7.1.10

Apelação cível - IML de Maringá

APELAÇÃO CÍVEL Nº 571.577-1 DA COMARCA DE MARINGÁ - 4ª VARA CÍVEL.

APELANTE - Ministério Público do Estado do Paraná
APELADO - Município de Maringá

RELATORA - Desª. Lélia Samardã Giacomet

REVISOR - Desª. Regina Afonso Portes


APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - INSTITUTO MÉDICO LEGAL DE MARINGÁ - INSTALAÇÕES INDIGNAS E INSALUBRES - PRETENSÃO DE EXECUÇÃO DE OBRAS PARA SANAR IRREGULARIDADES APONTADAS ATRAVÉS DE PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO INSTAURADO PELA PROMOTORIA DE DEFESA DO CONSUMIDOR, GARANTIAS CONSTITUCIONAIS, SAÚDE PÚBLICA E DA SAÚDE DO TRABALHADOR DE MARINGÁ - POSSIBILIDADE - AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA INDEPENDÊNCIA DOS PODERES - APLICAÇÃO ART. 196, CF - DIREITO À SAÚDE - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.



VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível sob nº 571.577-1 da 4ª Vara Cível da Comarca de Maringá, em que é apelante Ministério Público do Estado do Paraná e apelado Município de Maringá.


I - RELATÓRIO:

Tratam os presentes autos de Ação Civil Pública sob nº 465/2005, com pedidos liminares e preceito cominatório de obrigação de fazer, proposta pelo Ministério Público do Estado do Paraná, em face do Estado do Paraná e Município de Maringá.

Segundo narra a inicial, em síntese: (a) em novembro de 2002, o autor instaurou procedimento investigatório com objetivo de apurar as condições de segurança e higiene, as instalações e o modo de funcionamento das empresas funerárias e do IML, todos da cidade de Maringá; que o edifício onde funciona o IML pertence ao Município;

(b) os estabelecimentos investigados foram notificados para que dentro de determinado prazo sanassem as irregularidades apontadas;

(d) as empresas funerárias se ajustaram às exigências da Vigilância Sanitária, do Corpo de Bombeiros e do Ministério do Trabalho;

(e) o IML não cumpriu as exigências no prazo;

(f) o Corpo de Bombeiros e a Vigilância Sanitária realizaram vistorias no IML e detectaram graves irregularidades.

Requereu a concessão de medida liminar para o fim de suspender a realização de qualquer exame pericial (corpo de delito) ou perícia médica em pessoas vivas naquele local, concedendo-se prazo para adequação das normas de proteção a vida e a saúde dos trabalhadores que lá se encontram, intimando os requeridos para a adequação, sob pena de interdição total das instalações do IML de Maringá, impedindo a entrada e permanência de qualquer usuário em suas dependência, até julgamento do pedido principal.

Pugna, a final, pela total procedência da ação, para que seja decretada a interdição do IML, até a adequação do local segundo as normais legais do Corpo de Bombeiros, Vigilância Sanitária, Ministério do Trabalho, etc..., para que tenha condições de receber usuários e servidores públicos que lá prestam serviços, sem riscos à vida e saúde, e ao pagamento de multa no valor de R$ 50.000,00 em caso de descumprimento da decisão.

Foram juntados os documentos de fls. 39 a 236.

Liminar deferida à fl. 238/239, em 27 de junho de 2005, para o fim de determinar que:
“ a) os requeridos, em dez dias, saneiem e eliminem todas as irregularidades acusadas na inicial, e comprovem, nos autos, que o fizeram;
b) não sendo atendida a determinação supra, independentemente de qualquer outra deliberação ou intimação, ao fim do prazo de dez dias cessem os requeridos todo e qualquer atendimento ao público naquele local, inclusive e especialmente exames periciais ou perícias médicas em pessoas vivas;
c) enfim, não sendo saneadas todas as irregularidades acusadas na inicial dentro de trinta dias, independentemente de qualquer outra deliberação ou intimação, cessem os requeridos toda e qualquer atividade naquele local, que permanecerá interditado até decisão em contrário, deste juízo ou de autoridade superior” (fl. 239)

Em 17 de agosto de 2005, referida liminar foi suspensa por esta Corte (fls. 263/267 e 270/305)

