIZAR A ATUAÇÃO OBJETIVA E AS PRIORIDADES DA PREFEITURA. AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. SUCUMBÊNCIA AO MINISTÉRIO PÚBLICO. EXCLUSÃO, DE OFÍCIO, NOS TERMOS DO ART. 18 DA LEI 7.347/85.
APELO DESPROVIDO.

1)- Em se tratando de improbidade administrativa, “mesmo quando algum ato ilegal seja praticado, é preciso verificar se houve culpa ou dolo, se houve um mínimo de má-fé que revele realmente a presença de um comportamento desonesto” (DI PIETRO, “Direito Administrativo”, Ed. Atlas, 20ª ed., 2007, p. 762).

2)- A simples inabilidade do gestor público que, visando divulgar o governo municipal e suas ações, cria símbolos e informativo a partir de reestilização da bandeira do município, não configura ato de improbidade administrativa, por não se constatar o intento de “promoção pessoal”.




I - O RELATÓRIO:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos.

Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE RESPONSABILIDADE POR DANOS AO PATRIMÔNIO PÚBLICO C.C OBRIGAÇÃO E FAZER E NÃO FAZER, E ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA COM PEDIDO DE LIMINAR, sob n. 332/2002, movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra a pessoa de JOSÉ CLÁUDIO PEREIRA NETO (hoje falecido), então Prefeito Municipal de Maringá.

Na inicial o Ministério Público imputa ao falecido réu a prática de ato ímprobo consistente em utilizar a bandeira municipal reestilizada no seu desenho, para aparentar bonecos de mãos dadas, com uma frase destacando o “governo popular de Maringá - desenvolvimento e igualdade”, caracterizando assim um símbolo a identificar a administração do réu frente ao município, no quadriênio 2001-2004.

Tal símbolo ainda seria uma alusão explícita ao Partido dos Trabalhadores - PT, ao qual pertencia o ex-prefeito.

Além da bandeira reestilizada, o réu estaria usando outro símbolo para divulgar sua gestão, divulgando o chamado orçamento participativo, com uma estrela de cujo interior saem três flâmulas nas cores do município.

Tal divulgação (dos símbolos mencionados) ocorreria em papeis, ofícios, convites, órgão de divulgação e prestação de contas, folders e em toda a comunicação grafada ou visual (placas de obras) do município, além de propaganda televisiva.

A Câmara municipal teria oficiado (n. 521/02) ao réu, solicitando a cessação daquele tipo de propaganda de sua gestão, mas não foi atendida.

Vários pedidos de obrigação de fazer e de não fazer foram lançados na inicial, além de ter sido requerida a condenação do réu como incurso no art. 10 da LIA (Lei 8429/92) por danos ao erário em virtude das despesas geradas pela aludida propaganda irregular, além da condenação pelo art. 11 da mesma lei, diante da prática de ato ímprobo violador da impessoalidade, visando fim proibido em lei, em face da impressão e distribuição do informativo “Maringá - órgão de informação e prestação de contas”, bem como ainda a condenação pelo art. 11 diante da utilização da bandeira reestilizada como propaganda pessoal da administração do réu.

Pediu também a abstenção, pelo réu, dessas atitudes, e a retirada às suas expensas dos símbolos já aludidos dos papeis, placas, veículos, etc, do município.

O município de Maringá veio a ser incluído no pólo ativo da demanda (fls. 589).

O réu faleceu no curso da ação, sendo substituído por seu espólio, representado por sua genitora.

Após regular processamento do feito, adveio r. sentença de fls. 591/607 pela qual o Dr. Juiz “a quo” houve por JULGAR IMPROCEDENTE A DEMANDA, ao entendimento de que, em síntese:

a)- Direito é bom senso; não houve dolo ou desonestidade do falecido réu no caso; nem visou ele lesar o erário;
b)- ímprobo é o que se mostra desonesto; má fé deve ser provada; o alcaide agiu na espécie com boa fé; não houve prejuízo ao patrimônio público;
c)- é preciso bom senso técnico para manejar a ação de improbidade; pois a lei respectiva prevê severas punições;
d)- no caso não se vê intento de promoção pessoal; a simbologia questionada pelo Ministério Público se refere à promoção da administração, não da pessoa do falecido ex-prefeito; não houve abusividade nos gastos com os tais símbolos, de sorte que inocorreu dano ao erário;
e)- em caso similar o STJ entendeu pela absolvição do réu (REsp 721190-CE, DJU 13.2.06, p. 696).

