7.1.10

Apelação cível - Ivatuba

APELAÇÃO CÍVEL Nº 466.282-2 - DE MARINGÁ - 2ª VARA CÍVEL

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ.
APELADO: VANDERLEI OLIVEIRA SANTINI.
RELATOR: Juiz ROGÉRIO RIBAS, Subst. de 2º Grau.(1)


Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO MUNICIPAL E TERCEIRO. SUPOSTA OFERTA DE QUANTIA A VEREADOR DA OPOSIÇÃO, PARA FAZER CESSAR DENÚNCIAS FEITAS CONTRA A ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL. PROVAS INSUFICIENTES PARA A CONDENAÇÃO. PRETENSÃO CONDENATÓRIA DO “PARQUET” LASTREADA APENAS NA PALAVRA DO VEREADOR, ADVERSÁRIO DO RÉU ENTÃO PREFEITO MUNICIPAL, A PARTIR DE GRAVAÇÕES DE DIÁLOGOS EM FITA CASSETE NÃO PERICIADA. NÃO CONFIRMAÇÃO CLARA SE A OFERTA PARTIU DO RÉU OU DE PEDIDO DO PRÓPRIO VEREADOR. DÚVIDAS A CONTAR EM FAVOR DOS RÉUS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DA DEMANDA.
APELAÇÃO DESPROVIDA.



I - O RELATÓRIO:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos.

Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE C/C PEDIDO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO, sob nº 820/02, movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra (1) VANDERLEI OLIVEIRA SANTINI e (2) MIGUEL BARBOZA DO NASCIMENTO.

Na inicial o “parquet” acusa o réu MIGUEL, dono de empresa de comunicação e marketing, de em 19.01.01 ter efetuado, em nome do réu VANDERLEI --- então Prefeito Municipal de Ivatuba/PR ---, uma oferta da quantia de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) ao então vereador AILTON PEREIRA LOIOLA, para que este se afastasse do cargo, e com isso cessassem as acusações feitas constantemente por ele contra a administração municipal.

Processado o feito, adveio a r. sentença de fls. 1183/1188 pela qual o MM. Juiz “a quo” entendeu que a prova produzida (a versão do vereador envolvido, e as gravações feitas pelo mesmo) não era segura, a ponto de autorizar a procedência da demanda. Então, S.Exa. julgou improcedente a demanda, todavia, deixou de condenar o Ministério Público na sucumbência.

Não se conformando, o Ministério Público manejou o presente recurso de apelação cível, em que pugna pela reforma do julgado de 1ª instância, pelas seguintes razões:

a)- as provas são sim suficientes a lastrear a condenação dos réus, ao contrário do entendimento do MM. Juiz sentenciante;
b)- a prova dos fatos se fez de acordo com as peculiaridade do caso e diante do desenrolar das negociações entre os apelados e o ex-vereador AILTON PEREIRA LOIOLA;
c)- o próprio juiz “a quo” entendeu presentes indícios da oferta imputada aos réus;
d)- o depoimento do ex-vereador na fase indiciária demonstra os fatos; em juízo, idem;
e)- houve degravação dos diálogos entre o ex-vereador e os réus (fls. 85/92), evidenciando a oferta ilícita ao primeiro;
f)- a esposa da “vítima” também estaria a confirmar os fatos improbos;
g)- houve demonstração de prática de corrupção ativa por parte dos apelados; essa conduta se consuma com a simples oferta do dinheiro, não sendo necessário o recebimento dele pelo corrompido;
h)- o então prefeito VANDERLEI tinha interesse que o ex-vereador cessasse as denúncias contra a administração municipal, as quais redundaram em algumas ações civis públicas contra aquele;
i)- o juiz sentenciante desconsiderou tais elementos de prova; não há razão na sentença quando se levou em conta que existe dúvida se houve pedido ou oferta do dinheiro.