Após o regular trâmite do processo, o d. juiz “a quo” sentenciou o feito (fls. 417/420), oportunidade em que julgou improcedente o pedido inicial por entender que “ prover o pedido inicial implicaria em ofender o princípio da independência dos poderes.”, e julgou improcedente o pedido inicial, extinguindo o processo na forma do artigo 269, I, do CPC, sem condenação sucumbencial.
O Ministério Público do Estado do Paraná, irresignado, interpôs recurso de apelação (fls. 421/428), argüindo, em síntese, que:

(a) a ação proposta visa apenas interditar o Instituto Médico Legal de Maringá, e não obrigar o Estado a gastar dinheiro público para melhoria do serviço prestado por aquele estabelecimento;

(b) as atividades exercidas no IML oferecem riscos aos seus freqüentadores e funcionários, visto que não foram sanadas as irregularidades detectadas em suas dependências;

(c) a adequação do serviço público deve ser garantida e tutelada pelo Estado, conforme preconiza a lei, e não simplesmente ser promovida quando há sobras de recursos públicos;

(d) quando da instalação do IML, o Estado deveria ter previsto que determinados valores, advindos da arrecadação de tributos, precisariam ser empregados na manutenção deste serviço;

(e) os apelados não comprovam que há outras prioridades na aplicação dos recursos públicos;

(f) a reserva do possível, uma vez alegada, deve ser devidamente comprovada, para que não se torne mero instrumento retórico para justificar a não efetividade de um direito constitucional;

(g) é certo que não cabe ao Judiciário a criação de políticas públicas, mas tem ele a responsabilidade de compelir a execução daquelas políticas já estabelecidas nas leis constitucionais ou ordinárias, ou seja, cabe ao Judiciário controlar a falta de qualidade das prestações dos serviços básicos e ordenar a concretização de políticas sociais eficientes, não permitindo que as decisões da Administração Pública se afastem dos fins almejados pela Constituição.

Por fim, pleiteia a reforma in totum da decisão monocrática, com a conseqüente procedência da ação proposta.

O recurso interposto foi recebido apenas no efeito devolutivo, por aplicação a contrario sensu do art. 14 da Lei nº 7.347/1985. Na sequência as partes apresentaram suas contrarrazões às fls. 430/440 e 442/446.

Encaminhados à Douta Procuradoria Geral de Justiça, esta se manifestou (fls. 458/466) pelo provimento do recurso, uma vez que está provado nos autos que as irregularidades no IML de Maringá ainda não foram sanadas, estando totalmente sem condições de uso, devendo assim a sentença ser integralmente reformada.

É o relatório.

II - VOTO:

Presentes os pressupostos recursais de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido. No mérito, consoante será oportunamente analisado, o seu desprovimento se impõe.

O Ministério Público do Estado do Paraná, por seu ilustre Representante junto à Comarca de Maringá, ajuizou ação civil pública contra o Estado do Paraná, objetivando a interdição do Instituto Médico Legal local até que fossem implementadas as reformas pretendidas pelo agente ministerial, embasadas em vistorias realizadas pelas autoridades competentes..

Um dos principais objetivos da presente demanda é a possível defesa dos interesses da população, mais precisamente das pessoas residentes em Maringá, cujo município não conta com um Instituto Médico Legal com instalações adequadas e seguras aos freqüentadores e funcionários do local.

Segundo o autor, os serviços prestados pelo IML, estão sendo executados de maneira precária. Isso, por deficiência e ausência de instalações adequadas, pelo que relatado ficou, em decorrência não só da omissão, como da ação indevida do Poder Executivo do Estado do Paraná.

Conforme Relatório de Inspeção, foram detectadas várias irregularidades, como por exemplo :

a) estrutura física: ausência de projeto de tratamento de águas residuais ( esgotos);
b) na sala de exame clínico: ausência de saco branco leitoso para descarte de resíduo infectante:
c) na sala de necropsia : ausência de lixeira com tampa e acionamento a pedal, para o descarte de resíduos infectantes; ausência de recipiente rígido e identificado para o descarte de materiais perfuro-cortantes; ausência de procedimentos e equipamentos para desinfecção e esterilização de materiais e instrumentais ( estufa e autoclave);
d) na sala de verificação de óbito: ausência de sistema de drenagem de fluídos e secreções corpóreas, bem como, de água resultante da limpeza e higienização da mesa utilizada nesta sala;
e) resíduos: não possui Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde de acordo com a Resolução RDC nª 306/2004 ( ANVISA) e Diretrizes para elaboração e apresentação de plano disponível na Vigilância Sanitária.

