9.11.09

Apelação cível - UEM

APELAÇÃO CÍVEL Nº 361.272-4 - DE MARINGÁ - 6ª VARA CÍVEL
APELANTE: ABEL CHIGUEIRA E OUTROS.
APELADO: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ.
RELATOR: Juiz ROGÉRIO RIBAS, Substituto de 2º Grau (1).



Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE SERVIDORES PÚBLICOS DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ. HORAS EXTRAS E BASE DE CÁLCULO. SENTENÇA QUE JULGOU, A UM SÓ TEMPO, UMA AÇÃO CAUTELAR E DUAS AÇÕES ORDINÁRIAS. IMPROCEDÊNCIA DE TODAS EM PRIMEIRO GRAU.

PREMILINAR. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. REUNIÃO DOS PROCESSOS QUE SE MOSTROU CORRETA. EXISTÊNCIA DE CONEXÃO EM FACE DO OBJETO DAS AÇÕES. CONCEITO DO CPC INSUFICIENTE A ALCANÇAR TODOS OS CASOS DE CONEXÃO. DOUTRINA. PRELIMINAR REJEITADA.

MÉRITO. SENTENÇA CORRETA. MANUTENÇÃO.

CAUTELAR. OBJETO QUE SUCUMBE À PRÓPRIA IMPROCEDÊNCIA DA ORDINÁRIA QUE LHE É PRINCIPAL. CAUTELAR PREJUDICADA. SENTENÇA PELA IMPROCEDÊNCIA QUE SE MOSTRA CORRETA.

AÇÃO ORDINÁRIA PRINCIPAL. IMPROCEDÊNCIA EVIDENCIADA NO FATO DE QUE O BENEFÍCIO CONCEDIDO AOS SERVIDORES NÃO GEROU DIREITOS. ILEGALIDADE CONSTATADA NA DISPOSIÇÃO POR MERO ATO ADMINISTRATIVO CONCESSIVO DE VANTAGEM A SERVIDORES AUTÁRQUICOS. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA QUE DEVE SER TRATADA POR LEI ESPECÍFICA, MEDIANTE APROVAÇÃO PRÉVIA EM LEI ORÇAMENTÁRIA. ARTS. 37, X, E 169, DA CONSTITUIÇÃO. APLICABILIDADE. AUTONOMIA DA AUTARQUIA (UNIVERSIDADE) QUE NÃO TEM O CONDÃO DE AFASTAR IMPOSIÇÕES LEGAIS E CONSTITUCIONAIS SOBRE O TRATO COM O DINHEIRO PÚBLICO. ATO ILEGAL E, PORTANTO, NÃO CONVALIDÁVEL. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. IMPROCEDÊNCIA. SENTENÇA CORRETA.

SEGUNDA AÇÃO ORDINÁRIA. BASE DE CÁLCULO DO ADICIONAL DE HORAS EXTRAS. IMPOSSIBILIDADE DE INCIDIREM ADICIONAIS EM CASCATA. VEDAÇÃO AO “BIS IN IDEM”. CONCESSÃO DE VANTAGEM A SERVIDOR QUE DEVE SER CÁLCULADA SOBRE O VENCIMENTO BÁSICO. PRECEDENTES DESTA CORTE. DEMANDA IMPROCEDENTE. SENTENÇA ESCORREITA.

APELAÇÃO CÍVEL DESPROVIDA.

1. Segundo a melhor doutrina, o conceito de conexão constante do artigo 103 do CPC, é insuficiente e ostenta apenas uma hipótese do fenômeno, sendo possível a verificação de tantas outras hipóteses não alcançadas pela dicção legal;

2. Concessão de vantagem a servidores, mormente onerando-se o orçamento público, por meio de mero ato administrativo, sem qualquer autorização legal e orçamentária, é ato ilegal e dele não se gera direito adquirido a teor do enunciado 473 da Súmula do STF;

3. A jurisprudência desta Corte vai no sentido de que as vantagens a serem concedidas a servidores por meio de cálculo percentual (dentre elas as horas extras), hão de incidir sobre o vencimento básico e não sobre a remuneração, sob pena de se incorrer em vedado efeito cascata ou “bis in idem”.