Pede pela reforma do julgado de 1º grau, visando a condenação dos apelados por ato de improbidade.

O preparo das despesas recursais é dispensado pela lei processual.

A parte recorrida contrariou o reclamo recursal.

Subiram os autos a este Tribunal.

A douta Procuradoria Geral de Justiça emitiu parecer pelo provimento da apelação do Ministério Público de 1º grau.

Os autos vieram conclusos a este relator, em face de designação da d. presidência do Tribunal de Justiça no protocolo nº 268.036/2009 (fls. 1267).

É o relatório.


II - FUNDAMENTAÇÃO E VOTO:


Conheço do recurso porque presentes os pressupostos de admissibilidade.

A discussão travada nos autos envolve análise e valoração do material probatório trazido pelo órgão ministerial ora apelante.

O MM. Juiz sentenciante ficou na dúvida se foi o ex-vereador que pediu dinheiro, ou se foi mesmo o ex-prefeito e o outro réu que fizeram a oferta do dinheiro.

Pois bem.

A fita dos diálogos entre os envolvidos não foi periciada judicialmente. Só por isso ela já fica um tanto duvidosa como prova.

Extrai-se do depoimento prestado pelo ex-vereador AILTON perante o Ministério Público às fls. 82/84, que ele era o único vereador da oposição ao então prefeito municipal, o ora apelado VANDERLEI.

Esse vereador fazia denúncias de supostas irregularidades no âmbito da administração municipal de Ivatuba-PR, lamentando que os seus pares na Câmara Municipal não davam atenção a tais fatos. Por isso se dirigia ao Ministério Público.

Entregou uma fita cassete ao “parquet” para demonstrar que estava sendo procurado pelos apelados, os quais lhe ofertavam R$ 30.000,00 para cessar as denúncias.

A fita veio degravada pela Escrivã de Polícia da 9ª SDP de Maringá, e nela constam diálogos entre os apelados e o ex-vereador (vide, fls. 85 e ss.).

Contudo, como o ex-vereador era interessado e estava inclusive gravando as conversas, pode ter feito o pedido de dinheiro, e, ao mesmo tempo, poderia estar cuidando para não deixar isso ser percebido.

Há referências a medo e ameaças entre o edil e o então prefeito, mostrando que o clima era de conflito entre eles.

Ora, por mais que se queira ser sensível na valoração da referida prova, diante da natureza dos fatos (corrupção, quase sempre praticada às escondidas), não há como se sustentar uma condenação com graves conseqüências quando a dúvida ainda toma conta do conjunto probatório.

Aliás, dos diálogos (veja-se, p.ex., às fls. 89/90) se verifica uma confusão nas conversas, como se fosse realmente uma coisa “montada” ou “armada”. As conversas se arrastam sem maiores definições, e os interlocutores ficam ameaçando definir uma negociação, mas não o fazem.

O apelante Ministério Público se agarra nesses diálogos, e pede o acolhimento de tais provas, às quais se soma um depoimento da esposa do ex-vereador.

Porém, em que pese não seja ilícita a gravação de conversa quando efetivada por um dos interlocutores, realmente a força de tal prova é questionável.

Ela configura indício relevante da acusação feita nestes autos, todavia não é suficiente para embasar um decreto de condenação por ato de improbidade.

Não se está a dizer que deve ser exigida prova praticamente irrealizável, como acenou o apelante. Mas sim que uma condenação por improbidade exige lastro probatório idôneo e seguro, sob pena de correr-se o risco do cometimento de grave injustiça.

Ademais, no caso há um agravante: o ex-vereador estava sendo orientado por um jornalista de rede de televisão do Estado (repórter ROBERTO PAIVA, da RPC).

Como a imprensa vive quase sempre de escândalos, tal fato joga mais suspeitas contra a acusação lançada pelo “parquet” na exordial desta demanda; isso porque não se concebe razoável que uma pessoa alvo de oferta de corrupção (naquelas circunstâncias) queira a divulgação pública de suas conversas em suposta negociação ilícita. O que o ex-vereador ganharia com isso? Notoriedade? Ou apenas seria exposto como envolvido em corrupção?