Algumas reformas foram realizadas e sanadas algumas irregularidades, mas na vistoria realizada antes da prolação da sentença, pela Vigilância Sanitária (fls. 400/402), e pelo Corpo de Bombeiros (fls. 398/399), vários problemas não foram sanados.

Ou seja, as obras realizadas pelos requeridos não resolveram os vícios existentes no Instituto Médico Legal de Maringá, vícios estes que podem afetar diretamente e indiretamente a saúde dos funcionários, usuários, transeuntes e da população de Maringá.

Quanto à questão que cuida da distribuição dos poderes do Estado, dado que, como preceitua o artigo 2º da Constituição da República, os Poderes são independentes e harmônicos entre si, a Carta atribuiu a cada Poder funções específicas; tal regra vem contemplada, nos mesmos termos, no artigo 7º da Constituição do Estado do Paraná. Por isso, a interferência de um no quadro das atribuições do outro, não pode comportar atos de intromissão, ficando reservado o exercício do respectivo Poder, nos limites de sua competência.
Indaga-se, pois, se ao Poder Judiciário, por intermédio da ação civil pública, compete impor a execução de providências que se enquadram dentro dos critérios de conveniência e oportunidade, estes de aferição privativa do Poder Executivo?

Em resposta a tal indagação, afirma Sylvia Zanella Di Pietro, que a ação civil pública não constitui, a rigor, meio específico de controle da administração pública, mas como ela, tem como legitimado passivo todo aquele que causar dano a algum interesse difuso, poderá eventualmente ser proposta contra o próprio Poder Público, quando ele for o responsável pelo dano. (in “Direito Administrativo” - Ed. Atlas, 4ª edição - página 533).

Não se pode desconsiderar que os atos administrativos, especialmente os que se enquadram como “discricionários”, entendidos como aqueles para os quais o regramento legal não atinge todos os aspectos da atuação administrativa, ficando a cargo do administrador a adoção de uma ou de outra solução segundo critérios da oportunidade e da conveniência, porque não definidos em lei, estão sujeitos ao controle jurisdicional. Contudo, nos ditos atos discricionários, tal controle fica limitado exclusivamente aos aspectos da legalidade e moralidade, não podendo o Juiz examinar os aspectos da oportunidade e da conveniência da prática ou não desses atos, devendo respeitar a discricionariedade administrativa, nos limites em que ela é assegurada pela lei.

Maria Sylvia Zanella di Pietro (obra citada), esclarece que:

“Isto decorre precisamente pelo fato de ser a discricionariedade um poder delimitado previamente pelo legislador; este, ao definir determinado ato, intencionalmente deixa um espaço para livre decisão da administração pública, legitimando previamente a sua opção, qualquer dela será legal. Daí porque não pode o Poder Judiciário invadir esse espaço reservado, pela lei, ao administrador, pois, caso contrário, estaria substituindo por seus próprios critérios de escolha, a opção legítima feita pela autoridade competente com base em razões de oportunidade e conveniência que ela, melhor do que ninguém, pode decidir diante de cada caso concreto. A rigor, pode-se dizer que, em relação ao ato discricionário, o Judiciário pode apreciar os aspetos da legalidade e verificar se a administração não ultrapassou os limites da discricionariedade”.

Entretanto, a relevância dos pedidos formulados pelo autor, mas acima da preocupação em relação à busca da eficiência nos serviços prestados pelo Instituto Médico Legal de Maringá, deve-se levar em conta que : “ A saúde é um direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. “ (CF art. 196 ).

Considerando que os pedidos formulados pelo Ministério Público nesta ação buscam a defesa pela vida digna e pela saúde, pode o Poder Judiciário, sem entrar na esfera do Poder Executivo, determinar que irregularidades nocivas sejam sanadas.