I - O RELATÓRIO:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos.

Trata-se de Apelação Cível em face de Sentença que julgou concomitantemente os feitos de Ação Cautelar 33/2004, Ação Ordinária 113/2004 (principal em relação à cautelar) e Ação Ordinária 375/2004, todas da Comarca em epígrafe, tendo como autores ABEL CHIGUEIRA E OUTROS e como réu a UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ (UEM).

Em primeiro grau decidiu sua excelência o Magistrado a quo, por revogar a liminar na Cautelar 33/2004, antes concedida (pelo eminente juiz substituto), indeferindo tal medida em definitivo na Sentença, por considerá-la ilegal em face da proibição de pagamento de vantagens por via de liminar contra o Poder Público.

Houve por bem, também, sua excelência, julgar improcedente a ação principal (Ordinária 113/2004); ao que negou o direito dos servidores da Autarquia Universitária UEM em permanecer recebendo as tais “horas extras diferenciadas”, (horas noturnas, horas diurnas e horas referentes a finais de semana e feriados), as quais foram instituídas em junho 1994, sendo posteriormente afastadas pela Administração da Autarquia em janeiro de 2004.

Considerou sua excelência que tais verbas pagas de maneira diferenciadas eram ilegais, não prevalecendo a irredutibilidade de vencimentos em face de ilegalidade.

Por fim, também julgou improcedente a demanda Ordinária 375/2004, afastando da composição da base de cálculo das horas extras normais a incidência de qualquer verba adicional, fixando como base para o benefício apenas o “vencimento básico” dos servidores.

Condenou assim, os autores, no pagamento das custas e honorários, estes fixados em R$ 1.500,00 (fls. 1294-1304).

Irresignados, apelam os servidores autárquicos aduzindo em síntese:

a) Nulidade da sentença pela união de processos não conexos e não continentes;
b) No mérito, que o pagamento da verba diferenciada para horas extras estava incorporada aos salários dos servidores, daí porque não poderia ter sido suprimido;
c) O pagamento não era ilegal, pois a Universidade tem autonomia financeira e poderia conceder as vantagens sem a necessidade de determinação legal;
d) Ainda, que há agressão ao princípio da irredutibilidade de vencimentos e ao direito adquirido dos beneficiários da verba salarial;
e) Aduziram prequestionamento expresso de dispositivos constitucionais e de lei federal.

Ao final, pediram pela reforma da sentença, deferimento de cautelar em definitivo e procedência dos pedidos ordinários (fls. 1305-1322).

Contra-razões pela Universidade, aduzindo em síntese:

a) Não há nulidade na sentença pelo julgamento conjunto, pois é caso de conexão;
b) Não há direito adquirido às verbas, pois não havia lei assim autorizando;
c) Não é cabível retroatividade de qualquer verba ilegal, mormente aquelas atingidas pela prescrição qüinqüenal;
d) A prestação de servidos extraordinários é regulada pela Lei Estadual 6.174/70 e pelo Decreto 2.813/00, não sendo previsto o pagamento diferenciado e nem a incidência de adicionais em acúmulo;
e) Não há direito adquirido a regime estatutário, por isso não cabe sustentar a imutabilidade do regime dos servidores ainda que mais benéfico;
f) A autonomia universitária não dispensa a incidência de lei para o caso de aumento de despesa pública;
g) O Poder Público pode anular seus próprios atos quando nulos, ou revogá-los quando inoportunos e inconvenientes;
h) Segundo a LDB a autonomia universitária está limitada pela Lei.

Pediu a manutenção da sentença, portanto (fls. 1331-1344).

Recurso recebido e preparo recursal realizado (fl. 1325).

Subiram os autos e foi determinada a diligência no sentido de intimar o Ministério Público em Primeiro Grau para manifestação (fl. 1395).

Cumprida a diligência, nesta instância a d. Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento parcial do reclamo recursal, para o fim de não recompor a verba, no entanto, respeitar a irredutibilidade nominal da remuneração dos servidores (fls. 1406-1415).

Os autos vieram, então, conclusos a este magistrado por força de designação da d. Presidência do Tribunal de Justiça no Protocolo n. 247.345/2009.