Condenou o parquet autor em custas e honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em R$ 4.000,00 (quatro mil reais).

Vem apelar o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, buscando a reforma da sentença. Para isso, alega em síntese que:

a)- o Dr. Juiz cita caso de improbidade em que absolveu o Promotor de Justiça apelante, mas não aduz que naquele caso foi reconhecida a prescrição;
b)- o magistrado sentenciante deixou claro sua estima com o partido do falecido apelado, mas não se cuida de pequeno deslize administrativo, e sim improbidade; a comprovação da utilização dos símbolos é patente, e a falta de habilidade político-governamental do falecido prefeito não justifica o fato;
c)- os fatos estão todos demonstrados; foi um trabalho de marketing político; há lei municipal (vide, fls. 625) proibindo o uso de símbolos municipais para propaganda.

Pede a inversão do resultado da demanda, com a condenação do espólio a reparar os prejuízos causados diante dos danos ao erário, bem como mantidos os demais pleitos da exordial, exceto a suspensão de direitos políticos e perda da função pública, inaplicáveis a esta altura em decorrência do falecimento do réu.

Preparo recursal dispensado. Recurso recebido às fls. 650. Contrariedade pelo espólio apelado às fls. 652/675.

Em r. parecer subscrito pelo Dr. MATEUS EDUARDO SIQUEIRA NUNES BERTONCINI, a d. Procuradoria Geral da Justiça opinou pelo provimento parcial do apelo cível, para o fim de condenar o espólio de JOSE CLAUDIO PEREIRA NETO ao ressarcimento integral do dano, em razão dos atos de improbidade previstos nos arts. 10 e 11 da LIA, praticados à época pelo falecido réu.

Os autos vieram conclusos a este magistrado por força do despacho proferido no Protocolo n. 207.890/2009 da d. presidência deste Tribunal de Justiça (cf. fls. 307).

É o relatório.

II - FUNDAMENTAÇÃO E VOTO:

Conheço do recurso interposto pelo Ministério Público porque presentes os pressupostos de admissibilidade.

PRELIMINAR - PERDA DE OBJETO DA DEMANDA.

A parte apelada sustenta em contra-razões a perda de objeto da demanda, em virtude do falecimento do réu original e do término daquele mandato.

Contudo, assim não vejo, pois trata-se de ação cível em que há pretensão de reparação de alegados danos ao erário, pelos quais --- em tese --- responde o espólio. Apenas as sanções de ordem pessoal é que ficam afastadas.

Nesse sentido já decidiu o STJ:

“PROCESSO CIVIL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - FALECIMENTO DO RÉU (EX-PREFEITO) NO DECORRER DA DEMANDA - HABILITAÇÃO DA VIÚVA MEEIRA E DEMAIS HERDEIROS REQUERIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO - POSSIBILIDADE - ARTS. 1055 E SEGUINTES DO CPC - (...) A questão federal principal consiste em saber se é possível a habilitação dos herdeiros de réu, falecido no curso da ação civil pública, de improbidade movida pelo ministério público, exclusivamente para fins de se prosseguir na pretensão de ressarcimento ao erário. 3. Ao requerer a habilitação, não pretendeu o órgão ministerial imputar aos requerentes crimes de responsabilidade ou atos de improbidade administrativa, porquanto personalíssima é a ação intentada. 4. Estão os herdeiros legitimados a figurar no pólo passivo da demanda, exclusivamente para o prosseguimento da pretensão de ressarcimento ao erário (art. 8°, Lei 8.429/1992). Recurso Especial improvido”. (STJ - RESP 200500407700 - (732777) - MG - 2ª T. - Rel. Min. Humberto Martins - DJU 19.11.2007 - p. 00218).

Preliminar rejeitada.

PRELIMINAR - INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.

Alega-se ainda em contrariedade recursal que não é possível cumular ação civil pública com ação de improbidade administrativa.

Porém, não há razão nessa tese, sendo aceito pela jurisprudência dominante que: “É possível a cumulação da ação de improbidade administrativa com a ação civil pública objetivando a reparação de danos, sobretudo quando se atenta para a circunstância de a probidade administrativa ter natureza de interesse difuso. (...)” (TRF 1ª R. - AI 2008.01.00.009833-9/PA - 4ª T - Rel. Klaus Kuschel - DJe 18.11.2008 - p. 201).