Além disso, é importante considerar que as providências reclamadas pelo Ministério Público estão ligadas diretamente ao direito público subjetivo diretamente ligado à dignidade da pessoa humana, passível de ser enquadradas dentre aquelas que independem de operacionalidade complexa, cuja realização não exige a manifestação de outros órgãos do próprio Estado ou de existência de previsão orçamentária, especialmente porque dizem respeito à manutenção do local, visando regularizar irregularidades sanitárias, posto que prejudiciais à toda a população do município.

Conforme a Procuradoria Geral da Justiça explicou :

“ Enfim, a verdade é que está provado nos autos que o local está sem estrutura, provocando riscos à saúde e à vida das pessoas.
Não obstante isso, é claro que os gastos públicos são efetuados pela oportunidade e conveniência do administrador. Porém, não é isso que se está discutindo nos autos, muito menos querer imputar ao Poder Judiciário a pretensão de definir os investimentos públicos prioritários,mas sim a defesa de um bem maior, que é a vida e a saúde das pessoas que deve ser protegido.”


A programação dessas despesas públicas, consoante norma constitucional, necessariamente deve vir traçada no projeto de lei de diretrizes orçamentárias (art. 165, II, da CF), de iniciativa do Poder Executivo e submetido ao crivo do Legislativo, anualmente.

Portanto, essa questão não pode ser tida como invasão no Poder Executivo pelo Poder Judiciário, uma vez que não se está determinando o valor que deve ser gasto para o cumprimento das determinações da vigilância sanitária, nem o modo como elas devem ser realizadas .

Pelo princípio da independência dos Poderes, ao Executivo competirá vencer as dificuldades na busca da melhoria dos serviços públicos, devendo o Estado e o Município sanar as irregularidades apontadas, seja utilizando de recursos já previstos no orçamento anual, seja prevendo na próxima lei orçamentária valores que sejam suficientes para a realização das obras necessárias.

Quanto ao princípio da reserva do possível, disse a Procuradoria Geral da Justiça, fl. 465 :

“A afirmação de que a reforma do IML ofenderia o princípio da reserva do possível é destituída de sentido. A uma, porque constante da Constituição da República como um dever do Poder Público o atendimento da saúde da população, o Executivo não pode ser furtar em atendê-lo. A duas, porque nada impede que o Estado do Paraná faça os devidos ajustes no orçamento, abrindo créditos suplementares e extraordinários, para fazer frente às reformas que beneficiarão não apenas uma pessoa isoladamente, mas todo a população de Maringá e região.”
De acordo com a Lei Estadual n.º 12.493/99 - que trata da disposição dos resíduos sólidos no Estado do Paraná, visando o controle da poluição da contaminação e a minimização de seus impactos ambientais - em seu artigo 18, parágrafo único impõe aos Municípios a responsabilidade pela execução de medidas para prevenir ou corrigir a poluição e contaminação do meio ambiente em razão do vazamento, lançamento ou disposição inadequada de resíduos sólidos.
Sobre essa obrigação do poder público municipal Luiz Paulo Sirvinkas (SIRVINKAS, Luiz Paulo. Manual de Direito Ambiental, 7.ª ed. - São Paulo : Saraiva, 2009, p. 355-356) destaca:
“Compete ao Poder Público municipal estabelecer planos para a realização de limpeza urbana e manejos de resíduos sólidos. Trata-se de princípio fundamental da Política Nacional de Saneamento Básico. O art. 3.º, I, c, da Lei 11.445/2007, que dispõe sobre as diretrizes nacionais para o saneamento básico, conceitua limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos como o conjunto de atividades, infra-estrutura e instalações operacionais de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destino final do lixo doméstico e do lixo originário da varrição e limpeza de logradouros e vias públicas. Referida lei considera resíduo sólido urbano, por decisão do Poder Público, o lixo originário de atividades comerciais, industriais e de serviços cuja responsabilidade pelo manjeo não seja atribuída ao gerador (art. 6.º da citada lei). (...) A disposição dos resíduos sólidos está relacionada à limpeza pública. Esta, por sua vez, é uma questão de saúde pública. Compete, contudo, à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar, fixando diretrizes gerais, sobre a defesa e a proteção da saúde (art. 24, XII, da CF). No entanto, a tarefa de limpeza pública é atribuída aos Municípios, nos termos do art. 30, I, da CF.”
Desta forma, inegável a responsabilidade do Município de Maringá em adequar a destinação dos resíduos sólidos e líquidos provindos do Instituto Médico Legal, segundo as normas pertinentes, para fins de proteger não só a saúde da população local, mas também o meio ambiente.
Registre-se que na hipótese dos autos o descumprimento dos preceitos constitucionais se mostra ainda mais grave, porquanto partiu do próprio Poder Público Municipal, que se omitiu em cumprir as determinações legais e constitucionais, ocasionando ofensa à saúde da população em geral, sem falar na saúde daqueles que trabalham e transitam pelo Instituo Médico Legal, quando seu dever era justamente o contrário, conforme previsão constitucional.
Logo, como se trata da tutela de direito fundamental difuso, que diz respeito ao direito à saúde da população local e, ao mesmo tempo, a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, impõe-se ao Poder Público a adoção das medidas apontadas pelo Ministério Público Estadual, na presente ação, corroboradas com aquelas estabelecidas pela Vigilância Sanitária, devendo a sentença ser reformada.