É o relatório.

II - FUNDAMENTAÇÃO E VOTO:

Conheço do recurso, pois estão presentes os pressupostos legais de admissibilidade.

Os autos são compostos de três ações: uma cautelar e duas ordinárias, as quais, contudo, comportam julgamento conjunto em apelo único, já que decididas em uma só sentença capitulada.

DA PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA.

Inicialmente, há de se analisar a argüição da parte recorrente, no sentido de que haveria suposta nulidade na sentença, em razão da reunião equivocada de processos, os quais não seriam nem conexos e nem continentes.

Não merece guarida a preliminar.

É que, independente da alegação de ter a própria parte autora pedido pela tal reunião dos processos --- o que levaria talvez a aplicar o princípio geral do Direito de que não se alega em benefício próprio a própria torpeza (nemo auditur turpitudinem suam allegans) --- o fato é que as ações são sim conexas, sendo de todo acurado o preceder do DD. Juízo “a quo” em reuni-las para julgamento conjunto.

Não se há de olvidar que a mera identidade entre pedido e causas de pedir constitui sim hipótese de conexão, mas não é a única hipótese, pois é sabidamente falha a dicção legal nesse sentido (art. 103, do CPC2), como afirma a quase unanimidade da doutrina.

Nesse sentido, BARBOSA MOREIRA3 cita outros exemplos de conexão os quais fogem à mera dicção do CPC, falando de uma verdadeira flexibilização do conceito de conexão:

“A mesma flexibilização do conceito é vista na jurisprudência. Há julgados que admitem que “quando duas ações tem fundamento no mesmo contrato, há identidade de causas e, pois, conexão (RP 3/330, em. 51), como por exemplo, “entre ação para cumprimento e ação para anulação do contrato” (...). Há outros exemplos, tais como: conexão entre ação de alimentos e ação de modificação de guarda do alimentando; (...) conexão entre ação de usucapião e reivindicatória (...); conexão entre ação renovatória de locação e ação revisional de aluguel (...)”;

Nessa toada, FREDIE DIDIER JR4 traz a seguinte reflexão:

“Dois ou mais processos podem, ainda, ser semelhantes: embora não idênticos, podem manter um vínculo de semelhança, em razão, por exemplo, da parcial identidade dos elementos que compõem o seu objeto litigioso (mérito)”.

Nesses termos, ainda que alegue a parte autora não serem exatamente os mesmos autores em todas as demandas conjuntamente solucionadas, isto não importa nulidade da sentença pelo tão só julgamento conjunto. Isso porque a matéria de Direito é o que vale no presente caso, matéria esta salutarmente unificada em um só ato judicial decisório, exatamente pela relação existente entre as demandas (já que uma trata de horas extras e outra sobre a base de cálculo das horas extras); não havendo assim prejuízo algum a ser socorrido em decretação de nulidade.

Rejeitada a preliminar, portanto.

DO MÉRITO - JULGAMENTO CONJUNTO DAS AÇÕES.

No mérito, o recurso de apelação está a merecer desprovimento parcial, em que pese o profícuo parecer exarado pela douta Procuradoria Geral de Justiça, no sentido do acolhimento parcial.

Primeiro, no que pertine ao objeto da Ação Cautelar 33/2004(5), este deverá sucumbir à solução a ser dada neste acórdão ao processo principal da Ordinária 113/2004; isto porque, deve ser mantida a improcedência da citada ação, em face dos fundamentos a seguir tratados, daí por que caduca completamente a cautelar, dependente do mérito da principal.

Pois bem, o objeto da Ação Ordinária 113/2004, em síntese, vai contra a suspensão operada pela Administração da Autarquia Universitária, no sentido de afastar ato do Reitor da Universidade (dado em 1994) que concedia aos servidores “Horas Extras Diferenciadas”, conforme fossem prestadas durante o dia, à noite, ou em feriados ou finais de semana.

Esta diferenciação trouxe benefício pecuniário aos servidores (vigias noturnos), daí porque a alegação de que a ora suspensão (dada em 2004) significa redução ilegal de salário e quebra do direito adquirido.