Preliminar rejeitada.

DO MÉRITO.

No mérito, a questão envolve análise da ocorrência ou não de propaganda de cunho pessoal de parte do então Prefeito Municipal de Maringá, JOSÉ CLAUDIO PEREIRA NETO, já falecido.

Afora algumas trocas de farpas entre o Dr. Juiz sentenciante e o Dr. Promotor de Justiça subscritor da apelação em mesa, é de se ver que a existência de indícios de improbidade de fato autorizavam o ajuizamento da ação civil pública pelo parquet, em defesa do patrimônio público e dos princípios norteadores da administração pública, ex vi da Súmula 329 do STJ.2

A interpretação dos fatos é que se mostrou divergente na ótica dos personagens citados (juiz e promotor).

Pois bem.

Este relator não entende correta a deflagração de ação civil pública por improbidade administrativa em relação a fatos de mínima repercussão, em que, de plano, não se vê conduta abusiva do gestor público, notadamente no aspecto da honestidade.

O princípio da impessoalidade na administração pública, todavia, está inserto no art. 37 e § 1º da Constituição Federal, que diz:

“A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
§ 1º. A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.(...)”.

Vamos então à análise dos fatos e das provas:

Às fls. 46 e 47 estão a bandeira oficial do município de Maringá e o brasão municipal. Ambos instituídos pela Lei Municipal 332/64.

Às fls. 49 está um convite emitido pelo falecido prefeito JOSE CLAUDIO, em que na parte superior consta a tal bandeira reestilizada. A figura contém a seguinte inscrição logo abaixo do desenho: “Governo popular de Maringá / Desenvolvimento e Igualdade”.

Nos documentos seguintes está o mesmo símbolo.

Às fls. 52 está um exemplar do informativo “MARINGÁ - Órgão de informação e prestação de contas do governo popular de Maringá”, em que consta também a tal bandeira reestilizada.

Em assuntos relacionados ao denominado “Orçamento Participativo” foi grafado um símbolo com uma estrela e três tiras em cores do município, com a inscrição “Agora eu também faço Maringá” (vide, fls. 54/55).

Ora, analisando tais novos símbolos, sem embargo da perceptível inabilidade do falecido réu (então prefeito) ao criar esses instrumentos de divulgação, em minha ótica não há se concluir que a intenção tenha sido mesmo de realizar propaganda de cunho “pessoal”.

É preciso ter bom senso ao interpretar tais fatos.

Este Tribunal de Justiça e o STF, por exemplo, apresentam nas suas páginas da internet emblemas e símbolos (logomarcas) que os identificam, tentando-se com isso - numa ação de marketing até político - valorizar as referidas instituições.3

O “site” do Tribunal de Justiça do Paraná contém logomarca de uma balança e o cruzeiro do sul. Não há a bandeira oficial do Estado, e nem por isso se poderá falar em promoção pessoal de quem quer que seja.

O próprio “site” oficial do Ministério Público do Paraná4 contém, como pano de fundo, duas mãos de pessoas de cor diferente, procurando demonstrar que a instituição age para superar as desigualdades sociais, promovendo a justiça social. No pé da página do mesmo “site”, consta outro desenho dentro das letras “MP”, onde há uma família de mãos dadas ao lado de uma araucária, esta que vem a ser árvore símbolo do Estado do Paraná.

Não se pode dizer que tais símbolos ou instrumentos de marketing, tenham sido criados para “personalizar” as administrações da instituição do Ministério Público, no aspecto estritamente pessoal.

Ou seja, não cabe ir a extremos em se tratando de analisar semelhantes fatos para efeito de caracterização (ou não) de ato de improbidade, sob pena de dar um sentido à interpretação da lei que não se amolda à verdadeira “ratio legis”.

O excesso de rigor pode facilmente ensejar o cometimento de injustiça, todos sabemos.

A professora DI PIETRO assevera que “mesmo quando algum ato ilegal seja praticado, é preciso verificar se houve culpa ou dolo, se houve um mínimo de má-fé que revele realmente a presença de um comportamento desonesto” (in “Direito Administrativo”, Ed. Atlas, 20ª ed., 2007, p. 762).