Neste sentido já decidiu esta Corte:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DEPÓSITO DE LIXO IRREGULAR - PROCEDÊNCIA - APELAÇÃO - ALEGADA DESCONSIDERAÇÃO DE FATOS SUPERVENIENTES - FATOS DEVIDAMENTE ANALISADOS NA SENTENÇA RECORRIDA - PROVIDÊNCIAS QUE AINDA NÃO FORAM TOMADAS, DECORRIDOS MAIS DE DEZ ANOS DO AJUIZAMENTO DA AÇÃO - MULTA DIÁRIA - REDUÇÃO INCABÍVEL - VALOR SUFICIENTE PARA COMPELIR AO CUMPRIMENTO DAS DETERMINAÇÕES - RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - Ac. 27516 - Ap. Cível 0324339-4 - 4.ª CCv - Rel. Ruy Fernando de Oliveira - DJPR 7348 de 20/04/2007)


DIREITO CONSTITUCIONAL, AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. DEPÓSITO INADEQUADO DE LIXO. TUTELA DO MEIO AMBIENTE. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. PRESENÇA DE TODAS AS CONDIÇÕES DA AÇÃO. (...) DIREITO CONSTITUCIONAL E AMBIENTAL. ILEGALIDADE DA MANUTENÇÃO DE DEPÓSITO DE LIXO A CÉU ABERTO. NECESSIDADE DE ADEQUAÇÃO DO MUNICÍPIO À LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL NO PRAZO FIXADO PELA LEI ESTADUAL Nº. 12.493/1999. a) É ilegal a manutenção de ‘lixão’ a céu aberto, sem adequados acondicionamento, tratamento e destinação final do lixo, com insuficiente sistema de drenagem de chorume, que acaba por contaminar os recursos hídricos, o que afronta não só a legislação ambiental específica, mas o próprio art. 225 da Constituição Federal. b) A Lei Estadual nº. 12.493 de 22 de janeiro de 1999 fixou prazo de 1 (um) ano a contar da data de sua publicação para que os Municípios se adequassem às exigências da lei no que se refere aos cuidados com o lixo. Portanto, o MUNICÍPIO DE MARINGÁ encontra-se em mora, pois, passados 6 (seis) anos da expiração do prazo legal fixado, ainda não providenciou outro local para o depósito do lixo. c) Por essa mesma razão, não pode o Poder Público deixar de providenciar novo aterro alegando descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, especialmente por se estar a tratar de direito fundamental difuso, qual seja, o direito a um meio ecologicamente equilibrado. 3) APELO À QUE SE NEGA PROVIMENTO E SENTENÇA QUE SE MANTÉM EM REEXAME NECESSÁRIO. (TJPR - Ac. 16045 - ApCvReex 0322655-5 - 5.ª CCv - Rel. Leonel Cunha - DJPR 7186 de 18/08/2006)

“No Direito Ambiental, o poder geral de cautela do juiz deve ser norteado pelo princípio da prevalência do meio ambiente (vida), podendo impor ao Poder Público à cessação da atividade danosa, justamente por ser seu dever defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações (art. 225, “caput”, CF). 3. Os ‘’lixões’’ à céu aberto causam sérios danos ao meio ambiente e à saúde da população (...) não podendo o juiz hesitar na utilização dos instrumentos processuais que a lei lhe coloca à disposição.” (Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Agravo de Instrumento Nº 121.684-8, , Rel. Des. Accácio Cambi) - grifo nosso

Este entendimento também é corroborado por outras Cortes:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Liminar - Concessão - Lixo do Município - Destinação de forma adequada - Direito à saúde e ao saneamento - Preservação pelo Judiciário que não significa interferência no Executivo.” (Tribunal de Justiça de São Paulo, Agravo de Instrumento nº. 204-059-1, DJ 19/04/94, in JTJ 157/205).