Pois bem, não assiste razão ao reclamo recursal, eis que, claramente, se está diante de um ato ilegal6 (concessão de vantagem a servidor sem previsão em lei), o qual, em que pese tenha gerado efeitos por longo tempo, não tem o condão de gerar direito adquirido; podendo sim a Administração anulá-lo, em conta do Poder de Auto-tutela de que dispõe.

Nesse sentido, é clara a Súmula 473 do STF7, segundo a qual os atos ilegais não geram direito, sendo protegidos pelo direito adquirido apenas atos passíveis de revogação (isto é, os atos inoportunos ou inconvenientes ao interesse público).

Nesse sentido:

“ADMINISTRATIVO. O ATO ILEGAL DA ADMINISTRAÇÃO NÃO GERA DIREITOS ADQUIRIDOS. REVISÃO A QUALQUER TEMPO. I - O ato ilegal da administração não gera direitos adquiridos, ainda que o servidor não tivesse agido de má-fé, podendo ser revisto a qualquer tempo. (...)”. (TRF 1ª Região - AMS 1997.01.00.040704-7/GO, Rel. Juiz Tourinho Neto, Terceira Turma,DJ p.82 de 30/09/1999);

“(...) O ato administrativo ilegal não gera direito adquirido, sendo dever da administração a sua anulação (...).” (TRF 4ª Região - Apelação em Mandado de Segurança 10419 PR 2001.04.01.010419-0 - Relator(a): TAÍS SCHILLING FERRAZ - Julgamento: 28/05/2002 - Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA - Publicação: DJ 03/07/2002)

A ilegalidade do ato em questão é, aliás, evidente, pois decorre de infração expressa a mandamento constitucional, já que a referida concessão diferenciada da vantagem decorrente de prestação de horas extras se deu (em 1994) por simples ato do então Reitor, o que não se admite; pois é vedado realizar qualquer aumento de despesa pública sem lei autorizadora; máxime quando se concede vantagem a majorar remuneração de servidores.

É o que dispõe, de forma clara, o incido X do artigo 37 da Constituição Federal8, pois a “remuneração” de servidores (vencimento, mais vantagens) há de ser sempre alterada por “lei específica”.

E mais, em se tratando de aumento de despesa pública, incide a regra do artigo 169, §1º da Lei Maior9, exigindo-se prévia dotação orçamentária e autorização na Lei de Diretrizes Orçamentárias, mesmo em se tratando de Autarquia, como é o caso dos autos.

Frise-se que, mesmo em se tratando de Universidade, espécie de Autarquia dotada de “autonomia”, não se há de afastar as regras legais e constitucionais atinentes ao trato com a coisa pública; isso porque “autonomia universitária”, mormente no campo financeiro, não significa libertinagem com o dinheiro público; apenas quer dizer que a entidade universitária tem discricionariedades, podendo definir as áreas prioritárias a que irá destinar o seu orçamento, que é próprio, não sofrendo ingerência do Poder Central.

Por outras palavras: A autonomia universitária não é absoluta, sendo alcançada por todas as regras cogentes do Direito Administrativo e do Direito Constitucional, nesse sentido leciona PINTO FERREIRA10:

“A autonomia plena não significa o poder de tudo fazer, mas ela mesma está condicionada pelos limites com que a legislação a enclausurou, estabelecendo competências privativas e exclusivas tanto para a universidade como para as suas unidades integrantes”.

Na mesma linha decidiu o Superior Tribunal de Justiça:

“(...) A autonomia universitária, prevista no art. 207 da constituição federal, não pode ser interpretada como independência e, muito menos, como soberania. A sua constitucionalização não teve o condão de alterar o seu conceito ou ampliar o seu alcance, nem de afastar as universidades do poder normativo e de controle dos órgãos federais competentes. (...)” (MS 3318/DF, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 31.05.1994, DJ 15.08.1994 p. 20271)

Nessa razão, não há direito adquirido dos servidores às horas extras diferenciadas (em noturna, diurna ou de fins de semana e feriados), até porque, materialmente, a diferenciação destas remunerações se dá no âmbito do pagamento de adicionais, conforme disciplina da lei de regência, bem lembrada, neste ponto, pela doutra Procuradoria Geral de Justiça (fl. 1413):