É que “o objetivo da Lei de Improbidade é punir o administrador público desonesto, não o inábil. (...)” (cf. MAURO ROBERTO GOMES DE MATTOS, em “O Limite da Improbidade Administrativa”, Edit. América Jurídica, 2ª ed. pp. 7 e 8).

Da mesma forma ALEXANDRE DE MORAES destaca:

“A finalidade da lei de improbidade administrativa é punir o administrador desonesto” (in “Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional”, Atlas, 2002, p. 2.611).

O STJ já decidiu que:

“(...) De fato, a lei alcança o administrador desonesto, não o inábil, despreparado, incompetente e desastrado” (REsp 213.994-0/MG, 1ª Turma, Rel. Min. GARCIA VIEIRA, DOU de 27.9.1999).

Este relator já atuou num caso5 em que um Prefeito Municipal criou símbolos para marcar pessoalmente sua gestão. Mas, na hipótese vertente dos autos, a situação se mostra diversa.

Com efeito. No caso dos autos infere-se que o Prefeito quis dar uma nova estampa ao governo municipal, e assim agiu criando os tais novos símbolos e o informativo de prestação de contas (esta, no fundo, de grande interesse público, por óbvio).

Não se constata a pretensão de criar uma “marca pessoal”, só porque o Partido dos Trabalhadores também tem como símbolo uma estrela. Ou porque alguns dizeres da bandeira reestilizada apontariam para as propostas daquela administração municipal.

O TJMG decidiu em caso semelhante:

“APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - PUBLICIDADE AUTOPROMOCIONAL - MÁ-FÉ E PREJUÍZO - AUSÊNCIA DE PROVA - OFENSA À LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA NÃO CONFIGURADA - RECURSO NÃO PROVIDO - 1- A Constituição da república veda a publicidade com nomes, símbolos e imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos. A lei nº 8.429, de 1992, por sua vez, prevê as hipóteses de publicidade autopromocional. 2- Para configurar a prática de improbidade administrativa, é necessário que o agente tenha atuado com má-fé além de auferir proveito próprio. 3- Ausente a prova de má-fé bem como de proveito próprio do agente público e não configurada qualquer das hipóteses legais de publicidade autopromocional, não está configurada a suposta improbidade administrativa. 4- Apelação cível conhecida e não provida, mantida a sentença que rejeitou a pretensão inicial.” (TJMG - AC 1.0105.07.213849-5/001 - 2ª C.Cív. - Rel. Caetano Levi Lopes - J. 09.09.2008).

Então, embora se respeite a opinião do Ministério Público nesta demanda, tenho que a sentença está acertada ao julgar improcedentes os pedidos iniciais.

De resto, a tese de ocorrência de dano ao erário público pela circulação dos novos símbolos em meio às placas e impressos municipais, data vênia, não se mostra aceitável, posto que o município só ganhou com a divulgação efetivada pelos impressos, placas, etc., como já frisado.

Por último, no que pertine à condenação do Ministério Público em honorários e custas, deve ser excluída da sentença na medida da seguinte orientação jurisprudencial do STJ:

“PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - CONDENAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS OU CUSTAS - NÃO CABIMENTO, SALVO NA OCORRÊNCIA DE MÁ-FÉ - 1. A ação de improbidade administrativa é ação com assento constitucional (art. 37, § 4º) destinada a tutelar interesses superiores da comunidade e da cidadania. Embora com elas não se confunda, assemelha-se, sob esse aspecto finalístico, à ação popular (CF, art. 5º, LXXIII e Lei 4.717/65), à ação civil pública destinada a tutelar o patrimônio público e social (CF, art. 129, III e Lei 7.347/86, art. 1º) e, em face do seu caráter repressivo, à própria ação penal pública. 2. Em nosso sistema normativo, incluída a constituição, está consagrado o princípio de que, em ações que visam a tutelar os interesses sociais dos cidadãos, os demandantes, salvo em caso de comprovada má-fé, não ficam sujeitos a ônus sucumbenciais. Espelham esse princípio, entre outros dispositivos, o art. 5º,incisos LXXIII e LXXVII da constituição e o art. 18 da Lei 7.347/85. Assim, ainda que não haja regra específica a respeito, justifica-se, em nome do referido princípio, que também em relação à ação de improbidade o ministério público fique dispensado de ônus sucumbenciais, a não ser quando comprovada a abusividade de sua atuação. 3. Recurso Especial provido. (STJ - RESP 200301307786 - (577804 RS) - 1ª T. - Rel. Min. Teori Albino Zavascki - DJU 14.12.2006 - p. 250).