Ademais, o ex-vereador se comporta de forma um tanto suspeita (como se criminoso fosse) quando das tais tratativas com os réus, pois parece demonstrar certa “familiaridade” com o suposto acerto em vias de negociação.

Essas dúvidas todas apontam para a manutenção da r. sentença de improcedência da demanda!

Veja-se que em casos semelhantes (de dúvida na prova) assim se decidiu:

“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA - APLICAÇÃO AOS AGENTES POLÍTICOS - INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 1º E 2º DA LIA - AUTOPROMOÇÃO - ATUAR COMISSIVO DO AGENTE NÃO DEMONSTRADO - CONDENAÇÃO POR ATO OMISSIVO QUE RECLAMA PROVA DE PREJUÍZO AO ERÁRIO - QUADRO PROBATÓRIO INSUFICIENTE AO AMPARO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA - IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO QUE SE IMPÕE - APELO CONHECIDO E PROVIDO. (...)”.(TJPR - IV CCv - Ap Civel 0430805-2 - Rel.: Anny Mary Kuss - Julg.: 13/05/2008 - Unanime - Pub.: 13/06/2008 - DJ 7634).

“Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. IMPROCEDÊNCIA EM 1º GRAU. IRRESIGNAÇÃO DO “PARQUET”. VENDA DE TERRENO DO MUNICÍPIO PARA REALOCAÇÃO DE EMPRESA LIGADA A DEPUTADO FEDERAL. ALEGAÇÃO DE NULIDADE POR VIOLAÇÃO DO ART. 54, INCISO I, LETRA “A”, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPROCEDÊNCIA. CONTRATO COM CLÁUSULAS UNIFORMES. NEGÓCIO LASTREADO EM LEI MUNICIPAL DE INCENTIVO À INSTALAÇÃO E REALOCAÇÃO DE INDÚSTRIAS E EMPRESAS. EMPRESA QUE SE SITUAVA NA ZONA CENTRAL E NECESSITAVA SER TRANSFERIDA PARA A NOVA ZONA INDUSTRIAL. AUSÊNCIA DE PROVA DO SUPOSTO PREVALECIMENTO DE INTERESSES PESSOAIS NO NEGÓCIO. PLANO INDUSTRIAL DO MUNICÍPIO OBSERVADO, COM CONTRATO PADRÃO DE VENDA. REQUISITOS LEGAIS ATENDIDOS PELA EMPRESA. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO AO ERÁRIO. PAGAMENTO FEITO DE ACORDO COM A AVALIAÇÃO, CONFORME CONSTATOU A PERÍCIA REALIZADA NO CURSO DA DEMANDA. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA A MODIFICAÇÃO DO ENTENDIMENTO SENTENCIAL. APELO DESPROVIDO.” (TJPR - 5ª C.Cível - AC 0456971-1 - Guarapuava - Rel.: Juiz Subst. 2º G. Rogério Ribas - Unanime - J. 20.01.2009).

ISTO POSTO, MANTENHO A D. SENTENÇA E NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO CÍVEL.

É COMO VOTO.


III - O DISPOSITIVO:


ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por maioria de votos, em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO nos termos da fundamentação.

Presidiu o julgamento o Senhor Desembargador LEONEL CUNHA (com voto). Votou com o relator o Senhor Desembargador ADALBERTO JORGE XISTO PEREIRA, ficando vencido o Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente, que declara voto em separado.

Curitiba, 23 de novembro de 2009.


ROGÉRIO RIBAS - Relator
Juiz de Direito Substituto de 2º Grau


Desembargador LEONEL CUNHA
Vencido, com declaração de voto em separado


1 Em substituição ao Desembargador JOSÉ MARCOS DE MOURA.