“Ora, o artigo 53 da Lei 6174/70, em seu inciso II, trata do regime de trabalho da natureza daquele desenvolvido pelos apelantes. E o artigo 172 cuida da gratificação pela prestação do serviço extraordinário (inciso II), periculosidade (inciso XI. Quanto à remuneração do trabalho noturno superior ao diurno (art. 7º, IX, CF), além da previsão constitucional, também está regulado no Decreto 2813 de 26.09.00, que além disso, cuida da remuneração pelo serviço extraordinário”.

Assim sendo, a disciplina a ser aplicada às horas extras é a legal, já existente, sendo a diferenciação quanto a horários de trabalho, matéria a ser tratada em sede de adicionais e não diferenciada em espécies diferentes de horas extras; não sendo, de forma alguma, possível a modificação dos parâmetros por via de mero ato administrativo do dirigente da autarquia, razão pela qual o benefício estipulado em 1994 era ilegal e não gerou direito adquirido algum.

Nesta senda, correta a decisão “a quo” ao julgar improcedente a Ação Ordinária n. 113/2004.

Por fim, no que se refere à Ação Ordinária n. 375/2004, também não merece acolhida o recurso.

Com efeito. O objeto desta demanda é o acerto da base de cálculo das horas extras pagas aos autores da demanda; pois se alega estar o percentual incidindo sobre o vencimento básico, quando na verdade, deveria incidir sobre este, somado aos adicionais por tempo de serviço, por risco de vida e noturno, além do que não poderia o adicional de horas extras estar limitado a 50% do vencimento básico, mas sim da remuneração.

Esta, portanto, é uma matéria de Direito, que, aliás, pontualmente já foi tratada por esta Corte, a exemplo dos seguintes excertos, verbis:

“(...)ALEGAÇÃO DE QUE NÃO PODE SER INCLUÍDO O ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO PARA O CÁLCULO DA REMUNERAÇÃO DA HORA EXTRA. ALEGAÇÃO PROCEDENTE. OCORRÊNCIA DE “BIS IN IDEM”. EFEITO CASCATA QUE DEVE SER EVITADO. CÁLCULO DA HORA EXTRA QUE DEVE SER FEITO COM BASE NA REMUNERAÇÃO BÁSICA, SEM OS ADICIONAIS POR TEMPO DE SERVIÇO. APELAÇÃO PROVIDA NESTE ASPECTO POR MAIORIA. Para que se evite o “bis in idem” ou “efeito cascata”, não deve ser incluído na base de cálculo da hora extra, qualquer vantagem ou adicional da remuneração básica”. (TJPR - 4ª C.Cível - AC 0323997-2 - Londrina - Rel.: Des. Marcos de Luca Fanchin - Por maioria - J. 16.05.2006).

“INCIDÊNCIA DO PERCENTUAL DE 50% (CINQÜENTA POR CENTO) A TÍTULO DE HORAS EXTRAS SOBRE A HORA NORMAL. CÁLCULO DA HORA EXTRA QUE DEVE SER FEITO COM BASE NO VENCIMENTO BÁSICO. (PRINCÍPIO DA LEGALIDADE). IMPOSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DE REFLEXOS, ADIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO, BEM COMO INCORPORAÇÃO PARA FINS DE APOSENTADORIA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO”. (TJPR - 5ª C.Cível - AC 0357430-7 - Guarapuava - Rel.: Des. Luiz Mateus de Lima - Unanime - J. 16.01.2007).

Por conseguinte, está claro que esta Câmara, bem como a 4ª Câmara Cível, não acolhem a tese dos autores, pois consideram que é vedado o “bis in idem” na concessão das vantagens percentuais ao servidor, daí porque não podem os adicionais incidirem em efeito “cascata”.

Aliás, essa é razão da composição da remuneração do servidor público em vencimento mais remuneração, pois o primeiro é a base de cálculo para os “penduricalhos”, todos os quais, somados, formatam o salário final a ser pago pela Administração.