Destarte, de ofício (pois decorre da Lei e da própria conclusão do julgado, não havendo qualquer mácula ao efeito devolutivo) deve ser excluída a condenação do parquet na sucumbência, porque incabível na medida em que a sentença não afirmou a litigância de má fé do órgão ministerial.

ISTO POSTO, VOTO NO SENTIDO DE NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, E, DE OFÍCIO, EXCLUIR A CONDENAÇÃO DO APELANTE MINISTÉRIO PÚBLICO QUANTO À SUCUMBÊNCIA.

É COMO VOTO.


III - O DISPOSITIVO:

ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E EXCLUIR, DE OFÍCIO, A CONDENAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO QUANTO À SUCUMBÊNCIA, nos termos da fundamentação.

Presidiu o julgamento o Senhor Desembargador ROSENE ARÃO DE CRISTO PEREIRA (com voto). Votaram com o relator o Senhor Desembargador Presidente e o Senhor Desembargador ADALBERTO JORGE XISTO PEREIRA.

Curitiba, 22 de setembro de 2009.







ROGÉRIO RIBAS - Relator
Juiz de Direito Substituto de 2º Grau


1 Em substituição ao Desembargador JOSÉ MARCOS DE MOURA.
2 STJ - Súmula 329 - O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio público.
3 Acesso à internet em 18.08.2009.
4 Idem, acesso em 18.08.2009.
5 Veja-se a ementa do acórdão:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO MUNICIPAL. UTILIZAÇÃO DE GRAVAÇÃO DE FRASE EM BENS PÚBLICOS, MARCANDO A ADMINISTRAÇÃO, E AINDA, GRAVAÇÃO DAS LETRAS INICIAIS DO NOME DO PREFEITO PARA IDENTIFICAR OBRAS E BENS PÚBLICOS. FATOS OCORRIDOS EM DOIS MANDATOS. INDISFARÇÁVEL INTENTO DE PROMOÇÃO PESSOAL. DOLO EVIDENTE NESSE SENTIDO. FATOS INCONTROVERSOS. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA CARACTERIZADA, COM VIOLAÇÃO AO ‘PRINCÍPIO DA IMPESSOALIDADE’ PREVISTO NO ART. 37 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TIPIFICAÇÃO DOS ATOS IMPROBOS NO ART. 11 DA LEI 8429/92. SENTENÇA CORRETA AO JULGAR PROCEDENTE A DEMANDA. PRESCRIÇÃO AFASTADA. CONDUTA COM EFEITOS PERMANENTES. PENALIDADES BEM DOSADAS, RESPEITANDO O ‘PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE’. OBRIGAÇÃO DE FAZER. ‘ASTREINTE’ MANTIDA, MAS EM VALOR MENOR. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS REDUZIDOS. TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA MANTIDO, POIS BENÉFICO AO APELANTE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1 - Este Tribunal já decidiu que “A publicidade na qual se usa um símbolo genérico, de forma ostensiva e intensiva, sem que se vise um fim ou campanha específica com caráter educativo, informativo ou de orientação social, acaba por caracterizar promoção pessoal do Prefeito Municipal, devendo ser vedada por ferir o princípio da pessoalidade, legalidade e moralidade” (TJPR - 4ª C.Cível - RN 0384884-2 - J. 03.12.2007). 2 - No caso dos autos, o ex-prefeito ‘marcou’ as suas duas administrações com a utilização de frase identificadora, e ainda com as iniciais de seu nome gravadas em bens públicos (como se criasse um símbolo ou logomarca), agindo com indisfarçável intento doloso de promoção pessoal, merecendo punição nos termos da lei de improbidade (Lei 8429/92, art. 11), pois violou flagrantemente o ‘princípio constitucional da impessoalidade’, a nortear a administração pública em todos os níveis.
(TJPR - 5ª C.Cível - AC 0520823-9 - Laranjeiras do Sul - Rel.: Juiz Subst. 2º G. Rogério Ribas - Unanime - J. 17.02.2009)