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DEFESA DO MEIO AMBIENTE. ATERRO SANITÁRIO. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO” (Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Agravo de Instrumento/Acórdão n.º.98.017550-0 3ª Câmara Cível. Rel. Des. Eder Graf).

(TJMG-043557) ADMINISTRATIVO - REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - LIXÃO MUNICIPAL - JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO - POSSIBILIDADE - CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE - PRELIMINAR REPELIDA - DEPÓSITO DE LIXO A CÉU ABERTO QUE JÁ PERDURA POR VÁRIOS ANOS - DANO AMBIENTAL COMPROVADO - COMINAÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM MULTA DIÁRIA - CONSTRUÇÃO DE OBRA PÚBLICA - ATERRO SANITÁRIO CONTROLADO - AUSÊNCIA DE INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO NAS ATRIBUIÇÕES DO PODER EXECUTIVO - CONFIGURAÇÃO DE CONTROLE JURISDICIONAL DAS OMISSÕES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - INTELIGÊNCIA DO ART. 3º, DA LEI Nº 7.347, DE 24/07/1985 - COMINAÇÃO DE PENA PECUNIÁRIA, PARA O CUMPRIMENTO DO PRECEITO - ASTREINTE - CABIMENTO - ART. 11 DA LEI DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA - REDUÇÃO - CUSTAS PROCESSUAIS - ENTE PÚBLICO - ISENÇÃO LEGAL. Sentença confirmada, em reexame necessário, com reparos no dispositivo. (Apelação Cível nº 1.0000.00.352421-2/000, 2ª Câmara Cível do TJMG, Leopoldina, Rel. Brandão Teixeira. j. 22.06.2004, unânime, Publ. 01.07.2004)”.

“TJMS-003927) AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LIXÃO - DECISÃO QUE CONDENOU O MUNICÍPIO A REMOVER O LIXO PARA UM LOCAL ADEQUADO E PREVIAMENTE AUTORIZADO PELO SEMA - PRESENTES OS REQUISITOS AUTORIZADORES DA CONCESSÃO - NECESSIDADE DE DILAÇÃO DE PRAZO PARA A EFETIVAÇÃO DAS MEDIDAS. Correta a decisão, visto que amparada nas normas constitucionais consubstanciadas nos artigos 23, 196 e 225, da Carta Magna, e nas provas carreadas aos autos, dando conta que o lixo urbano é depositado em local inadequado, de permanente risco à sociedade e à conservação do meio ambiente. Com primazia, sendo o Poder Público quem tem o dever de orientar-se, segundo as normas ambientais constitucionais, a ele se impõe a obrigação de adequação de suas providências. No presente caso, em razão da complexidade das medidas a serem tomadas pelo Município, é necessária dilação de prazo, concedidos 180 dias. (Agravo nº 2002.004479-3, 4ª Turma Cível do TJMS, Glória de Dourados, Rel. Des. João Batista da Costa Marques. j. 12.08.2003, unânime).

Por todo o exposto, voto no sentido de dar provimento parcial ao presente recurso de apelação, reformando r. sentença recorrida, para que os requeridos, Estado do Paraná e Município de Maringá, sanem as irregularidades apontadas pela Vigilância Sanitária, Corpo de Bombeiros, e outras que surgirem no decorrer da reforma, no prazo de 1 ( uma) ano, sob pena de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e interdição do estabelecimento.


III - DECISÃO:

ACORDAM os integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em dar provimento parcial ao recurso de apelação cível, nos termos do voto da Desembargadora Relatora.


Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores ABRAHAM LINCOLN CALIXTO, Presidente com voto, e DESª REGINA AFONSO PORTES.


Curitiba, 10 de novembro de 2009.


LÉLIA SAMARDÃ GIACOMET
Desembargadora Relatora