Veja-se (paralelamente) que esta foi razão que levou a Suprema Corte a fixar que as vantagens --- concedidas aos servidores beneficiários do abono de salário mínimo (aquele pago para o fim de atingir o mínimo legal) --- incidem não sobre a soma do salário (vencimento + abono), mas sim sobre o vencimento básico unicamente, ainda que este seja inferior ao salário mínimo nacional.

É o que se extrai do RE 439.360-3 (11), que serviu de base para a edição da Súmula Vinculante n. 15 do STF.

Nesse sentido, para evitar o “bis in idem” e o efeito “cascata” na remuneração de servidores, conclui-se que não merece acolhida o presente recurso, sendo imperativo manter-se a d. sentença que julgou improcedente a Ação Ordinária 375/2004.

ISTO POSTO, afastando as teses recursais em todos os processos aqui reunidos (Ação Cautelar 33/2004, Ação Ordinária 113/2004 e Ação Ordinária 375/2004), todos de Maringá, VOTO no sentido de negar provimento à apelação cível, ficando mantida a d. sentença, tal como posta.

É COMO VOTO.


III - O DISPOSITIVO:

ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO CÍVEL, nos termos da fundamentação.

Presidiu o julgamento o Senhor Desembargador ROSENE ARÃO DE CRISTO PEREIRA (com voto). Votaram com o relator o Senhor Desembargador Presidente e o Senhor Desembargador ADALBERTO JORGE XISTO PEREIRA.

Curitiba, 27 de outubro de 2009.





ROGÉRIO RIBAS - Relator
Juiz de Direito Substituto de 2º Grau




1 Em substituição ao Desembargador JOSÉ MARCOS DE MOURA.
2 Art. 103. Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando Ihes for comum o objeto ou a causa de pedir.

3 In. Comentários ao Código de Processo Civil. 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, v. 1, p. 465.

4In. Curso de Direito Processual Civil. V1. 9ª ed. 2008: p. 131;

5 Anoto, para esclarecimento, que a questão sobre a revogação da liminar nesta Cautelar não é objeto do apelo, pois fora apenas requerido juízo de retratação ao eminente Magistrado, a quo (o qual foi negado), não constando em nenhum momento das razões da apelação.

6 Frise-se que não se está a falar da justiça ou não do referido critério para pagamento de horas extras, mas tão somente do fato de que não poderia ter sido lançado sem a previa autorização legal, e mais, orçamentária.

7 STF - SÚMULA Nº 473: A ADMINISTRAÇÃO PODE ANULAR SEUS PRÓPRIOS ATOS, QUANDO EIVADOS DE VÍCIOS QUE OS TORNAM ILEGAIS, PORQUE DELES NÃO SE ORIGINAM DIREITOS; OU REVOGÁ-LOS, POR MOTIVO DE CONVENIÊNCIA OU OPORTUNIDADE, RESPEITADOS OS DIREITOS ADQUIRIDOS, E RESSALVADA, EM TODOS OS CASOS, A APRECIAÇÃO JUDICIAL.
8 X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) (Regulamento)

9 Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.
§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: (Renumerado do parágrafo único, pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

10 PINTO FERREIRA, Comentários à Constituição Brasileira, 7° volume, Art.s, 193 a 245, ADCT - Art., 1° a 70 - EC.1/92, 2/92, 3/93, 4/93, ECR-1/94, 2/94, 3194, 4194, 5/94, 6/94, Editora Saraiva, São Paulo, 1995, pág, 207
11 SERVIDOR PÚBLICO: SALÁRIO MÍNIMO. 1. É da jurisprudência do STF que a remuneração total do servidor é que não pode ser inferior ao salário mínimo (CF, art. 7º, IV). 2. Ainda que os vencimentos sejam inferiores ao mínimo, se tal montante é acrescido de abono para atingir tal limite, não há falar em violação dos artigos 7º, IV, e 39, § 2º, da Constituição. 3. Inviável, ademais, a pretensão de reflexos do referido abono no cálculo de vantagens, que implicaria vinculação constitucionalmente vedada (CF, art. 7º, IV, parte final). (Relator: Ministro Sepúlveda Pertence - Julgado em 09/08/2005)